Viva a heroica e gloriosa Guerrilha do Araguaia (Frente Revolucionária de Defesa dos Direitos do Povo – FRDDP, 1999)

Nota do blog: Publicamos a seguir o magistral documento “Viva a heroica e gloriosa Guerrilha do Araguaia”, de autoria da Frente Revolucionária de Defesa dos Direitos do Povo – FRDDP (Brasil), o qual consiste no primeiro balanço marxista-leninista-maoista da guerrilha na história do movimento comunista em nosso país. Este documento, datado de abril de 1999, foi originalmente publicado na internet em meados dos anos 2000, e é com grande júbilo que o republicamos agora.


Proletários e povos oprimidos de todo o mundo, uni-vos!

Viva a heroica e gloriosa Guerrilha do Araguaia

Camarada da Frente Revolucionária de Defesa dos Direitos do Povo – FRDDP (Brasil)
Abril de 1999

No dia 12 de abril completa-se 27 anos do início da Guerrilha do Araguaia, dirigida pelo Partido Comunista do Brasil. A preparação da guerrilha iniciou-se em 1966, com a implantação de dezenas de quadros do Partido no Sul do Pará, na região do rio Araguaia. Isto correspondia à decisão do Comitê Central e da Comissão Militar que definiram aquela região como a principal para preparar e desencadear a luta armada. A Guerrilha do Araguaia antes de tudo é produto da luta ideológico-política no movimento comunista brasileiro, em seu complexo enfrentamento com o revisionismo e o oportunismo de “esquerda”. É marco da saga de nosso heróico proletariado e prova cabal do papel revolucionário que joga o campesinato na história do país.

Foi a Guerrilha do Araguaia, apesar de seus equívocos, a luta que mais alto ergueu a bandeira da guerra popular no país, até hoje. Nela, ao longo de mais de três anos de combates, dezenas de abnegados comunistas verteram seu generoso sangue para abrir caminho à revolução brasileira, num contributo pioneiro de aplicar a estratégia maoista do cerco da cidade pelo campo. Contra ela, o feroz regime militar fascista pró-imperialismo ianque, lançou mais de 30 mil efetivos entre forças armadas e forças policiais. Em três campanhas de cerco e aniquilamento as forças armadas reacionárias aplastaram as nascentes Forças Guerrilheiras do Araguaia, embrião de um Exército Popular.

A audácia e heroísmo dos combatentes comunistas marcaram para sempre a vida do povo pobre do sul do Pará, de Tocantins e Maranhão. Passados 27 anos, os camponeses não esquecem os guerrilheiros, que com seu devotado trabalho lançaram raízes profundas de rebelião e revolução na região. Corre mato a fora, de vilas em vilas e de cidades a cidades, na boca do povo casos das façanhas dos combatentes comunistas. Embora tenham os fascistas feito questão de exibir para as populações os corpos mutilados dos guerrilheiros. Para muitos, Osvaldão, o gigante negro, não morreu e segue pela mata ajudando o povo. A guerrilheira Dina inspira as melhores atitudes do povo. A bravura com que enfrentaram os militares reacionários honrou para sempre o nome dos comunistas perante o campesinato pobre do Brasil.

Como muito bem definiu o camarada Pedro Pomar, dirigente do Partido em seu balanço daquela gloriosa batalha: “A experiência do Araguaia representou, inegavelmente, uma tentativa heroica para criar uma base política e dar continuidade ao processo revolucionário, sob a direção de nosso Partido. Tinha em vista formar uma sólida base de apoio no campo, desenvolver o núcleo de um futuro exército popular, poderoso, capaz de vencer as forças armadas a serviço das classes dominantes e do imperialismo ianque.”

​O Balanço da Guerrilha do Araguaia

1 – Operação Capitulação

O desfecho trágico do Araguaia vai expor de forma inequívoca os graves problemas ideológicos que afetavam a direção do Partido Comunista do Brasil, e como não podia deixar de ser, o próprio desfecho do Araguaia, que deles era resultante. Mais que isto, tais problemas se manifestam na postura dogmática, anti-marxista de determinados dirigentes em frear as discussões. O sepultamento da luta em torno da questão do Araguaia será feito com o auxílio da reação que, em dezembro de 76, logrou cercar e aniquilar os principais quadros revolucionários do Comitê Central, que tinham sobrevivido até aquele momento. O episódio conhecido como Chacina da Lapa (bairro de São Paulo, onde situava-se o aparelho em que se encontrava reunido o CC), separa em definitivo o Partido Comunista do Brasil da luta armada do Partido Comunista do Brasil revisionista e apodrecido em que derivou nos anos seguintes.

Entre a chacina da Lapa – em que foram massacrados por operativos das forças armadas reacionárias os camaradas Pedro Pomar, Ângelo Arroyo e João Batista Drummond – e os anos 80 adiante, mediou um período de golpes dados pelo grupo de João Amazonas, que através dos mais traiçoeiros expedientes, conduziu o Partido a sucessivos processos de renegação, apodrecendo-o completamente. Primeiro, barrou as discussões e a luta ideológico-política sobre a mais rica e cara experiência do Partido. Empalmando sua direção, perseguiu, expulsou e provocou cisões, para em seguida, a reboque do revisionista Enver Hoxha, decretar que o Presidente Mao nunca fora marxista. Mais adiante, já no auge da ofensiva geral da contrarrevolução mundial, com a “perestroika” à cabeça, etc., vai negar o próprio Enver Hoxha e como ele o camarada Stalin, do qual vinha se servindo como uma máscara, caricaturesca, do seu revisionismo irreversível.

