‘Culto à personalidade’: desmascarando o kruschovismo do PCBrasileiro [Atualizado]

Revisão 17/09: Alguns trechos foram acrescidos à versão final do documento.

“O partido do proletariado é o Estado-maior revolucionário e de combate do proletariado. Todo partido proletário deve praticar o centralismo baseado na democracia e formar uma forte direção marxista-leninista antes de poder se erigir em vanguarda organizada e de combate. Propor a chamada ‘luta contra o culto à personalidade’ é, na realidade, contrapor os chefes às massas, abalar a direção única do partido baseada no centralismo democrático, debilitar a força de combate do partido e desintegrar suas fileiras (Partido Comunista da China, “Proposição acerca da Linha Geral do Movimento Comunista Internacional”, 1963)

Partido Comunista da China,
“Proposição acerca da Linha Geral
do Movimento Comunista Internacional”, 1963

Em documento intitulado “Socialismo: balanço e perspectivas”, aprovado no XIV Congresso do PCBrasileiro, a alta direção deste se dedica a fazer um “balanço” do que chamam “derrotas das experiências socialistas”. Em sua profundidade, os revisionistas fazem longa digressão para desaguar nas mesmas conclusões de Kruschov, o traidor do proletariado internacional: o “culto à personalidade”. Essa teoria, fundamentada por Kruschov no XX Congresso do PCUS (1956), promoveu razia no MCI ao atacar de forma covarde e sórdida o camarada Stalin e, deste modo, abrir caminho para a implementação de sua restauração capitalista. Vejamos a confluência dessas teses.

No referido documento, os revisionistas se aventuram a explicar a “derrota” do socialismo através de “outras causas, mais profundas”. A profundidade é de um pires, como veremos:

“Entre as principais razões está, seguramente, a visão e a teorização da dinâmica da luta de classes, do desenvolvimento do capitalismo e da construção do socialismo surgidas ainda nos anos 1930, após a ascensão de Stalin ao poder, que se consolidaram nas décadas seguintes, através da codificação do marxismo produzida pelo PCUS no período, acompanhada de uma simplificação da teoria, materializada em manuais de marxismo-leninismo difundidos a todos os Partidos Comunistas do mundo que seguiam a linha soviética. (…) Claro está que todo este contexto se refletiria no trabalho de elaboração teórica do PCUS (…). No capítulo IV da História do PCUS, um trabalho realizado coletivamente e coordenado por Stálin, estão muitos dos elementos que delinearam esta codificação do pensamento marxista, construída principalmente a partir de citações reordenadas de elementos dos trabalhos de Marx e Lênin: a definição da necessidade de recrutamento de quadros com base no critério de confiança e da fé depositada no Partido e no Socialismo; a definição do Partido como o único centro condutor do processo de transformação social e a imbricação direta e necessária entre o Partido e o Estado; a atribuição do papel de ‘correias de transmissão’ do Partido aos sindicatos e organizações de massa. (…) Estes elementos seriam a base da burocratização e do afastamento entre o Partido e a massa trabalhadora, com a perda progressiva do papel do Partido como sujeito político e sua transformação em máquina administrativa. (…) o conteúdo da teoria ficava delimitado por sua instrumentalização, transformando em práticas acessórias os processos de busca do conhecimento, tais como a investigação, a pesquisa, a construção e a crítica das hipóteses, a formulação de conceitos, etc. A teoria, assim, corria o risco de perder o seu caráter de cientificidade, quando passava a ser um pressuposto a ausência de críticas às premissas utilizadas. Esta codificação teria forte influência sobre os demais países do Bloco Socialista. (…) Além disso, o recrutamento de quadros para o Partido com base no critério da confiança, a fé como elemento definidor da adesão à causa comunista, a amarração e travamento dos sindicatos e entidades de massa pela atribuição a eles dada de meras ‘correias de transmissão’ do Partido ceifaram-lhes a capacidade de tomar iniciativas. (…) Por último, mas nem por isso em condição inferior aos demais elementos, a imbricação direta do Partido e o Estado descaracterizaria a ambos, abriria as portas para o empobrecimento teórico, a acomodação da militância e a burocratização do Partido (…). Sem intensa participação política, sem iniciativas do Partido, ficou empobrecido o desenvolvimento da teoria e da prática revolucionárias. (…) Estes elementos podem ser atribuídos a diversos fatores, tais como (…) a estrutura hierarquicamente rígida do PCUS constituída nos anos 1930 e durante a guerra, a influência da herança de poder centralizado (desde os tempos do czarismo), a visão e o estilo carismático e personalista de direção de Stalin (fortalecido com a vitória da guerra) e outros. (…) [Para entender a experiência soviética e seus limites, tem de se ter em conta os] Séculos de czarismo e uma estrutura de poder de caráter religioso e extremamente centralizado estavam presentes no dia a dia e no imaginário do povo russo. (…) Houve momentos em que esta tendência poderia ter sido revertida. Destaquem-se o XXII Congresso, de 1958, que poderia ter sido a base para uma reforma política ampla e profunda, voltada para o fomento à maior participação direta dos trabalhadores nas decisões políticas”.

Em resumo, os nossos eruditos e brilhantes intelectuaizinhos chegam às seguintes conclusões: a rigorosa centralização no Partido “hierarquicamente rígido”, expressão da visão e direção “personalista” de Stalin, eliminou a iniciativa dos quadros e das organizações de massas (inclusive convertendo as organizações de massas em “correia de transmissão”), a acomodação dos mesmos e a degeneração da sociedade socialista (levando à “derrota” da experiência soviética); a visão esquemática de um marxismo-leninismo “codificado” por manuais, expressão de um suposto dogmatismo, só reforçava essa estrutura organizativa “rígida” na medida em que condicionou os quadros em um empobrecimento teórico, dando ênfase nos critérios de “fé no Partido e na causa comunista” no processo de educação da militância; isso teria reforçado – e sendo também resultado – de uma relação religiosa e “extremamente centralizada” entre o povo russo e suas lideranças na experiência histórica e também soviética; e, por fim, os gênios da raça concluem que esses “problemas” do bruto, rígido e ignorante Stalin (não é mesmo?) foram os mais importantes, na medida em que, em 1958, o Partido, dirigido por Kruschov, poderia ter dado solução ao problema corrigindo a baixa iniciativa.

Brilhante!!! Pena que essas teses têm, na verdade, Kruschov como formulador do núcleo essencial, com base em falsificação teórica e mentiras. Embora não esteja escrito, o documento tem como eixo central a crítica ao “culto à personalidade”, a crítica à chefatura de Stalin e suas implicações práticas.

