Enver Hoxha Refutado (Partido Comunista do Sri-Lanka, 1981)

Nota do blog: Apresentamos a nossos leitores um importante documento da história da luta de duas linhas do Movimento Comunista Internacional (MCI) uma contundente resposta do Partido Comunista do Sri-Lanka ao revisionista Enver Hoxha, refutando seus ataques rasteiros ao Presidente Mao Tsetung. A publicação em questão, contudo, tem vários pontos de vistas que consideramos incorretos, provavelmente, influenciados pela linha de Bob Avakian no interior do MRI. A estes adicionamos notas de rodapé.

[Tradução por Reflexo em Movimento, revisão Servir ao Povo, com base no texto disponível no marxists.org]

[Este artigo foi retirado da primeira versão preliminar de ‘Um Mundo a Ganhar’, publicado antes que este se tornasse a voz oficial do Movimento Revolucionário Internacionalista (MRI). A edição está marcada como No. 1, com data de Maio de 1981. O texto deste artigo foi revisado e corrigido de acordo com a forma com que apareceu originalmente naquele. – Nota da Edição de bannedThought.Net]

Enver Hoxha Refutado

por N. Sanmugathasan, Secretário Geral,
Partido Comunista do Ceilão (Sri-Lanka)

Desde a sua origem, o Marxismo tem sido internacionalista na sua forma e conteúdo. É por isso que Marx e Engels terminaram o seu famoso Manifesto Comunista em 1848 com o emocionante apelo: “Trabalhadores do mundo, uni-vos!”1 Eles também deram forma organizacional a esse conceito, formando a Associação Internacional dos Operários, que passou a ser conhecida como a Primeira Internacional. Foi esta organização a responsável por espalhar as sementes do marxismo entre os trabalhadores avançados da Europa e da América do Norte.

Quando a mão pesada da repressão caiu sobre a Europa, após a derrota da Comuna de Paris em 1871, e impossibilitou o funcionamento da Internacional a partir da Europa, a sua sede foi transferida para a América do Norte, onde morreu de morte natural. Após a morte de Marx, a Segunda Internacional foi formada sob a direção de Engels. Este foi o período do surgimento dos partidos socialistas e trabalhistas de massas na Europa, muitos dos quais existem até hoje.

Engels não viveu para ver a sua degeneração em oportunismo burguês no início da Primeira Guerra Mundial. Lenin travou uma luta titânica contra os líderes revisionistas da Segunda Internacional, Kautsky e Bernstein, que agora reivindicavam o manto de Marx e Engels como líderes do partido social-democrata mais forte, o da Alemanha.

O sucesso da Revolução de Outubro na Rússia em 1917 e o fim da Primeira Guerra Mundial completaram a exposição do oportunismo da direção da Segunda Internacional. Lenin reuniu meticulosamente o que havia de bom na velha Internacional e em 1919, em Moscou, formou a sua Terceira Internacional, que apesar de muitas deficiências e erros, iria desempenhar o papel histórico no estabelecimento de partidos comunistas de massas na maior parte do mundo. Certos compromissos que lhe foram impostos por várias razões, principalmente a necessidade de facilitar a entrada de partidos comunistas locais em coligações antifascistas nacionais que incluiriam até forças não-proletárias levaram à sua dissolução em 1943.2

A precisão e prudência desta decisão continuam a ser fonte de controvérsia. O que talvez seja mais difícil de compreender é o fracasso em restabelecer a unidade do movimento comunista internacional numa forma organizacional no final da Segunda Guerra Mundial. É verdade que o Cominform desempenhou um papel de centro durante um breve período. Mas não era um organismo internacional e o seu papel era limitado.

A morte de Stálin e a usurpação do poder pelos revisionistas kruschevistas no Partido e no Estado soviético desferiram um golpe mortal na unidade monolítica do movimento comunista internacional que havia sido construída sob Stálin. Além disso, a ruptura ideológica entre o Marxismo-Leninismo e o revisionismo moderno destruiu completamente a unidade orgânica e ideológica do movimento comunista internacional. Novos partidos Marxistas-Leninistas que repudiavam o revisionismo kruschevista surgiram por toda parte. Eles buscaram a direção do glorioso Partido Comunista da China, dirigido pelo camarada Mao Tsetung, que permaneceu firme em sua defesa do Marxismo-Leninismo e travou combates polêmicos em sua defesa.