A Guerrilha do Araguaia, seus resultados, tais como a luta ideológico-política sobre sua derrota e a “chacina da Lapa”, encerra uma importante contradição da luta de libertação de nosso povo. Nela se opõe revolução e contrarrevolução, marxismo e revisionismo: de um lado o heroísmo de seus combatentes e de outro a capitulação dos que sobreviveram e tomaram de assalto a direção do Partido para abandonar o caminho da revolução. Neste sentido, a Guerrilha do Araguaia é um fantasma para os revisionistas da camarilha de Amazonas, que da forma mais oportunista, se utilizam para tentar encobrir sua traição ao proletariado, realizando inconvincentes homenagens de tipo publicitárias e cada dia mais esquecidas. Mais que isto, o que a camarilha de Amazonas, servindo-se do nome heroico do Partido Comunista do Brasil, faz com sua política oportunista de direita e seu “programa socialista” de encomenda, é pisotear o sangue dos heróis do Partido Comunista.

​2 – A Posição do Camarada Pomar

Na contenda por analisar e sintetizar a experiência da heroica luta do Araguaia, tirando lições corretas da mesma, o camarada Pedro Pomar foi quem mais empenhou para assegurar o desenvolvimento da luta ideológica. Estava de fato profundamente convicto e comprometido com o maoismo. Seu documento de intervenção nos debates da fatídica reunião do CC, de dezembro de 1976, é uma preciosa análise desta luta. Resgata o valor dos combatentes, a determinação do Partido e todos os pontos positivos da experiência e submete todo seu balanço a uma rigorosa crítica. Contrapondo-se ao informe do camarada Ângelo Arroyo (membro da Comissão Militar e único dirigente sobrevivente dentre os que estiveram na região), que concluía ser a derrota de caráter militar e temporária, o camarada Pedro Pomar apontou que nenhum dos objetivos almejados pelo Partido se realizara. No fundamental aponta que o erro no Araguaia fora de concepção. Afirma que o Partido não aplicou a concepção correta de guerra popular e propõe alargar o debate, aprofundá-lo para seguir em frente levantando a bandeira da guerra popular e da estratégia do cerco da cidade pelo campo como caminho da revolução brasileira. Tarefa que não pôde prosseguir ao ser brutalmente assassinado ao final daquela reunião na qual interviera cheio de certeza e confiança: “O debate, ao nível do CC, da experiência da luta guerrilheira do Araguaia dará, segundo penso, os resultados que todos almejamos”, ao iniciar e ao concluir, “A bandeira da luta armada que empunharam tão heroicamente e pela qual se sacrificaram os camaradas do Araguaia deve ser erguida ainda mais alto. Se conseguirmos de fato nos ligar às grandes massas do campo e das cidades e ganhá-las para a orientação do Partido, não importa qual seja a ferocidade do inimigo, com certeza a vitória será nossa.”

3 – A experiência da Guerrilha do Araguaia serve à revolução

Como fato histórico nacional e marco da história do proletariado, das massas populares e do Partido Comunista do Brasil, a Guerrilha do Araguaia tem que ser glorificada e principalmente nos servir à retomada e continuação da causa revolucionária. Para tanto devemos extrair uma conclusão o mais precisa possível e partir da análise objetiva desse fenômeno social-ideológico-político.

Para estabelecer uma correta análise e síntese que nos permita tirar lições positivas e negativas da Guerrilha do Araguaia é necessário proceder a um completo exame, considerando três fatores fundamentalmente, tomados como unidade: Primeiro, há que se tomar todo o período que antecede a guerrilha, não tomá-la somente em si, mas considerando toda a luta ideológico-política que transcorre no seio do Partido desde o processo de 1962 e que decide por ela. Segundo, há que tomar a situação da luta de classes no país naquele período. E em terceiro, tomar as condições internacionais nas quais se inseria o período, tanto do ponto de vista da luta no seio do movimento comunista internacional – luta encarniçada contra o revisionismo soviético – quanto da luta entre revolução e contrarrevolução em geral.

Para que isto seja realizado de forma satisfatória é necessário a elaboração mais detida relativas aos fatores acima relacionados, além da análise circunstanciada dos acontecimentos da guerrilha, o que é extremamente imprescindível para o processo de reconstituição do PCB (Partido Comunista do Brasil) e desencadeamento e retomada da guerra popular. No momento, nos contentaremos em estabelecer seus traços gerais em forma de síntese:

a) A luta ideológico-política no Partido

A luta ideológico-política que define o caminho e a luta do Araguaia se inicia e é exatamente resultante do processo de reconstrução de 1962. Ou seja, o processo de 1962 dá início a um novo período na história do Partido, período que temos analisado e afirmado que segue nos dias atuais. Este período tem sido até então o mais importante da vida do Partido, pois ele se inicia com a luta aberta contra o revisionismo moderno e reformismo do bando de Prestes. Luta que se dá com o expurgo dos revisionistas do Partido. Esta luta conduz diretamente ao acercamento do Pensamento Mao Tsetung (como eram concebidos os aportes do Presidente Mao à época), que representa uma virada nas formulações do Partido em sua história, pois pela primeira vez o campesinato é tomado efetivamente como força revolucionária e não só, mas como força principal dirigida pelo proletariado. Na prática, a estratégia do cerco da cidade pelo campo através da guerra popular prolongada é estabelecida pela primeira vez, como caminho da revolução brasileira.