A essência do kruschovismo ataca novamente

Como dito, o eixo central dessa linha revisionista de ataque a Stalin por “culto à personalidade” é da lavra do próprio Kruschov. As mentiras de seu “Relatório Secreto” são a base ideológica – e até metodológica – para todo o ataque ao papel do camarada Stalin, que por sua vez, é a base teórica para negar o prestígio de todos os chefes revolucionários do proletariado e enfraquecer a causa revolucionária.

Em seu “relatório secreto”, o canalha Kruschov disse que “é estranho ao marxismo-leninismo elevar uma pessoa até transformá-la em super-homem, dotado de características sobrenaturais semelhantes às de um deus. A um homem desta natureza, se supõe dotado de um conhecimento inesgotável, de uma visão extraordinária, de um poder de pensamento que lhe permite prever tudo e, também, de um comportamento infalível. Entre nós se assumiu uma atitude desse tipo sobre um homem, especialmente sobre Stalin, durante muitos anos”. Assim inicia Kruschov, dando já o tom que segue o PCBrasileiro: para Kruschov, também é deveras inaceitável a “direção personalista” e “extremamente centralizada” do Grande Stalin. Ele introduz explicando que “é preciso considerar como o culto à pessoa de Stalin cresceu gradualmente, culto que em dado momento se transformou na fonte de uma série de perversões excessivamente sérias dos princípios do Partido, da democracia do Partido e da legalidade revolucionária”; Kruschov acusa Stalin de “violar o princípio da direção coletiva no Partido, concentrando um poder ilimitado nas mãos”. Para passar por ilibado marxista-leninista, Kruschov é sorrateiro e lança imediatamente que “durante a vida de Lenin, o CC do Partido foi a expressão real de um tipo de governo coletivo, tanto no Partido como na nação”, que “jamais deixou de acatar os princípios fundamentais do Partido”, e que “Lenin nunca impôs à força seus pontos de vista a seus colaboradores”.

Como notamos, aqui Kruschov levanta todos os pontos elencados pelo PCBrasileiro como problemas do PCUS: 1) um “caráter religioso” em torno do chefe do proletariado, em particular, dando-lhe “características de um deus”, como sabedoria, fé no triunfo etc.; 2) esse peso dado a Stalin produziu uma “extrema centralização”, “estrutura hierarquicamente rígida”, resultando em “violações da democracia do Partido”, acumulando assim “um poder ilimitado nas mãos”; 3) o problema se resolve através de promover reformas. Sabemos onde isso foi parar.

Em seu relatório, não é a toa que o primeiro tópico é intitulado “Lenin com Stalin”. O miserável Kruschov busca destruir a autoridade de Stalin lançando-o contra o leninismo. Com suas palavras venenosas, Kruschov diz:

“Stalin não atuava através de explicações, da cooperação, mas sim impondo suas concepções e exigindo uma submissão absoluta a sua opinião. Quem ousasse opor-se a algum conceito ou intentasse provar a correção de seu ponto de vista e de sua atitude, estava condenado a que se relegasse do grupo dirigente coletivo e que se submetesse posteriormente à aniquilação física e moral”.

Kruschov, como todo imbecil, apenas levanta uma pedra para soltá-la em seu próprio pé. Em primeiro lugar, porque comete a falsificação estéril de acusar Stalin de métodos “autoritários” e de usurpação da direção colegiada, o que não se sustenta para quem conhece minimamente a história do PCUS. Em abril de 1929, o camarada Stalin abre uma luta de duas linhas contra a linha direitista de Bukharin, justamente em reunião do Comitê Central – órgão máximo de direção coletiva entre Congressos –, apesar de Bukharin e seu bando pretender fugir da mesma, alegando que as divergências não eram questões sérias, mas apenas diferenças, críticas pontuais. Stalin, em toda a Sessão do CC, desenvolve longa e paciente luta ideológico-política, método incompatível com a acusação atribuída a ele. O mesmo se desenvolveu com Trotsky, cuja luta de duas linhas percorreu mais de 15 anos, em inúmeras reuniões de direção colegiada do CC e Congressos do PCUS tendo inclusive reconhecido e reaberto publicamente os debates com a fração trotskista, mesmo que o debate já havia sido proibido por proposição de Lenin, em pessoa, meus caros, no X Congresso. Isso significa “impor suas concepções sem dar explicações”?

Quanto às execuções, referindo-se aos Processos de Moscou, são comprovados os gravíssimos crimes cometidos por determinadas figuras “opositoras”, como sabotagens às atividades econômicas e militares, entrega de segredos a autoridades fascistas, assassinatos e perseguições a quadros da esquerda do Partido etc. Foram estes, e não divergências, os motivos, tendo, até mesmo, autoridades estrangeiras imperialistas atestado a correção técnica dos julgamentos e o amplo direito à defesa.

Quanto à “submissão absoluta” tratada por Kruschov, é o que todo leninista que honre a alcunha chama de centralismo democrático, em que, tomada uma decisão por maioria, todos sujeitam-se à definição, com a obrigação inapelável de aplicar de forma firme, fiel e integralmente a decisão, mesmo que discorde dela inteiramente, até que, em nova reunião, se possa voltar a discuti-la de forma objetiva e clara. Isso só pode ser um absurdo para anarquistas, ou para revisionistas que estejam manipulando os fatos para atacar Stalin, como no caso de Kruschov. Isso, talvez, seja o que o PCBrasileiro esteja chamando de poder “extremamente centralizado” no Partido, ou “estruturas hierarquicamente rígidas”. Mas, ora, Kruschov e o PCBrasileiro aqui comportam-se ambos como um tolo: quem formulou o centralismo democrático deste modo foi Lenin, e não Stalin, embora Kruschov e o PCBrasileiro digam que Lenin era democrático e, Stalin, mandão. E quem exigiu, mais do que Stalin, uma sujeição à vontade única foi o Grande Lenin. É de Lenin as mais duras palavras contra o anarquismo senhorial de intelectuais e em defesa de uma centralização rigorosíssima no Partido Comunista, isto é, sujeição rigorosa à sua direção – que era centralizada justamente por ele, Lenin, o homem que propôs a criação do cargo secretário-geral para outorgar, a si mesmo, uma autoridade suprema no Partido.