Talvez este tenha sido o momento mais oportuno para reavivar a Internacional Comunista. Mas a oportunidade não foi aproveitada. Os dirigentes do Partido Comunista da China parecem ter considerado que o momento ainda não era propício para tal empreendimento e limitaram-se a intercâmbios bilaterais entre as partes. A sua prática posterior de reconhecer mais de um partido num país como Marxista-Leninista não ajudou a unidade das forças Marxistas-Leninistas a nível nacional. Em vez disso, provou ser divisivo. Por seu lado, o Partido do Trabalho da Albânia reconheceu apenas um partido num país como Marxista-Leninista. Mas não tinha normas claras ou de princípios.

A única oportunidade que os delegados dos partidos e grupos Marxistas-Leninistas tiveram de se encontrarem foi nos congressos nacionais dos partidos da China e da Albânia. No que diz respeito à China, essa oportunidade também cessou com o 9º Congresso, quando o Partido Comunista da China cessou a sua prática de convidar delegados fraternos de outros partidos para o seu congresso. Também interrompeu a prática de enviar seus delegados aos Congressos de outros partidos irmãos. Nenhuma explicação oficial foi dada para essas ações.

Talvez a ausência de um fórum internacional para os Marxistas-Leninistas tenha sido mais sentida quando, imediatamente após a morte de Mao, a direção do Partido Comunista da China escorregou para o lodo do revisionismo moderno e apresentou a teoria totalmente revisionista dos “Três Mundos”. Como uma arma estratégica para o movimento comunista internacional.

Sem dúvida, um grande número de partidos e grupos Marxistas-Leninistas, e acima de tudo, o Partido do Trabalho da Albânia apresentaram-se para denunciar a teoria revisionista dos Três Mundos. Mas, em vez de unir firmemente estas forças e constituir uma frente formidável ao revisionismo Soviético e Chinês, o Partido do Trabalho da Albânia desuniu ainda mais estas forças, arrastando ainda mais na lama a bandeira do Pensamento Mao Tsetung, que tinha sido atirada na lama pelos revisionistas Chineses. O Partido Albanês teve a oportunidade de retirar a bandeira do Pensamento Mao Tsetung da lama em que os revisionistas Chineses a atiraram e de unir todos os genuínos Marxistas-Leninistas e revolucionários em torno dessa bandeira. Em vez disso, eles escolheram fazer o oposto. Usando a influência do seu poder de Estado, subverteram uma série de forças indubitavelmente revolucionárias para a falsa posição de oposição ao Pensamento Mao Tsetung e conduziram-nas para o deserto político onde estão a debater-se.

Porque o Partido Albanês fez isso! Isto provavelmente continuará sendo um enigma. Mas a magnitude da sua traição só pode ser compreendida se nos apercebermos do magnífico potencial que existia em 1977 e que não foi aproveitado devido o rompimento do Partido Albanês.

Mas é nosso dever refutar as falsas teorias do Partido Albanês. Porque, hoje, a defesa do Pensamento Mao Tsetung tornou-se a tarefa central de todos os Marxistas-Leninistas. Pois a defesa do Pensamento Mao Tsetung é nada menos que a defesa do Marxismo-Leninismo porque o Pensamento Mao Tsetung é um desenvolvimento avançado do Marxismo-Leninismo. Quem rejeita o Pensamento Mao Tsetung está rejeitando o Marxismo-Leninismo. É aqui que reside a importância do debate sobre o Pensamento Mao Tsetung.

O que desconcerta qualquer pessoa neste debate com o Partido Albanês é a sua desonestidade. Escrevendo no final do seu prefácio às suas Reflexões sobre a China, em Maio de 1979, Enver Hoxha diz que o 7º Congresso do Partido do Trabalho da Albânia: “fez uma análise minuciosa da posição anti-Marxista e das ações contrarrevolucionárias da direção revisionista Chinesa, sem excluir a responsabilidade de Mao pela situação criada.” Isto simplesmente não é verdade.