Mas, como demonstraremos, este grande salto dado na história do Partido terá seu desenvolvimento comprometido. A luta interna, precisamente a luta de duas linhas, concepção maoista do desenvolvimento e forja do Partido, será incorretamente manejada através do bloqueamento da luta no interior do Partido. Fato marcante disto é a VI Conferência de 66, primeiro processo mais amplo após a Conferência que deu início orgânico ao Partido Comunista do Brasil (sigla adotada para diferenciar-se da utilizada pelos revisionistas). Nela o documento central apresentado pelo CC para os debates, “União dos Brasileiros para livrar o país da crise, da ditadura, da ameaça neocolonialista” revela claramente muitas incompreensões do maoismo na análise da realidade.

Ao definir as classes sociais, segue com a definição equivocada do período anterior que toma burguesia burocrática (grande burguesia brasileira) por burguesia nacional. Definem como “contradições principais” do país as “contradições entre o povo e o governo” e “entre a esmagadora maioria da nação e o imperialismo norte-americano”. O que não permite uma análise dialética materialista, segundo a qual em um processo onde relacionam múltiplas contradições, somente uma é principal e determina as demais, por períodos determinados. Logo a concepção de frente que passam a defender está longe da concepção maoísta da Frente Única de classes revolucionárias, frente para sustentar a luta armada. Concebem uma “frente patriótica”, uma “união dos brasileiros”.

As contradições fundamentais do país seguiam sendo: contradição entre nação/imperialismo, proletariado/burguesia e campesinato pobre/sistema latifundiário, sendo esta última a principal e se expressava, naquelas condições de contrarrevolução em ascenso, em contradição massas/ditadura militar fascista pró-imperialismo ianque. Cabendo, portanto, estabelecer como nos ensina o Presidente Mao, uma frente única de classes revolucionárias, que no caso concreto era proletariado, campesinato pobre e pequena-burguesia. A burguesia nacional (média burguesia), em parte considerável, fora arrastada para a contrarrevolução com o golpe militar, inclusive boa parte da pequena-burguesia e só com o desenvolvimento da contrarrevolução irão, e no caso da burguesia nacional uma parte, descolar-se e passar à oposição ao regime militar. Então, a política de “união patriótica” revelava um desvio de tipo oportunista de direita, debilitando a tática do Partido para preparar e desencadear corretamente a luta armada.

Contra as formulações deste documento se levantou um grupo de camaradas militantes do Partido que, recém haviam regressado da China, apresentando o documento “Crítica ao oportunismo e subjetivismo de ‘União dos Brasileiros para…’”. O tratamento dado pela direção do Partido foi profundamente equivocado não permitindo que a luta em torno dos dois documentos fosse levada a frente e a todo o Partido. Esse método, seja sob quaisquer alegações é negação de um princípio marxista-leninista fundamental, o da luta ideológico-política interna no partido revolucionário do proletariado, princípio desenvolvido com o maoismo como luta de duas linhas, decisiva para forja ideológica do Partido. Único método correto e justo de tratar as contradições no seio do Partido, de forjá-lo como verdadeiro partido comunista, para estabelecer a linha proletária, manter o partido nela e combater as outras demais não proletárias, que surgem inevitavelmente, como reflexo das contradições de classes da sociedade a qual é parte. Tal prática sectária e dogmática levou à ruptura que deu origem ao Partido Comunista do Brasil – Ala Vermelha, sem que tais contradições se desenvolvessem.

Outro episódio que revelava estar a direção do Partido contaminada por concepções não-marxistas, refletidas claramente nos seus métodos de direção foi o que deu origem, anteriormente ao episódio da Ala Vermelha, ao PCR, Partido Comunista Revolucionário. Esta fração surge também em luta contra as concepções expostas no documento da VI Conferência e quanto às definições concretas da prática do Partido. No documento “Carta de 12 Pontos aos Comunistas Revolucionários” o camarada Manoel Lisboa estabelece uma correta e preciosa síntese tanto da análise de classes do país, quanto da estratégia e tática da revolução brasileira. Este documento contrasta completamente com o documento da VI Conferência, tanto na clareza e objetividade com que aborda o conjunto de problemas da revolução, quanto na indicação do caminho concreto para sua prática.

O camarada Manoel Lisboa define claramente o confronto estratégico, expondo que o campo da revolução é formado pelo proletariado, pelo campesinato e pela pequena-burguesia, especificamente de seus setores de estudantes e intelectuais. Aponta o caráter duplo da burguesia nacional, mostrando que esta é a média burguesia e que só se poderia incorporá-la na frente única, em determinadas condições e relacionando com a mesma com luta e unidade, após o Partido ter forças desenvolvidas: exército e bases de apoio. Ou seja, após o Partido ter estabelecido concretamente a base da frente única, a aliança operário-camponesa. Define a região do nordeste brasileiro como a região em que se condensa e se manifesta de forma mais aguda a contradição principal, aponta que a aliança operário-camponesa só pode se realizar através da luta armada, na qual o Partido do proletariado organiza e dirige a luta dos camponeses pobres pela terra, dando origem ao exército popular através da guerra de guerrilhas. Isto é, a guerra popular, aplicando o cerco da cidade pelo campo como único caminho, nos países dominados pelo imperialismo, para o proletariado levar a cabo a revolução. Afirma brilhantemente, que as condições desiguais de força entre a contrarrevolução e a revolução só podem ser alteradas passando a revolução a ser forte e a contrarrevolução débil, através da guerra popular prolongada que por etapas distintas e sucessivas, incorpora as massas à revolução. Apontou que, tomando todo o país o nordeste é campo e sudeste é cidade, e que, do ponto de vista do nordeste, o interior dos estados nordestinos é campo e o resto cidade. Isto para estabelecer claramente o que é principal entre campo e cidade e onde o Partido teria de concentrar sua força principal.