Na polêmica contra os economicistas, em “Um passo à frente, dois passos atrás”, Lenin afirma:

“Estas tentativas confirmam admiravelmente o que já se disse no congresso do partido sobre a diferença de pontos de vista entre o intelectual burguês que se liga à social-democracia e o proletário que tomou consciência dos seus interesses de classe. Por exemplo, esse mesmo ‘Praktik’ do novo Iskra, cuja profundidade de pensamento já conhecemos, acusa-me de conceber o partido como uma ‘imensa fábrica’, com um diretor — o Comitê Central — à frente (n.0 57, suplemento). ‘Praktik’ não suspeita sequer de que a palavra terrível que lançou trai imediatamente a mentalidade do intelectual burguês, que não conhece nem a prática nem a teoria da organização proletária. Precisamente a fábrica, que a alguns parece apenas um espantalho, representa a forma superior de cooperação capitalista, que unificou e disciplinou o proletariado, o ensinou a organizar-se, o pôs à cabeça de todas as outras camadas da população trabalhadora e explorada. Precisamente o marxismo, ideologia do proletariado educado pelo capitalismo, ensinou e ensina aos intelectuais inconstantes a diferença entre o lado explorador da fábrica (disciplina baseada no medo de morrer de fome) e o seu lado organizador (disciplina baseada no trabalho em comum, unificado pelas condições em que se realiza a produção altamente desenvolvida do ponto de vista técnico). A disciplina e a organização, que o intelectual burguês tanto custa a adquirir, são facilmente assimiladas pelo proletariado, justamente graças a essa ‘escola’ da fábrica. O medo mortal a essa escola, a incompreensão absoluta da sua importância como elemento de organização, caracterizam precisamente a maneira de pensar que reflete as condições de existência pequeno-burguesas, e gera esse aspecto do anarquismo que os sociais-democratas alemães chamam Edelanarchismus, ou seja, o anarquismo do senhor ‘distinto’, o anarquismo senhorial, diria eu. Este anarquismo senhorial é particularmente característico do niilista russo. A organização do partido parece-lhe uma monstruosa ‘fábrica’, a submissão da parte ao todo e da minoria à maioria surge-lhe como uma ‘servidão’ (ver os folhetins de Axelrod), a divisão do trabalho sob a direção de um centro fá-lo lançar gritinhos tragicômicos contra a transformação dos homens em ‘engrenagens e parafusos’. (…) Parece evidente que os clamores contra o famoso burocratismo não são mais que um meio de encobrir o descontentamento em relação ao grupo de pessoas que fazem parte dos órgãos centrais, não são mais do que uma máscara… És um burocrata porque foste designado por um congresso sem a minha vontade e contra ela! És um formalista porque te apoias nos acordos formais do congresso e não no meu consentimento! Atuas de um modo torpemente mecânico porque te remetes à maioria ‘mecânica’ do congresso do Partido e não dás atenção ao meu desejo de entrar para os órgãos dirigentes! És um déspota porque não queres dar o poder à velha camarilha de bons compadres”.

“Em essência, toda a posição dos oportunistas em matéria de organização começou a revelar-se já na discussão do parágrafo primeiro: na sua defesa de uma organização do partido difusa e não fortemente cimentada; na sua hostilidade à ideia (à ideia ‘burocrática’) da edificação do partido de cima para baixo, a partir do congresso do partido e dos organismos por ele criados; na sua tendência para atuar de baixo para cima, permitindo a qualquer professor, a qualquer estudante do liceu e a ‘qualquer grevista’ declarar-se membro do partido; na sua hostilidade ao ‘formalismo’, que exige a um membro do partido que pertença a uma organização reconhecida pelo partido; na sua tendência para uma mentalidade de intelectual burguês, pronto apenas a ‘reconhecer platonicamente as relações de organização’; na sua inclinação para essa sutileza de espírito oportunista e as frases anarquistas; na sua tendência para o autonomismo contra o centralismo; numa palavra, em tudo o que hoje floresce tão exuberantemente no novo Iskra, e que contribui para o esclarecimento cada vez mais profundo e evidente do erro inicial”.

“A total carência de argumentos razoáveis por parte do camarada Mártov e companhia contra a redação designada pelo congresso é ilustrada melhor que por qualquer outra coisa pela palavrinha: ‘nós não somos servos!’ (Estado de sítio, p. 34). A psicologia do intelectual burguês que se considera entre os ‘espíritos de elite’, colocados acima da organização de massas e da disciplina de massas, surge aqui com notável clareza. Explicar a recusa de trabalhar no partido dizendo ‘nós não somos servos’ é descobrir-se inteiramente, é reconhecer uma completa carência de argumentos, uma incapacidade absoluta para dar explicações, uma ausência total de motivos justificados de descontentamento. Toda a organização e disciplina proletárias parecem servidão ao individualismo próprio de intelectuais, que já se tinha manifestado nas discussões §1, mostrando a sua inclinação para os raciocínios oportunistas e a fraseologia anarquista”.

“O operário consciente já há muito que largou as fraldas, já lá vai o tempo em que fugia do intelectual como tal. O operário consciente sabe apreciar uma bagagem de conhecimentos mais rica, o horizonte político mais vasto que encontra nos intelectuais sociais-democratas. Mas, à medida que vamos constituindo um verdadeiro partido, o operário consciente deve aprender a distinguir entre a psicologia do soldado do exército proletário e a psicologia do intelectual burguês que se pavoneia com frases anarquistas; deve aprender a exigir que cumpram os seus deveres de membros do partido não só os militantes de base, mas também ‘os de cima’; deve aprender a encarar com o mesmo desprezo o seguidismo em matéria de organização com que outrora o encarava no domínio da tática! O girondismo e o anarquismo senhorial estão inseparavelmente ligados a uma última particularidade característica da posição do novo Iskra em questões de organização – à defesa do autonomismo contra o centralismo. Este é o sentido de princípios que encerram os gritos (se acaso encerram algum) contra o burocratismo e a autocracia, as queixas a propósito do ‘imerecido desdém para com os não-iskristas’ (que no congresso defenderam o autonomismo), os cômicos gritos de que se exige uma ‘submissão absoluta’, as queixas amargas sobre o pompadurismo etc., etc.”.

“Os terríveis democratas da Bolsa de Frankfurt fustigam a ‘autocracia’ no Partido Social-Democrata, a ‘ditadura do partido’, o ‘domínio autocrático dos chefes do partido’, essas ‘excomunhões’ com as quais se pretende ‘como que castigar todo o revisionismo’ (recorde-se a ‘falsa acusação de oportunismo’), essa exigência duma ‘obediência cega’, essa ‘disciplina que mata’, essa exigência duma ‘submissão servil’, de transformar os membros do partido em ‘cadáveres políticos’ (esta expressão é bem mais forte que a outra usada, das ‘engrenagens e parafusos’)!”