O presente escritor esteve no 7º Congresso em 1976 e nunca ouviu uma palavra contra Mao Tsetung. Pelo contrário, no seu relatório ao 7º Congresso, Enver Hoxha referiu-se a Mao não apenas como um grande Marxista-Leninista, mas também como um grande amigo do povo Albanês. Está lá no relatório. Mentiras não podem ser toleradas em nenhuma polêmica.

Enver Hoxha está tentando traçar as origens do revisionismo atual da direção chinesa até Mao. Ele parece ignorar o fato de Teng Siao-ping ter anulado todas as decisões corretas da Grande Revolução Cultural Proletária e esta tentando apagar todo o período de direção de Mao no Partido Chinês como um pesadelo. Mesmo a reabilitação de Liu Shao-chi, cuja denúncia de Mao como um seguidor da via capitalista tem a aprovação de Enver Hoxha (no seu livro Reflexões sobre a China), não despertou Enver Hoxha para enfrentar a realidade. Talvez, apenas a esperada denúncia aberta de Mao pelo próximo Congresso do Partido Chinês possa expor completamente a falência política de Enver Hoxha. Certamente, deve ficar claro, mesmo para o intelecto mais fraco, que se o revisionismo de Teng Siao-ping brota de Mao, Teng não poderia opor-se tão venenosamente a Mao e a tudo o que ele defendia.

Enver Hoxha acusa Mao de ser um idealista e metafísico. Mas, na verdade, é Enver o culpado dessa acusação. Ilustremos isto pela forma como ele aborda a Grande Revolução Cultural Proletária que é, talvez, um dos maiores eventos revolucionários que já aconteceu. Ao chamar este grande evento de não ser nem grande, nem proletário, nem cultural, nem uma revolução, Enver Hoxha demonstra não apenas total ignorância do que é a revolução, mas também demonstra a sua atitude mecânica e metafísica.

Do ponto de vista a partir do qual aborda este grande acontecimento, ele vê o grande Partido Comunista da China com a sua constituição e um Comitê Central eleito que deveria decidir tudo e dar direção. Não pode haver lugar para turbulência ou para o que ele chama de “caos”. Foi precisamente assim que Liu Shao-chi também abordou a questão. Ele achava que estava bem porque sabia que comandava uma maioria dentro do Comitê Central. Ele também imaginou que, como um bom comunista, Mao teria primeiro de levantar as suas diferenças dentro do seu Comitê Central, onde Liu Shao-chi estava confiante na vitória. Ele nem imaginava que Mao passaria por cima do Comitê Central e apelaria às massas lá fora com sua famosa consigna: “Bombardear o Quartel-General”.3 Quem já ouviu falar de um comunista apelando às massas para derrubarem a direção do Partido ou da parte dele que se tornou revisionista.

Mas foi precisamente isso que Mao fez. Ele não foi inibido por regras mecânicas ou pelo pensamento metafísico. Ele pensou dialeticamente e agiu para preservar a ditadura do proletariado daqueles leitores capitalistas que haviam tomado o poder na superestrutura. Seguir as regras teria sido cortejar o desastre certo. Além disso, Mao tinha imensa confiança nas massas. Ele sabia que eles poderiam cometer erros. Mas ele também sabia que, fundamentalmente, agiriam corretamente, sob uma direção adequada e revolucionária. É por isso que ele não tinha medo de “criar” problemas.

Mas Enver Hoxha não consegue compreender isto. Portanto, ele descreve esta grande revolução na qual participaram literalmente milhões de pessoas, como um golpe palaciano à escala de toda a China. Esta é realmente uma descrição ingênua.

Se Mao teve de sair da direção do Partido e apelar ao povo e assim dar uma direção pessoal à Revolução Cultural, foi porque a direção do Partido estava repleta de revisionistas e seguidores do caminho capitalista. Mao não tinha outras alternativas se quisesse salvaguardar o Partido e evitar que a China mudasse de cor.

A Grande Revolução Cultural Proletária é um exemplo de como levar a cabo a luta de classes sob as condições da ditadura do proletariado na China, para evitar que a China mude de cor e enverede pelo caminho da restauração capitalista, e para preservar a China como base para a revolução mundial.