Além de afirmar que o campesinato é a força principal da revolução e o proletariado força dirigente, apontou que o campesinato nordestino era, tanto histórica quanto politicamente, o que mais experiência acumulada tinha. Sendo esta uma questão chave, veja, que já no ano de 66, antes de levar a fundo a luta ideológico-política no Partido sobre questões de tamanha envergadura, a direção do Partido Comunista do Brasil já tinha tomado a decisão a respeito de ser a região do Araguaia a principal. A prova disto é que o camarada Osvaldão, neste ano de 66, já se instalara no sul do Pará. Tal definição, revelava um subjetivismo em suas duas formas e de modo combinados: um mais de fundo, de tipo empirista ao definir uma região sem nenhuma tradição de luta, onde inexistia uma luta camponesa, de baixa população e rarefeita, desprezando o nordeste, região onde se manifestava de forma mais aguda a contradição principal e com isto toda a riqueza histórica da resistência das massas nordestinas em geral e do seu campesinato em particular. A outra forma é de tipo dogmático, claramente herdado do período anterior da direção oportunista, do método de tratar as contradições no Partido, de não ver a luta ideológica como forja. Isto é revelado também enquanto questões de definições estratégicas.

Está provado pela experiência das lutas dos povos que, se não é possível esconder uma revolução, também sua preparação não se pode ocultar. Não se pode confundir trabalho secreto, estanque, compartimentado com ocultar as atividades políticas do Partido. O trabalho secreto é a rede do Partido que dirige toda uma rede para o trabalho aberto, a qual serve-se de todas as formas abertas possíveis para levar suas bandeiras, aplicar a tática revolucionária, as palavras de ordem e sua propaganda para as massas. Ou seja, só podemos preparar a luta armada, inclusive as tarefas de caráter conspirativo, onde existem condições objetivas para tal e mais, onde existem condições subjetivas mais desenvolvidas e isto só pode se dar onde as massas, por determinação de leis objetivas, são parte da contradição principal e por isto mesmo, por decorrência direta têm mais experiência de organização e luta, ainda que esta se encontre apenas no nível do espontaneísmo.

Mas é preciso ter claro, que embora sofresse de desvios sérios, a direção do Partido neste período está definida ideologicamente pelo pensamento maotsetung, ainda que não consiga aprofundar sua assimilação, o que o conduzirá ao seu afastamento. Assim, desenvolveu uma importante luta, não só contra o revisionismo, mas também contra o oportunismo de “esquerda” que afetava profundamente o movimento revolucionário de todo o continente latino-americano e do país. A revolução cubana causara um impacto muito grande no país e em toda a região e como ela se desenvolveu no campo do revisionismo, como uma vertente de luta armada que servia ao jogo do social-imperialismo soviético, pôde com sua influência galvanizar amplos setores de esquerda, particularmente contingentes de estudantes, por meio de teses de caráter de classe pequeno-burguês. Assim foi arrastado para concepções militaristas, foquistas e outras, um grande número de revolucionários. O Partido Comunista do Brasil não só não se deixou seduzir por tais teses, que havia arrastado quadros importantes como Marighella, como as combateu energicamente. O documento “Guerra Popular Prolongada, caminho da luta armada no Brasil” (de 69) é um documento que reflete o esforço e maior desenvolvimento do Partido na luta contra o revisionismo e o oportunismo de “esquerda” e de defesa da estratégia da guerra popular prolongada através do cerco da cidade pelo campo.

No entanto, devemos tomar como dado concreto, que os desvios dos quais sofria a direção do Partido que implicou na manifestação de subjetivismo nas duas formas já assinaladas acima. Serão os fatores principais que determinarão, em grande parte, as causas da derrota da Guerrilha do Araguaia. Ou seja: empirismo e dogmatismo como expressão do subjetivismo. Um como resultante do outro, bloqueando a luta ideológica impedindo que o Partido se forje, que não abrigue concepções errôneas, que as combata abertamente. Subjetivismo que conduz à definição da área principal, não a partir da luta de classe objetiva e sim por critérios que melhor atendam ao trabalho conspirativo e melhor terreno para a luta militar. O Partido errou em não levar a fundo a luta de duas linhas para forjar a ideologia, seu manejo do marxismo, expresso no programa e linha política geral revolucionários, encarnada numa direção temperada.

b) A situação da luta de classes no país nos anos 1960

Quanto às condições em que se desenvolvia a luta de classes no país, não é difícil compreender que havia uma contrarrevolução em ascenso. A partir do golpe militar de 1964, em que se golpeou duramente o movimento de massas em seu pleno auge sob hegemonia do nacional-reformismo, a contrarrevolução se torna ano após ano em contrarrevolução que aplica o terrorismo de Estado. Nestas condições exige-se estabelecer uma correta análise de correlação de forças, para dispor claramente as tarefas principais do Partido em preparar a si e às massas fundamentais para a luta armada. Ou seja, era necessário organizar a resistência de forma a preservar forças, atuar na defensiva, do ponto de vista estratégico, e em preparação, centrando forças e métodos corretos de resistência onde as condições são mais propícias, isto é, onde a contradição principal se agudizava mais. A direção do Partido Comunista do Brasil foi a que menos erros cometeu nesta questão. Não se deixou levar pela tentação e mesmo por um certo “modismo” de imediata luta armada que tomou conta dos meios revolucionários naquele período.