“O proletariado não receia a organização nem a disciplina, saibam-no os senhores que se preocupam tanto com o irmão mais novo! O proletariado não se importará que os senhores professores e estudantes de liceu, que não queiram entrar numa organização, sejam considerados como membros do partido porque trabalham sob o controle de uma organização. Toda a vida do proletariado o educa para a organização de modo muito mais radical que a muitos intelectuaizinhos. O proletariado, por muito pouco que compreenda o nosso programa e a nossa tática, não se porá a justificar o atraso da organização argumentando que a forma é menos importante que o conteúdo. Não é ao proletariado, mas a certos intelectuais do nosso partido, que falta a autoeducação no espírito de organização e disciplina, no espírito de hostilidade e desprezo pelas frases anarquistas”.

Aqui, fica claro: não é Stalin que exige uma “submissão absoluta”, mas Lenin que exige sujeição à vontade única, a vontade do Partido expressada nas resoluções da direção partidária e garantida por aquele que a centraliza, quais sejam, Lenin e, depois, Stalin. Lenin o defendeu de forma dura, enérgica, e garantiu que isso fosse feito. Na sua época, Lenin, para afirmar a concepção do Partido de Novo Tipo, foi chamado de “autocrata”, que exigia “submissão total”, que exagerava no centralismo, que transformaria os militantes em “parafusos e engrenagens” e “cadáveres políticos”, retiraria deles a iniciativa… assim era chamado Lenin, justamente porque Lenin, desde o início, concebia o Partido Comunista como um organismo altamente centralizado e disciplinado, como o Partido do proletariado e não da intelectualidade burguesa, como máquina de guerra do proletariado e não um clube excêntrico para debater teses acadêmicas, como o PCBrasileiro, pelo qual aspiram todos os oportunistas e anarquistas senhoriais. Stalin, neste sentido, é seguidor de Lenin, e Kruschov ataca a Lenin, ataca o leninismo, assim como o faz o PCBrasileiro e todos os anarquistas senhoriais. Os revisionistas brasileiros, ao julgarem que a “derrota” na URSS está ligada à perda de iniciativa por centralização rigorosa de Stalin, estão indo contra Lenin e confluindo com toda a reação! Não é necessário repisar porque, por consequência, vão contra Marx e Engels, igualmente.

A acusação de Kruschov, de que Stalin não tolerava que ninguém dele divergisse e que logo abria luta contra estes, bem, o nome disso é luta ideológico-política para lograr unidade real no Partido. Kruschov considera aqui que a postura “democrática” seja “combinar dois em um”, ou seja, o que ele chama de “trabalhar em cooperação” significa conciliar duas concepções distintas dentro do Partido, como eram a linha do camarada Stalin e a linha direitista de Bukharin, ou a linha de Zinoviev, Kamanev, Trotsky, Tomski. Sem isso, não há verdadeira unidade partidária, pois a conciliação da contradição no seio do Partido conduz, invariavelmente, à destruição do Partido pela falta de compreensão e ação unificadas. Para Kruschov, a partir do momento em que o camarada Stalin estabelece uma luta aberta contra uma linha contrária, trata-se aqui de um modo “autoritário”, “coercitivo”, porque os “divergentes” são obrigados a se chocar publicamente com ele? Stalin é autoritário ou Kruschov que é um oportunista, do tipo que deseja sempre que possível esconder suas divergências para não tratar da coisa coletivamente? Se for este o caso, então todos os comunistas, defensores da luta ideológica ativa, são autoritários sem igual.

Quanto ao tema hombridade, vale a pena mencionar que, Kruschov, que acusou Stalin de usurpar a direção coletiva e exigir uma sujeição absoluta à sua concepção, tinha uma prática distinta nas reuniões de direção: era incisivo e até estridente na defesa do camarada Stalin e de um “leninismo-stalinismo”, conforme demonstra o seu “Informe sobre modificações nos Estatutos do PC (b) da URSS” (1952).

“Essas vitórias e conquistas foram resultados da política justa do Partido Comunista, da sábia direção do seu Comitê Central leninista-stalinista, do nosso amado chefe e mestre, o camarada Stalin”.

“Os êxitos que nosso país conseguiu se devem ao fato de que o Partido efetuou incansavelmente um intenso trabalho de organização entre as massas para realizar na prática as geniais diretivas stalinistas”.

“Viva o sábio chefe do Partido e do povo, o inspirador e organizador de todas as nossas vitórias, o camarada Stalin!”.

Kruschov era, sabidamente, um dos mais eufóricos na defesa do camarada Stalin: “Se alguém levantar a mão contra o paizinho Stalin, eu a arranco”, para depois ser o primeiro a apontar contra o camarada Stalin seu pútrido dedo opositor atribuindo a ele uma usurpação da direção coletiva.

É, portanto, estupidez a direção do PCBrasileiro alegar que foi a centralização de Stalin e “sua direção personalista o alicerce do problema; assim como, é chegar às raias da loucura supor que Kruschov poderia resolvê-lo, ignorando, ademais, a própria restauração do capitalismo por meio de um golpe de Estado, de tal maneira derivando uma teoria de que o problema da ditadura do proletariado poderia ser solucionado com reformismo sob o capitalismo, levado adiante pela mesma canalha que liquidou o Estado soviético.

Mas, seria mesmo Stalin o grande mal à teoria leninista sobre a construção do Partido, no que se refere à sua relação com as demais organizações de massas? Para o PCBrasileiro, o PCUS, sob direção do camarada Stalin, atribuiu às organizações de massas papel de “correia de transmissão”, como se o caráter rigorosamente centralizado do Partido, militarizado em função da Guerra Pátria, houvesse eliminado a iniciativa das massas, “sem linha de massas”. Os nossos acadêmicos burgueses se referem ao Compêndio da História do PC(b)US, grande trabalho teórico dirigido pelo camarada Stalin, e especificamente à seguinte passagem como prova de uma “burocratização” das organizações de massas em relação ao Partido e vice-versa:

“O proletariado conta com toda uma série de outras organizações, sem as quais não poderia travar uma luta eficaz contra o capital: sindicatos, cooperativas, organizações de fábricas e oficinas, frações parlamentares, organizações femininas sem partido, imprensa, organizações culturais, organizações da juventude, organizações revolucionárias de combate (durante as ações abertamente revolucionárias), sovietes de deputados como forma estatal de organização (exatamente onde o proletariado se encontra no Poder), etc. a imensa maioria destas organizações permanecem à margem do Partido e só uma parte delas se encontra diretamente vinculada a este ou se apresentam como suas ramificações. Em determinadas condições, todas estas organizações são absolutamente necessárias para a classe operária, dado que sem elas não seria possível consolidar as posições de classe do proletariado nos diversos terrenos de luta, nem seria possível consolidar as posições de classe do proletariado nos diversos terrenos de luta, nem seria possível chamá-lo como força destinada a substituir a ordem burguesa pela ordem socialista. Mas como levar a cabo a direção única, existindo tal abundância de organizações? Qual é a garantia de que esta multiplicidade de organizações não provoque desencontros na direção? Dir-se-á que cada uma destas organizações atua dentro de sua própria órbita, razão pela qual não podem se atrapalhar umas às outras. E isto é naturalmente exato. Mas também o é quando estas organizações são obrigadas a empregar a sua atividade numa mesma direção, dado que servem uma única classe, a classe dos proletários. E cabe perguntar: quem traça a linha e a orientação geral que deve servir de guia para o trabalho de todas estas organizações? Onde está a organização central que seja não apenas capaz, por possuir a necessária experiência, de traçar essa linha geral, mas se revele dotada da possibilidade, por possuir a autoridade necessária para isso, de conduzir todas estas organizações para a prática dessa linha, com o objetivo de conseguir a unidade na direção e excluir toda a possibilidade de desarmonia? Esta organização é o Partido do proletariado”.