Ela foi chamada de Revolução Cultural porque foi na frente cultural que tanto os revisionistas quanto os revolucionários deram seus primeiros disparos. Assim como o papel do Clube Petofi na contrarrevolução húngara em 1956, as atividades culturais desempenharam um papel importante na tentativa dos revisionistas na China de atrasar o ritmo. Além disso, toda a revolução tratou da questão de capturar e influenciar as mentes dos homens, para criar um novo tipo de homem socialista, desprovido de egoísmo e de desejo de poder e grandeza pessoal.

A Revolução Cultural não foi uma farsa, como afirma Enver Hoxha. Nem liquidou o Partido Comunista da China. Apenas demoliu a sua sede burguesa, aquela parte da sua direção que se tinha tornado revisionista. Em seu lugar, introduziu sangue novo. Claro, houve um caos. Cada revolução produz uma certa quantidade de caos. Isso é inevitável. É por isso que Mao disse que a revolução não era um jantar. Foi uma tentativa de uma classe de derrubar outra. A destruição sempre precede a construção.

É verdade que Mao e os revolucionários não atingiram todos os objetivos que se propuseram a alcançar por meio da Revolução Cultural. Isso se deveu ao fato de que, na metade da revolução, agindo sob o pretexto de que a revolução tinha ido longe demais para a esquerda, alguns dirigentes como Chou En-lai conseguiram reabilitar as pessoas destronadas pela Revolução Cultural. O fato de isso não ter sido evitado representou a fraqueza das classes sociais representadas por Mao e pelos revolucionários.4

Enver Hoxha se opõe ao papel da juventude na Revolução Cultural. Por quê os jovens? Por quê não o proletariado? pergunta ele, esquecendo-se de que o próprio Partido Albanês convocou os jovens para construir suas ferrovias e terraplenar suas montanhas. A juventude não é uma classe em si. Eles vêm de diferentes classes. Mas eles têm a característica comum de serem idealistas, abnegados e dispostos a mudar a sociedade. Portanto, eles podem desempenhar um papel de vanguarda, o que significa assumir a direção e marchar na vanguarda das fileiras.

Mas isto não significa que a juventude da classe trabalhadora não estivesse na vanguarda da Revolução Cultural. Os jovens da classe trabalhadora e do campesinato formavam a maior parte dos Guardas Vermelhos, embora houvesse pequenos setores de trabalhadores que se opunham à Revolução. Não esqueçamos que a força motriz da Tempestade de Janeiro em Xangai um dos eventos marcantes que definiram o ritmo da Revolução Cultural foram as organizações de operários revolucionários em Xangai, lideradas por Chang Chun-chiao e os seus camaradas.

Uma das acusações políticas mais sérias feitas por Enver Hoxha contra Mao é que este último repudiou a concepção marxista do papel de direção do proletariado na revolução e, em vez disso, atribuiu esse papel ao campesinato. Esta é uma acusação incorreta e infundada que pode ser facilmente respondida. Ao longo dos seus escritos teóricos, Mao sempre enfatizou o papel de direção do proletariado e referiu-se ao campesinato como a força principal. Ele nunca se desviou desta posição.

Em seu primeiro ensaio no Volume I de suas obras escolhidas, respondendo as perguntas: Quem são nossos inimigos? Quem são os nossos amigos? afirmou ele na sua Análise das Classes na Sociedade Chinesa “A força dirigente da nossa revolução é o proletariado industrial.”
No seu ensaio sobre o Movimento de 4 de Maio, ele afirmou: “Sem essas forças revolucionárias basilares e sem a classe operária a dirigir a revolução, será impossível levar a bom termo a revolução democrática anti-imperialista e anti-feudal.” Ele analisou detalhadamente esta questão no seu ensaio A Revolução Chinesa e o Partido Comunista da China.
Nele afirma: “O proletariado chinês é a força motriz básica da Revolução Chinesa. A menos que seja liderada pelo proletariado, a Revolução Chinesa não poderá ter sucesso.”[1] Ele voltou a esta posição várias vezes em seus escritos. Também, na prática deu destaque à organização dos operários, por exemplo, os das minas de carvão de Anyuan.