E isto não era simples, pois a história de reformismo e pacifismo na vida do Partido gerou um sentimento muito forte de repulsa pelo revisionismo descarado empurrando revolucionários para os braços de concepções pequeno-burguesas. Esta situação levou a um obscurecimento e imediatismo. Criou uma ilusão. O caminho armado apontado pelo castrismo e guevarismo não correspondia à teoria militar do proletariado, a guerra popular, mas sim chocava frontalmente com ela, era uma teoria pequeno-burguesa, antimarxista que desprezava o Partido Comunista como necessidade e direção absoluta do processo revolucionário e da luta armada, desprezava a análise científica da realidade generalizada numa fórmula vulgar, segundo a qual, a revolução “ou era socialista ou era caricatura de revolução”. Assim que, os processos influenciados por esta concepção fracassaram por completo, levou o movimento revolucionário a uma derrota profunda e onde, por determinadas particularidades ele prosseguiu, apenas sobreviveu sustentado e financiado pelo social-imperialismo soviético através de Cuba, até que, por fim, capitularam vergonhosamente. Aí estão as revoluções de Nicarágua, El Salvador, Guatemala e as atuais guerrilhas negociadoras como as FARC-EP, ELN, MRTA e EZLN, para citar os principais.

Nisto pesava também outra concepção revisionista que era e segue nos dias de hoje muito cristalizada, a de que a luta armada só se justifica se não existem mínimas liberdades democráticas. Logo, se o que existe é uma ditadura fascista ou se faz luta armada ou não se é revolucionário. Errado, isto não é marxismo é revisionismo. A luta armada é a forma superior de luta a qual um verdadeiro Partido Comunista organiza segundo as condições objetivas e particularidades de cada país. Exatamente ao contrário deste raciocínio, que os oportunistas hoje utilizam para negar a luta armada afirmando que estamos na democracia, devemos utilizar as conquistas democráticas, por mais estreitas que sejam, para realizar da forma mais ampla possível nossa propaganda revolucionária e preparação para desencadear a luta armada. Quando a contrarrevolução passa à ofensiva significa que a correlação de forças se alterou, ainda que momentaneamente, a seu favor. Aí deve-se adotar formas e métodos adequados de resistência com vistas a só avançar ao primeiro sinal de que sua ofensiva está se esgotando.

Contudo, apesar de travar esta luta, de perceber com mais clareza a correlação de forças que se desenvolvia no país, que a contrarrevolução não poderia seguir em ascenso por longo período e que quando começasse a esgotar seu ascenso as condições para avançar estariam dadas, a direção do Partido Comunista do Brasil caiu no subjetivismo ao definir a região do Araguaia como área principal. Este erro, anulou o acerto que tinha obtido na compreensão da correlação de forças. E tal erro foi determinado pelo dogmatismo, pois não bastava assumir o pensamento maotsetung, isto era imprescindível, mas era necessário levar a luta de duas linhas profundamente para assimilá-lo cada vez mais, para compreender mais a realidade, para não cair no subjetivismo. Muito ao contrário, o que teremos é uma regressão já em 1970, quando se opondo ao grande salto que se conformava o IX Congresso do PCCh, a direção do Partido, através do documento “A atualidade das ideias de Lenin” rompia seu desenvolvimento pelo caminho do maoismo, enveredando cada vez mais pelo revisionismo de tipo albanês de Enver Hoxha.

c) A luta contra o revisionismo moderno a nível internacional e a luta pela unidade dos povos para combater o imperialismo ianque e o social-imperialismo soviético

A década de 1960 está marcada por três grandiosos acontecimentos na luta ideológica no seio do movimento comunista internacional, acontecimentos que têm lugar na República Popular da China e no seu comando está o Presidente Mao. A Carta Chinesa de 14 de junho de 1963, a Grande Revolução Cultural Proletária de 1966 e o IX Congresso do Partido Comunista da China de 1969. Esse processo, do ponto de vista internacional, tem sua origem no XX Congresso do PCUS (1956), onde o bando traidor de Nikita Kruschov, através de lançar um mar de lama sobre o camarada Stalin, preparou o terreno para que suas bandeiras de restauração capitalista fossem hasteadas. Deu a palavra de ordem para a traição e lançou o movimento comunista internacional à beira do abismo da capitulação completa. Contra essa traição se levantaram vários Partidos Comunistas encabeçados pelo Partido Comunista da China e o Partido do Trabalho da Albânia.

Aplicando o justo método de luta de duas linhas, o Presidente Mao que já vinha travando dura luta contra as tendências direitistas no PCCh, ataca duramente as posições de Kruschov e faz a mais intransigente defesa do marxismo-leninismo. Tal luta segue exclusivamente no âmbito interno dos partidos em confrontação. Nas Conferências de Partidos Comunistas e Operários de 1957 e de 1960, o Presidente Mao faz a defesa dos princípios do marxismo-leninismo o que obriga o oportunismo kruschovista a fazer recuos, mas as declarações destas conferências são ambíguas. Os comunistas chineses à frente dos de outros países tentam levar a luta de forma a favorecer o campo revolucionário no interior do PCUS, que nessas alturas dos acontecimentos já fora esmagado, a fazer uma reviravolta, o que fracassa. Após vários ataques aos comunistas chineses e albaneses feito por Kruschov em diferentes oportunidades e na impossibilidade de seguir com a luta somente no âmbito dos Partidos em confrontação, o Partido Comunista da China, encabeçado pelo Presidente Mao faz publicar no dia 23 de junho de 1963 as “Proposições acerca da linha geral do movimento comunista internacional”, documento conhecido como a Carta Chinesa ou Carta de 25 Pontos, onde fazendo a defesa do marxismo-leninismo, desmascara o novo revisionismo que surgia, levantando alto a bandeira da revolução proletária mundial e sua continuidade.