A afirmação de Stalin é óbvia e correta – os problemas do revisionismo e da restauração capitalista não estavam ligados a uma baixa iniciativa em geral, resultado de uma centralização rigorosa, como veremos à frente. Assim sendo, é apenas um espantalho “anti-stalinista” para, uma vez mais, violentar o legado do camarada Stalin. Mas, ainda assim, cabe perguntar: essa concepção, de centralização pelo Partido da atividade das organizações de massas, e mais, como centro e direção dela partindo de cima, é de Stalin ou de Lenin?

Foi Lenin quem definiu que cabe ao Partido centralizar os elementos fundamentais do trabalho revolucionário, e que quanto mais a direção do movimento operário estiver nas mãos de um número restrito de revolucionários profissionais, tanto maior será a amplitude do movimento operário empurrado à luta radical e à guerra revolucionária de classe pela direção do Partido e sua participação ativa nela. Lenin é explícito: quem pode exercer a direção proletária é apenas a sua vanguarda organizada:

A concentração de todas as funções clandestinas entre as mãos do menor número possível de revolucionários profissionais não significa absolutamente que esses ‘pensarão por todos’, que a multidão não tomará parte ativa no movimento. Ao contrário, a multidão fará surgir esses revolucionários profissionais em número sempre maior, pois saberá, então, que não basta alguns estudantes e alguns operários, que conduzem a luta econômica, reunirem-se para constituir um ‘comitê’, mas é necessário, durante anos, que procedam à sua educação de revolucionário profissional; e a multidão não ‘pensará’ unicamente no trabalho artesanal, mas exatamente nessa educação. A centralização das funções clandestinas da organização não significa absolutamente a centralização de todas as funções do movimento. Longe de diminuir, a colaboração ativa de maior quantidade de literatura ilegal multiplicar-se-á dez vezes, quando uma ‘dezena’ de revolucionários profissionais centralizarem em suas mãos a edição clandestina dessa literatura. (…) E isto é verdade, não somente para a imprensa, mas também para todas as funções do movimento, inclusive as manifestações. A participação mais ativa e maior da massa em uma manifestação, longe de sofrer com isso, ganhará mais se uma ‘dezena’ de revolucionários experimentados, e, pelo menos, tão bem preparados profissionalmente como nossa polícia, centralizar todos os aspectos clandestinos: elaboração de panfletos, de um plano aproximado, nomeação de um grupo de dirigentes para cada bairro da cidade, cada grupo de fábricas, cada estabelecimento de ensino etc. (Sei que poderão objetar que meus pontos de vista ‘nada têm de democrático’, mas responderei a tal objeção, mais adiante, e em detalhe, que nada é menos inteligente). A centralização das funções mais clandestinas pela organização dos revolucionários, longe de enfraquecer, enriquecerá e estenderá a ação de uma multidão de outras organizações que se dirigem ao grande público e que, por sua razão, também são tão pouco regulamentadas e clandestinas quanto possível: associações profissionais de operários, círculos operários de instrução e de leitura de publicações ilegais, círculos socialistas e também círculos democráticos para todas as outras camadas da população etc. etc. Esses círculos, associações profissionais de operários e organizações são necessários em toda a parte; é preciso que sejam mais numerosos e que suas funções sejam as mais variadas; mas é absurdo e prejudicial confundi-las com a organização de revolucionários, apagar a linha de demarcação que existe entre elas, extinguir na massa o sentimento já incrivelmente adormecido de que, para ‘servir’ um movimento de massa, é preciso ter homens que se dediquem especial e integralmente à atividade social-democrata, e que, paciente e obstinadamente, procedam à sua educação de revolucionários profissionais”. (Que Fazer?)

Lenin não apenas atribuía papel central e diretivo ao Partido na época da guerra revolucionária, mas também no processo de construção do Socialismo: quanto mais forte for a direção do Partido sobre as organizações de massas – entendendo por direção, aqui, a hegemonia e autoridade lograda através de um permanente trabalho de mobilização, politização e organização, que naturalmente se expressará numa sujeição das massas aos planos do Partido – maior será o êxito da sua atividade. Vejamos:

“Pelo lugar que ocupam no sistema da ditadura do proletariado, os sindicatos estão situados, se é justo dizer assim, entre o Partido e o poder do Estado. Na transição para o socialismo é inevitável a ditadura do proletariado, mas esta ditadura não é exercida pela organização que contém a totalidade dos operários industriais [isto é, às organizações de massas]. (…) A questão é que o Partido, se assim se pode dizer, recolha em seu seio a vanguarda do proletariado, e esta vanguarda exerce a ditadura do proletariado. E sem contar com uma base como os sindicatos não se pode exercer a ditadura, as tarefas estatais não podem ser cumpridas. (…) A ditadura [ou direção, hegemonia] só pode ser exercida pela vanguarda, que concentra em suas fileiras a energia revolucionária da classe. (…) Quem tem ‘confusão ideológica’ é o próprio Trotsky, porque ele e não outro, na questão fundamental relativa ao papel dos sindicatos (…) não percebeu, não levou em conta que nesse caso estamos em face de um sistema complexo de várias engrenagens e não pode haver um sistema simples, dada a impossibilidade de exercer a ditadura do proletariado através da organização que abarca sua totalidade. Não se pode realizar a ditadura [direção, hegemonia] sem várias ‘correias de transmissão’, que vão da vanguarda às massas da classe avançada, e destas às massas trabalhadoras” (Sobre os sindicatos, o momento atual e os erros de Trotsky, 1920)