Mas Enver Hoxha recorre a um truque desonesto. Ele cita duas frases do famoso livro de Mao: Relatório Sobre uma Investigação Feita no Hunan a Respeito do Movimento Camponês numa tentativa de provar que Mao tinha dito que todos os outros partidos e forças políticas devem submeter-se ao campesinato e às suas opiniões. Foi isto que Mao disse naquele célebre relatório: “Milhões de camponeses hão-de levantar-se como um poderoso furacão, uma tempestade, uma força tão vertiginosa e violenta que nenhum poder, por maior que seja, poderá deter” e “Todos os partidos revolucionários e todos os camaradas revolucionários serão postos à prova pelos camponeses, sendo aceites ou rejeitados segundo a escolha que tiverem feito”

Mao escreveu este ensaio não para exortar o papel hegemônico do campesinato na Revolução Chinesa, mas para exortar a então direção do Partido Comunista da China a dar direção ao já emergente movimento camponês no campo. Deve-se salientar que a então direção do Partido Comunista da China estava apenas interessada na aliança com a burguesia nacional e negligenciou a tarefa de forjar a aliança operário-camponesa. Mao queria, corretamente, que esta política fosse alterada. Ele queria uma apreciação adequada do papel do campesinato, que constituía entre 80 a 90% da população, como a principal força da revolução chinesa. Ele declarou que: “sem os camponeses pobres não haveria revolução”. Ele nunca defendeu o papel hegemónico do campesinato na revolução.

Enver Hoxha cita ainda a tese sobre as “aldeias revolucionárias” e que o “campo deve cercar a cidade” como prova de que Mao havia elevado o campesinato à posição de direção. Mas o que Mao quis dizer com isso? Pelo que pudemos entender, Mao apontou que, nos países semicoloniais da atualidade, as forças do inimigo eram superiores em relação às forças inicialmente inferiores do povo e que as forças inimigas estavam concentradas nas cidades por exemplo: A sede do governo, o exército, a polícia, o rádio, a ferrovia, o departamento postal, etc. estavam todos nas cidades.

Numa tal situação, as forças inimigas eram, no início, superiores às forças populares inicialmente mais fracas. Num tal contexto, Mao sugeriu que seria uma loucura bater a cabeça contra o muro de pedra do poder superior dos inimigos. Em vez disso, sugeriu que o povo se afastasse, tanto quanto possível, dos centros de poder dos inimigos. Em países como a China, onde a maioria da população vivia fora das cidades, isto significaria ir para o meio do povo, organizá-lo e construir bases revolucionárias dentro das quais um exército popular pudesse ser construído e treinado. Isto transformaria uma desvantagem em vantagem e obrigaria o inimigo a enviar as suas forças em busca das forças populares. Nesse caso, o inimigo deveria ser atraído para o meio do povo e destruído através do uso da tática de colocar dez contra um. O exército popular aprenderá e crescerá no combate real com o inimigo até que uma mudança qualitativa seja alcançada quando as forças populares se tornarem superiores às forças do inimigo. Esta é a teoria conhecida como guerra popular prolongada. Quando as forças populares se tornassem superiores às do inimigo, seria então possível cercar as cidades e finalmente libertá-las.

Esta foi a brilhante estratégia e táctica militar elaborada por Mao durante a orientação da revolução chinesa. De forma alguma nega o papel de direção do proletariado ou atribui tal papel ao campesinato. O papel de direção do proletariado é realizado através da ideologia proletária do Marxismo-Leninismo e expresso através do Partido Comunista. Isso não significa que o proletariado deva ser numericamente a força superior ou que todas as ações devam originar-se ou ocorrer nas cidades. Isto acontece porque, num país grande e subdesenvolvido como a China, o proletariado é numericamente fraco, enquanto o vasto campo dá amplo espaço para as forças populares manobrarem. Estas tácticas também não significam não trabalhar ou trabalhar menos nas cidades. Nas condições de ilegalidade que prevaleciam na China pré-revolucionária, Mao disse que nas áreas do Kuomintang ocupadas pelo inimigo a sua política deveria ser a de ter quadros bem selecionados a trabalhar na clandestinidade durante um longo período, para acumular forças e aguardar a nossa hora.