Posteriormente, será difundido os “9 Comentários” em respostas aos ataques dos revisionistas soviéticos. O Presidente Mao sintetiza as posições do revisionismo moderno de Kruschov no que denominou de “dois todos” e “três pacíficos”, isto é: “governo de todo o povo” e “Partido de todo o povo”, onde Kruschov substitui as concepções de Ditadura do Proletariado e Partido do Proletariado por conceitos burgueses de Estado e partido. Quanto aos “três pacíficos” desmascara as teses revisionistas de “coexistência pacífica”, “transição pacífica” e “emulação pacífica”, onde Kruschov substituía a justa tese leninista de coexistência pacífica para basear as relações entre Estados de regimes sociais diferentes, por uma coexistência pacífica para reger as relações que se dão dentro do Estado, ou seja, entre classes antagônicas. Coexistência, transição e emulação pacíficas para negar a luta de classes e a competição econômica para definir qual sistema era melhor. Ou seja, provar que o “socialismo real” era superior ao capitalismo levaria a todos no mundo a se tornarem partidários do socialismo.

O Presidente Mao é elevado a chefe da revolução proletária mundial, estabelece a linha para unir os povos por lutar contra os inimigos ferozes da revolução proletária e da libertação nacional, o imperialismo norte-americano e o social-imperialismo soviético, estado fascista surgido do assalto ao Estado Proletário, promovido pela burguesia de novo tipo expressa na burocracia estatal e partidária soviética. São duas superpotências que passam a rivalizar, pugnar e conluiar na disputa pelo controle e influência sobre os países e povos do mundo. Levantando a bandeira leninista de “Proletários, povos e países oprimidos do mundo uni-vos!”, o Presidente Mao conclama à luta para continuar a revolução, conjurar o perigo de nova guerra mundial e de desencadear a guerra popular mundial se os imperialistas levam adiante seus planos de agressão. Com a perda do poder pelo proletariado soviético a partir do XX Congresso do PCUS (1956), a correlação de força a nível mundial entre revolução e contrarrevolução modificara, acarretando por consequências, em meados dos anos 1960, inúmeros golpes de Estado em países da Ásia, África, Oriente Médio e América Latina, como foi o golpe de 1964 no Brasil.

Em 1966, se desencadeará a Grande Revolução Cultural Proletária chefiada pelo Presidente Mao, em que milhões e milhões das massas populares mobilizam-se para assegurar o Poder proletário, defender a ditadura do proletariado, derrubar os defensores da via capitalista e levar a fundo a transformação ideológica da sociedade. A GRCP se configura como magistral desenvolvimento do marxismo-leninismo feito pelo Presidente Mao, materialização da continuação da luta de classes e da revolução sob a ditadura do proletariado, para desenvolver e consolidar o socialismo e preparar a sociedade para transitar ao comunismo. A GRCP é a mais gigantesca mobilização de massas da história, onde milhões se lançaram na luta, não por comida ou outro bem material imediato, mas para manter o Poder proletário e pela transformação ideológica completa da sociedade. O IX Congresso do PCCh vai consagrar na nova direção partidária surgida em meio à GRCP, o Pensamento Mao Tsetung como guia da revolução mundial. A direção do Partido Comunista do Brasil não compreendeu tal processo e foi cada vez mais se afundando pelo caminho revisionista de Enver Hoxha.

Na grande contenda, o social-imperialismo trama com o imperialismo norte-americano para aplastar a República Popular da China e afogar em sangue os processos revolucionários em curso em diferentes países. O imperialismo norte-americano bombardeia o Vietnã do Norte e o social-imperialismo soviético empurra a Índia contra a China Popular, além de manobrar e manipular diferentes organizações, partidos e processos de luta como na África e América Latina visando estender seus tentáculos. O mundo inteiro, inclusive as potências imperialistas, na segunda metade da década de 1960, será sacudido por gigantescos movimentos de massas. A agressão contra o Vietnã pelo imperialismo ianque, começa a sofrer pesadas derrotas apontando a vitória da guerra popular. Todo este processo tormentoso em que se confronta a revolução e contrarrevolução, a Grande Revolução Cultural Proletária que havia barrado a restauração capitalista na China desde 1966, não logra se manter e cai após a morte do Presidente Mao em 1976, encerrando um longo ciclo revolucionário, a primeira grande onda da revolução proletária mundial, iniciada com o lançamento do Manifesto do Partido Comunista por Marx e Engels em 1848 e a Comuna de Paris em 1871.

A compreensão destes três fatores analisados e tomados como unidade nos explica de maneira inequívoca as bases sobre as quais se deram as causas da derrota do Araguaia. E mais que isto, ela esclarece a razão de que com esta derrota e a “Chacina da Lapa”, o Partido sofreria uma profunda conversão ideológica que o conduziria da capitulação da luta armada transitada gradualmente até ao apodrecimento completo no charco do revisionismo.