Aqui vemos, não é o “mecanicista” Stalin, e sim, o “mecanicista” Lenin quem defende que a vanguarda, sim, exerce a ditadura, a direção do proletariado e guia toda a massa como eixo e centro, tomando as organizações de massas como formas inferiores do movimento operário e cabendo ao Partido dirigi-las como forma superior de organização proletária, ou destacamento de vanguarda. Se se quiser chamar esse fenômeno de direção das organizações de massas pelo Partido como funcionamento em “correia de transmissão”, e o fazem pretendendo dar um sentido de ser mera peça qualquer, e não uma organização consciente de sua ação, devemos recorrer à objetividade do que é de fato a correia de transmissão, com ou sem aspas, senão que parte decisiva do movimento de uma máquina no processo de produção, função sem a qual, de nada serve ter um bom operador daquela, uma excelente fonte de energia e um motor de alta qualidade técnica. A expressão de Lenin é simplesmente exata na analogia que faz, e, no mais, que vá ao traste com mais essa sensibilidade utópica pequeno-burguesa e anarquista senhorial. E no mais, é indiferente: pois, de fato, trata-se de uma direção única, centralizada, na qual as organizações de massas, direta ou através de formas intermediárias, e em correspondência a determinada questão e determinada situação ou condição, aportam à vanguarda com o conhecimento de sua prática e experiência, num movimento incessante, consciente e coordenado processam as informações da investigação da realidade objetiva, elevando-as a sínteses poderosas na intervenção permanente nesta mesma realidade da luta de classes e em todas esferas da atividade social. Processo que esta vanguarda capta de seus quadros, militantes e combatentes que vivem, lutam e produzem com essas massas no seio das suas próprias organizações e através de sua vida organizativa própria, e tal experiência prática é transformada, com a ação da vanguarda, através do estudo científico em meio à luta de duas linhas, baseado na ideologia do proletariado internacional, em políticas, diretivas, consignas e tarefas o mais exatamente compatíveis quanto possível com os interesses histórico-universais do proletariado na luta de classes, rumando à emancipação humana. Processo em que as massas identificam e abraçam como suas, através do paciente trabalho de convencimento da vanguarda junto às massas, no seio das próprias organizações de massas e através de sua mobilização, politização e organização dos níveis inferiores a superiores. Esse processo de “correia de transmissão”, se quisermos assim chamá-lo, ao contrário de ser inconsciente, manipulado e de autômatos como o impõe o autoritarismo burguês é sim método da democracia proletária, o é tanto mais democrático quanto mais centralizado for o Partido Comunista e seu processo global de ação e sistematização do conhecimento. Lenin concebe assim, e os nossos cripto-anarquistas do PCBrasileiro e todos os intelectuais burgueses oportunistas não têm coragem de apontar seu dedo contra Lenin – assim como Kruschov não teve. Quem se opõe a isso, só pode ser um anarquista – ou um anarquista senhorial, como ocorre de serem todos os oportunistas quando obrigados a serem sujeitos ao centralismo democrático.

Por fim, sobre o problema de “codificação do marxismo” e o problema do acento “nos critérios de fé no Partido”, é aqui também que o PCBrasileiro se choca contra Lenin, para nem se referir a Marx e Engels, Bakunin que o diga do “autoritarismo” da dupla. O ceticismo não corresponde à ideologia do proletariado; a fé, como reflexo da convicção inabalável frente a uma dúvida ou falta de clareza – invariáveis em determinadas circunstâncias no processo de descoberta da verdade, quando se está acercando da verdade objetiva sem ainda tê-la em claro –, tem uma base científica e é parte constitutiva da ideologia do proletariado, na medida em que se reconhece que o sentido do movimento da matéria, em seu incessante processo de desenvolvimento através da contradição, é o da superação do velho pelo novo, no que Lenin muito bem aprofundou Marx. Após este, é Lenin, portanto, quem estabelece, antes de Stalin, a questão do otimismo, da fé revolucionária e científica, e isto obviamente não se contrapõe ao processo de descoberta da verdade esclarecida pela teoria científica, como nem Stalin e nem Lenin nunca os contrapuseram. Além do mais, é o próprio Lenin quem fustiga, com sua crítica implacável, o ceticismo da intelectualidade burguesa tão em voga no PCBrasileiro:

“Devemos submeter inflexivelmente nossas menores dúvidas ao juízo dos operários conscientes, ao juízo de nosso Partido. Temos fé em nosso Partido. Nele vemos a inteligência, a honra e a consciência de nossa época. Na aliança internacional dos internacionalistas revolucionários vemos a única garantia para o movimento de libertação da classe operária.” (Lenin, Chantagem política)

“Isto é o que deveriam aprender de Marx os intelectuais marxistas da Rússia, afrouxados pelo ceticismo, encantados pelo pedantismo e propensos às palavras de arrependimento, esses intelectuais que se cansam logo com a revolução e sonham com seu enterro, como se fosse uma festa, para substituí-la pela prosa constitucional. Deveriam aprender do chefe teórico dos proletários a ter fé na revolução, a saber chamar a classe operária a defender até o fim suas tarefas revolucionárias imediatas e a manter firme o espírito, o que evitaria os choramingos pusilânimes ante os reveses temporários da revolução”. (Lenin, Prefácio à tradução ao russo das cartas de Marx a Kugelmann)

O Maoismo e a Grande Revolução Cultural Proletária

Diferente do brilhantismo dos intelectuais pequeno-burgueses, o Presidente Mao Tsetung e o Partido Comunista da China fizeram, este sim, o balanço justo e correto da experiência soviética, apoiados nos acertos de Lenin e Stalin, observando erros para também aprender deles, erros dos quais alguns deles inevitáveis no processo objetivo de descoberta da verdade (o conhecimento não é imediato), e outros oriundos de debilidades reais do camarada Stalin.

Não foi a rigorosa disciplina do partido bolchevique, tampouco a direção firme e proletária do camarada Stalin, e menos ainda uma influência da “religiosidade” na relação “chefes – Partido – classe – massas” a causa da restauração capitalista, como diz o PCBrasileiro e outros oportunistas. O problema central, que se expressava num certo estancamento da revolução proletária na URSS e como insuficiente iniciativa das massas na luta ideológica, estava relacionado à compreensão mais profunda da direção do camarada Stalin, que embora entendesse que a luta de classes persiste de forma aguda na sociedade socialista, não estendeu este entendimento a que, nela, a superestrutura assume o papel diretor sobre as forças produtivas. Era preciso despertar poderosamente a iniciativa revolucionária das massas e seu poder transformador, não apenas na produção – como ele fizera brilhantemente – mas, sobretudo, na luta ideológica em toda a sociedade e na luta de duas linhas por combater, desmascarar e aplastar o revisionismo no Partido, assim como a ideologia burguesa na sociedade, mobilizando audazmente as amplas massas, principalmente as massas operárias, como passo decisivo para seguir desenvolvendo a revolução proletária, aprofundar a ditadura do proletariado e, inclusive, desenvolver a níveis superiores as forças produtivas, potenciando a transformação e consolidação das relações de produção socialistas, mais além de sua representação jurídica.

