100 Anos da Coluna Prestes: Instruções para o Movimento Guerrilheiro (Luiz Carlos Prestes, 1935)
Nota do blog: Em celebração aos 100 anos da Invicta Coluna Prestes, completados em 5 de julho de 2024, publicamos a orientação de Prestes de “Instruções para o Movimento Guerrilheiro“, de 1º de novembro de 1935, que indica sua posição do caminho do campo à cidade e da guerra camponesa sob direção do proletariado – o que posteriormente seria definido no maoismo como o caminho do cerco da cidade pelo campo (CCCC). É importante ressaltar que, na época em que esta orientação foi escrita, Prestes já havia se tornado um revolucionário comunista e alçava-se como principal dirigente da Aliança Nacional Libertadora – ANL, frente dirigida pelo Partido Comunista do Brasil na década de 1930 do século XX, consistindo em grande salto na sua compreensão acerca da revolução brasileira. Recentemente, também publicamos o “Manifesto de Santo Ângelo” e a “Carta a Roberto Sisson” como parte da celebração a este importante marco histórico da luta pela revolução democrática no Brasil.
Instruções para o Movimento Guerrilheiro
Luiz Carlos Prestes
1º de Novembro de 1935
1º — A grande massa de nossa população do interior está, nos dias de hoje, frente a um terrível dilema — morrer de fome —, pura e simplesmente, ou lutar de armas nas mãos, por melhores condições de vida. Por isso todos os revolucionários brasileiros têm a obrigação de orientar e dirigir as lutas dos trabalhadores do interior e de não ficar à espera de uma insurreição de caráter nacional, emanada do centro, coisa quase impossível, dadas as condições de extensão e de dificuldades de comunicação no Brasil.
2º — Todo o verdadeiro revolucionário, principalmente os que conhecem o interior do país e, portanto, em primeiro lugar, os que tomaram parte na marcha da Coluna Prestes, precisam, onde estiverem, ligar-se com o povo e fazendo esforços para compreender seus desejos, orientá-lo, organizá-lo e dirigi-lo na luta por tais desejos ou reivindicações.
3º — É essencial organizar os trabalhadores do campo, operários ou camponeses, e junto com eles toda a população pobre do interior do país. Tais organizações podem ser ligas camponesas, comitês populares, comitês contra a fome etc. O nome não tem importância. O essencial é que a organização surja, abraçando a maior massa possível da população pobre e que na sua direção estejam os elementos mais combativos, os mais revolucionários, revelados nas lutas parciais e não somente em discursos.
4º — Tais comitês devem lutar fundamentalmente por melhoria de salários, melhores condições de trabalho, contra as obrigações feudais (trabalho de meia, terça, prestação de serviço gratuito) e pela posse da terra, livre de qualquer pagamento; devem lutar contra o pagamento em vales, contra a obrigação de comprar nos armazéns das fazendas, contra os impostos e prestações de serviços gratuitos aos governos etc.
5º — Não ter medo das transformações inevitáveis de tais lutas em lutas armadas. Pelo contrário, desde o começo prever tais transformações, perfeitamente compreensíveis para a massa trabalhadora do interior e tomar todas as medidas para desarmar a polícia, as forças de capangas de fazendeiros e os bandos reacionários, organizando simultaneamente os grupos armados que defenderão os camponeses em luta por suas reivindicações.
6º — Sempre que se dominar uma região, por menor que seja o tempo de tal dominação, satisfazer as reivindicações do povo (distribuição de víveres, de roupa, dinheiro, ferramentas etc.), queimar a papelada dos cobradores de impostos e dos juízes e polícia e se for possível, fazer o comitê local distribuir a terra dos grandes latifúndios.
7º — Se forem enviadas forças muito fortes, evitar combates decisivos e com os elementos mais combativos e decididos, organizar grupos armados, que se movimentem, propagando por todo o interior do país a bandeira de luta por pão, terra e liberdade. Os grupos de guerrilheiros devem lutar contra os grandes fazendeiros, contra os cobradores de impostos, contra a polícia e os reacionários. Tomando os armazéns das fazendas, distribuir víveres, roupas, ferramentas e dinheiro entre a população pobre, tratando, ao mesmo tempo, de organizá-la e levá-la à luta por seus interesses.
8º — Evitar, o mais possível, atacar os pequenos comerciantes e mesmo os camponeses ricos que não estejam direta ou abertamente contra o povo. Nem deles nem da população pobre, não tomar cousa alguma. Tomar dinheiro dos ricos para pagar tudo o que for comprado a tais elementos, o máximo respeito pela vida, honra e bens de todos os que não lutarem contra os guerrilheiros. Toda a violência contra os fazendeiros e grandes comerciantes reacionários odiados pelos povo.
9º — Na luta de guerrilheiros, empregar uma tática militar e hábil e baseada nos seguintes princípios fundamentais:
- Poupar o elemento homem. Só combater quando julgar o momento favorável. Nunca aceitar combates em condições desfavoráveis.
- Nunca ficar em defensiva. Tomar sempre a ofensiva. Se uma força adversária vem atacar o ponto que ocupamos, ou abandoná-lo antes que ela chegue, ou marchar a seu encontro para combatê-la ainda em marcha.
- Nunca se deixar surpreender, mas tratar de surpreender sempre o adversário, batendo-se pela retaguarda ou pelos flancos. Empregar o mais possível as emboscadas sucessivas e obrigar o adversário a uma vigilância constante e fatigante.
- Não atacar grandes cidades nem pontos fortificados, mas tratar de ocupar cidades e vilas logo depois que tenham sido evacuadas pelo adversário, prendendo seus agentes e punindo os adversários do povo.
- Organizar o mais vasto serviço de espionagem pela própria população do campo e manter um serviço de ligação bem organizado, de maneira a esnr sempre a par dos movimentos das forças inimigas.
- Não poupar as vidas dos comandantes e dos oficiais reacionários, tratando, ao mesmo tempo, de ganhar para a revolução os soldados do governo.
- Sempre quer for possível, conservar presos homens de influência ou pessoas de famílias ricas ou poderosas, exigindo dinheiro ou liberdade de companheiros em troca de sua libertação.
10º — As lutas devem continuar, até que o Governo Popular Revolucionário esteja dominando no Brasil. As condições naturais do país permitem desenvolver lutas de pequenos grupos, sem o menor receio de que sejam derrotados. O exemplo de Lampeão é bastante convincente. O exemplo da Coluna Prestes serve também para mostrar que quando dois ou mais grupos quiserem se reunir isso será possível e que colunas de centenas de homens poderão lutar vitoriosamente contra todas as forças da reação, facilitando ao proletariado nas cidades começar a desenvolver suas lutas.
11º — Sob nenhuma condição, nem quaisquer que sejam as promessas do governo (que serão muito grandes enquanto os guerrilheiros tiverem armas) não entregar as armas, guardá-las sempre para exigir o cumprimento das promessas que por acaso forem feitas. Em cada localidade onde os guerrilheiros dominarem precisam transformar os grupos armados em milícias populares que só obedecem ao povo ou ao Governo Popular Nacional Revolucionário com Prestes à frente.