4 – A Guerrilha do Araguaia e o Partido Comunista do Brasil

O Partido Comunista do Brasil, como nenhuma outra organização política, não passou imune a toda esta gigante frágua ideológica e de tormentoso confronto de revolução e contrarrevolução que se deu a nível mundial, nas décadas de 1960 e 1970. É em meio destes embates que se transcorreram os acontecimentos do Araguaia entre 1974, a partir do ataque das forças armadas reacionárias às três áreas dos três destacamentos, quando a terceira campanha de cerco e aniquilamento dos militares reacionários aplastou a guerrilha. O Partido Comunista do Brasil preparou e dirigiu a guerrilha sob o influxo de toda essa contenda do movimento comunista internacional. Tudo isto pesou fundamentalmente em como enfrentou a derrota e como buscou sair adiante. A análise circunstanciada dos acontecimentos do Araguaia apresentada nos debates do CC pelo camarada Pomar é sem dúvida a mais correta. Nela, ele identifica, após ressaltar os pontos positivos, os principais erros e o de fundo que os debita à concepção que presidiu a intervenção do Partido naquela luta.

Erros como o de dar enfrentamento ao ataque das forças armadas reacionárias quando estas descobrem que o Partido estava se preparando, quando deveriam retirar-se; erros de só iniciar o trabalho de caráter político com as massas após iniciada a luta militar; erros de concentrar as forças após as primeiras campanhas do inimigo, quando se deveria dispersar. Tudo isto aliado aos erros de preparação que praticamente tratou o problema da guerra definindo-a como tarefa de “especialistas”, além do erro de não estabelecer organizações partidárias no perímetro da atividade guerrilheira e o de não conceber a Guerra Popular – em nossa particularidade – como necessária no campo e cidade, são violações flagrantes dos princípios e conceitos da guerra popular em geral e da guerra de guerrilhas em particular. A conclusão portanto do camarada, chegada até aquela altura, em que foi assassinado, é a mais correta, porém insuficiente. Por quê? Quando aponta que o erro era de concepção tira uma conclusão acertada, no entanto ele não faz a pergunta evidente que a sua conclusão constata. Ou seja, o que levou a prevalência de tal concepção e não da correta concepção de guerra popular? Responder corretamente a esta questão, para nós, fecha o quadro da análise justa experiência da Guerrilha do Araguaia.

Para nós, ao expor uma análise dos três fatores que envolviam o desenvolvimento do Partido Comunista do Brasil serve exatamente a dar resposta clara a esta indagação. O que levou a direção do Partido Comunista do Brasil a decidir-se já em 1966 pela região do Araguaia, como área principal, para estabelecer, implantar, preparar e desencadear a luta armada não é nenhum mistério. É do próprio camarada Pomar, quem fez a mais dura crítica à concepção de “guerra popular” que prevaleceu no Araguaia, a seguinte afirmação ao ressaltar os aspectos positivos da guerrilha: “Destaco também a escolha da área, que nas condições atuais do país se revelou propícia à nossa estratégia. Apesar de sua baixíssima densidade demográfica e de não possuir nenhuma tradição política nem organizativa de massas, oferecia excelente posição para a defesa.” Isto é confirmação de que a direção tinha uma concepção equivocada sobre questões de fundo, não somente relativo à guerra popular mas a de caráter político geral, determinado por um subjetivismo, além de certo desvio “militarista”.

Primeiro o subjetivismo os conduz a estabelecer como área principal uma região, que como o próprio camarada Pomar tem consciência, de baixíssima densidade demográfica e sem tradição política e organizativa de massas, desprezando a região nordeste e a experiência do seu campesinato. Segundo manifesta-se um certo “militarismo” ao considerar o terreno como fator que define a luta armada. Isto poderia ser correto em outra condição, como já em meio da luta armada em curso, mas jamais para definir a área principal. Para isto o fator determinante sempre é o político, o que não existia em quase nenhum aspecto na região do Araguaia. Podemos ver então, que o próprio camarada Pomar que vê com tanta clareza os erros cometidos no curso da luta, inclusive concluindo corretamente como sendo esses erros, fruto de uma concepção equivocada sobre a guerra popular, incorre também nele e segue, na sua avaliação crítica, defendendo como acertada, a escolha da região do Araguaia, como área principal para preparar e desencadear a luta armada.

Respondendo então à pergunta do que levou a direção do Partido Comunista do Brasil a tomar já em 1966 essa definição, concluímos, como já levantamos acima ao tratar do primeiro fator: O não levar adiante a luta de duas linhas, a direção do Partido Comunista do Brasil bloqueou sua própria assimilação do pensamento maotsetung e com isto a compreensão necessária na análise da nossa realidade e de outras questões centrais, tal como a própria concepção integral e justa da guerra popular. Revela-se que a direção herdou do processo anterior do velho Partido, do reformismo, mandonismo, revisionismo e oportunismo de anos a fio, toda uma concepção dogmática e antidemocrática de partido e quanto aos métodos de direção e de tratamento das contradições no seio do Partido. Esta herança vai predominar e levar a direção do Partido Comunista do Brasil a decidir sobre questões estratégicas, como a área principal para desencadear a luta armada, tratando-as como mera questão conspirativa.