Nisso, a autoridade inquebrantável da chefatura do Presidente Mao não foi um impedimento para a iniciativa do Partido e das massas. Claro, iniciativa em geral só existe na mente dos idealistas: a iniciativa, como tudo, existe concretamente e possui caráter de classe e direção. A iniciativa das massas revolucionárias, no impulsionamento da GRCP, cresceu na medida em que se reforçou a autoridade da chefatura proletária pelos êxitos do proletariado, e isto debilitou a iniciativa dos revisionistas contra a GRCP e das massas por eles influenciadas. A iniciativa da esquerda significa, em última instância, a passividade da direita, assim como a iniciativa da direita há de se manifestar inevitavelmente como passividade da esquerda; quanto mais a esquerda exercer a hegemonia no Partido e na sua direção, isto é, unir a maioria através da luta de duas linhas como crítica e autocrítica por aplastar a direita e fazê-lo o mais monolítico possível na linha vermelha, maior será a iniciativa da esquerda e a passividade do revisionismo como resultante, na medida em que a iniciativa do revisionismo significará, sempre, a iniciativa contrária à iniciativa da esquerda. Desatada a Grande Revolução Cultural Proletária – que esmagou o quartel-general dos seguidores da via capitalista chefiado por Liu Shao-chi e deu sucessivos golpes em Teng Siaoping – a centralização rigorosa do Partido, sua disciplina férrea e a existência da liderança revolucionária, a chefatura, como figura forte e obelisco que orienta todo o Partido a unir-se com a esquerda, servindo de instrumento à hegemonia da esquerda, não foram prejuízos à iniciativa revolucionária, ao contrário, ao desmascarar e aplastar as posições de direita nas lutas no Comitê Central e em todo o partido, resultou como força asfixiante para a iniciativa dos revisionistas. Estes após tergiversarem nos primeiros anos da GRCP, nos seguintes passaram de crescente a mais completa defensiva, e foram obrigados sair da tergiversação acerca do que era a GRCP e entrar na luta de duas linhas de forma aberta contra a esquerda, para enfraquecer a iniciativa da esquerda. Portanto, a GRCP, que foi o maior movimento consciente e organizado de massas da história da Humanidade que, até então, se levantou, não por um interesse material imediato, mas de luta pelo Poder, de defesa do Poder da ditadura do proletariado e para a transformação ideológica da sociedade chinesa, pela revolução Proletária Mundial e pelo comunismo. E como tal, foi a máxima expressão de iniciativa, estabelecendo o mais alto marco da história da Revolução Proletária Mundial, ainda em seus primeiros passos, e a confirmação da necessidade da centralização máxima da liderança revolucionária no partido comunista e chefatura de um só líder, o Presidente Mao. Se isso não é mostra suficiente da iniciativa, sob uma rigorosa centralização, o que seria?

O que o PCBrasileiro chama de “conformismo” e “falta de iniciativa”, portanto, não se relaciona a direção firme do camarada Stalin e nem tampouco com um firme centralismo democrático que seria “quase religioso” etc. E sim, se relacionava com a necessidade de desenvolver a revolução na superestrutura, como continuação da luta de classes nas condições da construção do socialismo, da luta no domínio ideológico, através da mobilização audaz das amplas massas populares para desmascarar as artimanhas dos seguidores da via capitalista, encobertos com fraseologias de defesa do pensamento mao tsetung, mas que na prática sabotavam a aplicação da linha vermelha com as consignas de “primeiro a produção”, da ideia revisionista da convergência entre a “construção socialista” nas grandes cidades e o “desenvolvimento capitalista” no campo, da difusão na academia e na cultura da filosofia anti-marxista de que “dois se combina em um”, para derrotar os revisionistas. Nisso, a forte centralização do Partido potencializou o desenvolvimento sem igual da iniciativa revolucionária das massas.

Basta ficar num exemplo histórico concreto e singular: os Guardas Vermelhos, que se mobilizaram de todas as partes da China, com seus próprios recursos e inflamados pela convocação da esquerda a realizar a GRCP, para ir a Pequim aos milhões, deixaram suas vilas e povoados com enormes estandartes dos grandes chefes em direção à capital onde encontraram o Presidente Mao trajado com o uniforme dos Guardas Vermelhos e dali partiram para as mais remotas zonas do vasto país para levar as Diretivas do Partido sobre a Revolução Cultural a todas as massas trabalhadoras. Foram a verdadeira força propulsora da GRCP. Esse, que é um exemplo inapagável de máxima iniciativa, só pôde se desenvolver na medida em que a hegemonia da esquerda e passividade da direita se impuseram pela força da chefatura do Presidente Mao e seu manejo da luta de duas linhas no Partido e logo entre as massas e em toda a sociedade.

O próprio Presidente Mao fez questão de combater a perniciosa tese do “culto à personalidade” e chamou a atenção ao fato de que Kruschov, ao atacar a chefatura do camarada Stalin, cometia um grave erro:

“O Partido Comunista da China sustentou sempre que, ao negar totalmente Stalin mediante a chamada ‘luta contra o culto à personalidade’, o camarada Kruschov se equivocava completamente e perseguia objetivos ocultos. (…) a chamada ‘luta contra o culto à personalidade’ é contraposta à teoria íntegra de Lenin sobre a relação entre chefes, partido, classe e massas, e socava o princípio do centralismo democrático do Partido. (…) Persistimos constantemente na direção coletiva, mas nos opomos ao amesquinhamento do papel dos chefes”. (Sobre a questão Stalin, 1963)

“O partido do proletariado é o Estado-maior revolucionário e de combate do proletariado. Todo partido proletário deve praticar o centralismo baseado na democracia e formar uma forte direção marxista-leninista antes de poder se erigir em vanguarda organizada e de combate. Propor a chamada ‘luta contra o culto à personalidade’ é, na realidade, contrapor os chefes às massas, abalar a direção única do partido baseada no centralismo democrático, debilitar a força de combate do partido e desintegrar suas fileiras” (Proposição acerca da Linha Geral do Movimento Comunista Internacional, 1963)

“Nenhuma classe na história pôde subir ao Poder a menos que destacasse a seus chefes políticos, seus representantes avançados, capazes de organizar movimentos e dirigi-los”. (citando Lenin, Sobre a questão Stalin, 1963)