Já em 1966, antes de se travar uma profunda luta de duas linhas a respeito da ideologia, do revisionismo, da experiência histórica e internacional do proletariado revolucionário, bem como da origem do reformismo na história do Partido, de um balanço rigoroso e sistematizado da história do Partido, toma decisões desta envergadura encerrado num pequeno círculo do CC ou quem sabe, numa mais estreita, comissão executiva ou militar. No balanço que faz a direção do Partido Comunista do Brasil sobre a história do Partido, exposto tanto na Declaração da Reconstrução quanto no artigo mais elaborado de 1972, “Cinquenta anos de luta”, ela comete erros graves. Erros tais como o de considerar genericamente que até o seu IV Congresso (dezembro/1954-janeiro/1955), inclusive, os congressos do Partido foram todos congressos revolucionários e mais, adotam a mesma avaliação oportunista de Prestes, sobre o caráter “esquerdista” do IV Congresso. Ora, até os dias atuais o Partido em sua história não realizou nenhum congresso revolucionário e o IV Congresso no que é essencial, está longe de expressar um oportunismo de “esquerda”, muito ao contrário, ele é manifestação de oportunismo de direita. Basta tomar sua definição de criação de forças armadas populares partindo das forças armadas reacionárias “depurando-se delas seus elementos fascistas.” Além do que toda a concepção oportunista de direita, de influência browderista, sobre a revolução democrática está na base da análise de classes que o IV Congresso faz da realidade brasileira.

No concreto, determinada pelo subjetivismo, na forma de dogmatismo principalmente, a direção do Partido Comunista do Brasil tratou formalmente a luta ideológica, fechando-se dentro do CC uma unidade formal assentada no ecletismo ideológico. Abrigava no seu interior posições anti-maoistas. Ora, isto era sintoma claro de que a questão ideológica não estava resolvida e sim tratada de forma dogmática. Se estabelecermos uma comparação com outros processos de outros países podemos entender a gravidade deste problema. Tomemos o processo do Peru que é o mais rico e mais importante processo revolucionário da América Latina. É do mesmo período que do Brasil a ruptura orgânica com o revisionismo no Peru, precisamente um ano após a nossa (1964). Inclusive, ao contrário do que se passou aqui, no Peru os revisionistas ficaram em minoria e foram expulsos do PCP. As bases se uniram e expulsaram a direção revisionista, na IV Conferência de janeiro de 1964, aderindo ao pensamento maotsetung, com todas as definições que acarretava. No entanto, a luta armada só foi ter início em 1980.

Foram dezessete anos de duras lutas de duas linhas em que se conformou a Fração Vermelha liderada pelo camarada Abimael Guzmán, para levar a cabo a reconstituição do PCP, estabelecendo-se uma direção efetivamente maoista. Mais que isto, este processo conduziu a um grandioso salto que é a compreensão magistral dos aportes do Presidente Mao pelo camarada Abimael, Presidente Gonzalo, que estabelece que o maoismo e não somente pensamento maotsetung, é uma nova, terceira e superior etapa do marxismo.

Em sua monumental entrevista a El Diario (1988), o Presidente Gonzalo respondendo sobre que lições importantes tirava do processo do PCP relata: “O processo de reconstituição vai desenvolver-se no Partido até o ano de 78/79 por volta desses anos termina este período e vai se entrar em um terceiro momento, o momento da Direção da guerra popular no qual estamos vivendo.

Que lições poderíamos tirar? A primeira lição, a importância da base de unidade partidária e sua relação com a luta de duas linhas; sem esta base e seus três elementos – 1) marxismo-leninismo-maoismo pensamento Gonzalo; 2) programa e 3) linha política geral – não há sustentação para a construção ideológico-política do Partido; porém sem luta de duas linhas não há base de unidade partidária. Sem uma firme e sagaz luta de duas linhas no Partido não se pode colher firmemente a ideologia, não se pode estabelecer o programa nem a linha política geral assim como tampouco defendê-los, aplicá-los e menos ainda desenvolvê-los. A luta de duas linhas para nós é fundamental e tem a ver com conceber o Partido como uma contradição em concordância com o caráter universal da lei da contradição. Uma segunda lição, a importância da guerra popular; um Partido Comunista tem como tarefa central a conquista do Poder para a classe e o povo; um Partido uma vez constituído e considerando as condições concretas tem que brigar por concretizar esta conquista e somente pode fazê-lo mediante a guerra popular, e, uma direção não se improvisa, se requer longo tempo, dura briga, árdua luta para se forjar uma direção, particularmente para que seja uma direção da guerra popular.”

O processo chamado de Reorganização de 1962 (Partido Comunista do Brasil – PCdoB) é na verdade, o início do período de luta pelo estabelecimento do PCB – Partido Comunista do Brasil, como Partido Comunista marxista-leninista-maoista (pensamento maotsetung à época). Este processo sofreu de grandes insuficiências, mas foi o mais avançado passo que deram até então os comunistas no Brasil na luta por um verdadeiro partido e abriu uma nova e mais avançada etapa na história do Partido. Incorreu em erros que o impediu de se forjar ideologicamente para resolver corretamente as tarefas fundamentais e centrais da revolução. A dispersão de forças (PCR e Ala Vermelha) e a Guerrilha do Araguaia foram resultantes destas decisões e destes erros. Nisto reside a causa fundamental da derrota da Guerrilha do Araguaia. A Guerrilha do Araguaia nas duras lições que nos dá, é eternamente gloriosa, inesquecível e como tal são heroicos seus combatentes. Na luta para concluirmos a Reconstituição do Partido e desencadear a guerra popular, como continuadores dos guerrilheiros do Araguaia orgulhemo-nos infinitamente do seu devotamento e pioneirismo. Mantenhamos erguida e bem alta a gloriosa bandeira do Araguaia!

Viva a heroica e gloriosa Guerrilha do Araguaia!
Abaixo a camarilha revisionista e traidora de Amazonas e Rabelo!
Viva a Reconstituição do PCB – Partido Comunista do Brasil!
Viva o marxismo-leninismo-maoismo!
Viva a guerra popular prolongada!