“É uma tarefa difícil e de longa duração formar chefes do Partido, experientes e de grande prestígio. Mas, sem eles, a ditadura do proletariado e a ‘vontade única’ deste não são mais do que frases vazias”. (citando Lenin, Sobre a questão Stalin, 1963)

“Alguns vêm efetuando intensamente a chamada ‘luta contra o culto à personalidade’, quando na realidade fazem todo o possível para denegrir o partido proletário e a ditadura do proletariado. Ao mesmo tempo, não lhes falta nenhum meio para louvar o papel de certos indivíduos, debitando a outros todos os erros e atribuindo todos os êxitos a si mesmos”. (Proposição acerca da Linha Geral para o Movimento Comunista Internacional, 1963)

Conclusão

A existência de chefes do proletariado, destacadamente de chefaturas de cada processo histórico, dirigidos pelos partidos comunistas dos diferentes países e ao nível do Movimento Comunista Internacional, é resultado inevitável do desenvolvimento desigual, por um lado, e da relação estabelecida por Lenin de “chefes – partido – classe – massas”. As chefaturas destacadas do proletariado, por sua vez, adquirem seu enorme prestígio na medida em que o pensamento-guia das revoluções por eles encabeçadas se demonstram corretos, o que se verifica pela transformação da realidade objetiva em proveito do proletariado guiado por esse conjunto de ideias apresentado, de forma mais desenvolvida, na sua Linha Política Geral. Quanto mais o partido bolchevique, encabeçado por Stalin, logrou transformar a realidade objetiva em benefício do proletariado e do povo na construção do Socialismo, na Guerra Pátria, na direção do MCI e do manejo da Frente Única Mundial, maior foi a comprovação da correção da linha geral de Stalin e de seu pensamento-guia e seus aportes de validez universal ao marxismo-leninismo, e maior foi sua autoridade ao longo do tempo, tanto na URSS quanto no mundo e, obviamente, por sua vez maior ódio despertou dos imperialistas e toda a reação mundial. Isso significa que Stalin e outras chefaturas detêm um “conhecimento sobrenatural”, como disse Kruschov? Sim e não. Enquanto indivíduos, não, mas enquanto lideranças revolucionárias, que manejam a maior máquina do conhecimento que é o Partido Comunista no manejo da linha de massas e da luta de duas linhas por distinguir a verdade da falsidade, sim, o camarada Stalin e todas as chefaturas de processos revolucionários em determinado nível de desenvolvimento centralizam um conhecimento em potencial que, tomado no processo global, sobrepassa em muito a capacidade de um homem singular, pois se refere à capacidade do Partido e das massas de conhecer a realidade circundante no processo infinito de sua transformação incessante. O poderio do pensamento de Stalin, como materialização de todo o processo global de conhecimento do Partido Comunista condensado em sua direção coletiva e, desta, como projeção, centralizada por quem dirige o Partido, era, neste sentido, “sobre-humano”, pois não se tratava da capacidade individual, mas da capacidade da classe operária com a sua ideologia científica, das massas e do sistema de comitês do Partido com seus chefes de conhecer e transformar o mundo – tomada em seu conjunto, ilimitada e todo-poderosa! Com base nessa ideologia todo-poderosa, porque científica, verdadeira, e na compreensão de que – ainda que ziguezagueante ao largo do curso histórico – a Revolução Proletária será vitoriosa, é que os comunistas e as massas revolucionárias têm – e isso se especifica na sua direção e, dentro dela, daquele que se destaca como principal formulador e dirigente do movimento prático que logra transformar, ao largo de vários anos, a realidade objetiva em benefício do proletariado e das massas populares e a serviço da revolução mundial. Esse processo não significa a conversão dos militantes em “cadáveres políticos” ou estéreis cumpridores de ordens: garante, por um lado, a sujeição de milhares ou “milhões de vontades a uma única vontade” (Lenin, Tarefas imediatas do Poder Soviético) e, por outro, garante a prevalência da linha de esquerda, que se converte em impulsionamento das iniciativas da esquerda – o que significará, inevitavelmente, que a direita encontrará dificuldades para levar adiante sua prática de um marxismo sem alma revolucionária.

É estupidez, pura e simples, o PCBrasileiro tentar explicar a derrota temporária do socialismo na URSS como resultado e reflexo de supostos problemas de direção do camarada Stalin. Sequer se refere às questões centrais, como a existência do revisionismo (senão que, ao contrário, admite que Kruschov teve a oportunidade de corrigir os erros). Apontar contra o proletariado para destruir a sua coesão. O que chama a atenção é que, o PCBrasileiro, lançando duras críticas ao “centralismo extremo” de Stalin, em sua prática, conforme demonstra a cisão recente, era extremamente administrativo e autoritário no trato das contradições. Kruschov, que acusa Stalin de ser intolerante, também era conhecido por seu tratamento autoritário e arbitrário – segundo consta nas memórias do próprio Kaganovich, Molotov e vários biógrafos. Não é raro que, por trás dos gritos contra a existência de determinados chefes e contra o “seguidismo” em relação a eles, se escondem personalidades sinistras, não raro pretensiosas e presunçosas, cujo afã de reconhecimento e de poder pessoais os conduzem obrigatoriamente, num ou noutro momento, mais cedo ou mais tarde, cavar com as próprias mãos o fosso escuro e insondável que tragará seus cálculos mesquinhos de indivíduo egoísta. Estes que sonham substituir os chefes surgidos, não de um dia de luta, mas de lutas de décadas de devoção total à causa comunista nas quais desconhecem a claudicação, aqueles cujo proselitismo é de conveniência a seus cálculos, que só reúnem os mais tíbios de caráter, não escolhem o caminho da luta franca e honesta, mas o vale-tudo enquanto arrota princípios e grandes citações clássicas, estes sim, são os que fomentam o “seguidismo” dos outros com relação a si mesmos: assim também foi Kruschov em relação a Stalin, Lin Piao e Teng Siaoping com relação ao Presidente Mao. Trata-se do primeiro passo para mudar a linha e a cor do Partido, como disse o Presidente Mao. Esse é o fundo da luta contra o “culto à personalidade” e o “seguidismo”.

Urge, aos marxistas-leninistas-maoistas, combater firmemente essa posição revisionista, oportunista, de “crítica ao culto à personalidade” e todas as suas decorrências que apontam contra o marxismo-leninismo-maoismo, principalmente maoismo e os aportes de validez universal do Presidente Gonzalo; cabe aos maoistas consequentes defender firmemente a experiência histórica da revolução proletária, em geral, e da ditadura do proletariado, em particular, para voltá-la à prática com superior consciência e decisão: fazer a Revolução em seu país, a serviço e como parte da Revolução Proletária Mundial.

Equipe Editorial
Servir ao Povo