Além disso, quando consideramos a prática da Revolução Chinesa, descobrimos que a maior parte das forças que formaram o primeiro Exército Vermelho Operário e Camponês, que Mao conduziu às montanhas Tchincam em 1927, eram compostas por mineiros de carvão de Anyuan, entre os quais Mao havia trabalhado antes. No entanto, Mao não ofereceu esta táctica como uma solução universal para todos os países. Em 25 de Setembro de 1956, numa conversa com representantes de alguns partidos comunistas latino-americanos, ele disse que a experiência chinesa a este respeito pode não ser aplicável a muitos dos seus países, embora possa servir de referência. Ele pediu para aconselhá-los a não transplantar mecanicamente a experiência chinesa.

O camarada Mao Tsetung também está a sendo criticado por Enver Hoxha pelas alegadas concepções não-Marxistas sobre as duas fases da revolução democrática e da revolução Socialista. Ninguém é tão cego quanto aqueles que têm olhos e ainda assim não veem. O camarada Mao Tsetung explicou o seu ponto de vista em vários dos seus escritos. O mais importante deles é o seu artigo Sobre a Nova Democracia: “Mas não é ainda altura para instaurar-se o socialismo. A tarefa atual da revolução na China é combater o imperialismo e o feudalismo, o socialismo está pois fora de questão até que essa tarefa se conclua. A revolução chinesa não pode deixar de desdobrar-se nesses dois passos, que são, primeiro, a democracia nova e, depois, o socialismo. Além disso, o primeiro passo exigirá muito tempo, de modo nenhum poderá realizar-se do dia para a noite. Não somos utópicos, não podemos apartar-nos das condições concretas que enfrentamos.”

Assim, é bastante claro que Mao não tinha ideias erradas sobre a existência de uma muralha da China entre as revoluções democrática e socialista. Ele sublinhou isto quando disse:

“É correto e se encaixa na teoria marxista de desenvolvimento dizer que, dos dois estágios revolucionários, o primeiro fornece as condições para o segundo e que os dois devem ser consecutivos sem um estágio intermediário de ditadura burguesa. No entanto, é uma visão utópica, inaceitável para os verdadeiros revolucionários, que a revolução democrática não tem sua tarefa específica a ser cumprida durante um período definido de tempo, e que essa tarefa pode ser fundida e realizada simultaneamente com o que é necessariamente o futuro objetivo, ou seja, a meta socialista, cumprindo assim ambas de uma só vez.”

Assim, o camarada Mao Tsetung afirmou claramente que a revolução democrática é a preparação necessária para a revolução socialista, e a revolução socialista é a sequência inevitável da revolução democrática. Isso significa, naturalmente, que durante os dois diferentes estágios da revolução, a classe trabalhadora terá diferentes aliados. Especificamente, o camarada Mao Tsetung disse que, durante o estágio democrático da revolução, seria possível unir-se e lutar com a burguesia nacional, que tem uma natureza dupla. Por um lado, ela tem contradições com o imperialismo estrangeiro e o capitalismo burocrático interno. Por outro lado, ela tem contradições com a classe trabalhadora e o campesinato. Consequentemente, ela tem uma natureza dupla na revolução democrática do povo chinês.

Mao destacou:

“A partir dessa natureza dual da burguesia nacional, podemos concluir que, em um determinado período e sob certas circunstâncias, ela pode participar da revolução contra o imperialismo, o capitalismo burocrático e o senhores de guerra, e pode se tornar parte das forças revolucionárias. Mas outras vezes, pode servir a grande burguesia, ajudando as forças contrarrevolucionárias.”

Esta visão sobre a aliança temporária entre a classe trabalhadora e a burguesia nacional já havia sido afirmada tanto por Lenin quanto por Stalin. No Esboço Inicial das Teses Sobre as Questões Nacional e Colonial, Lenin disse:

“A Internacional Comunista deve concluir uma aliança temporária com a democracia burguesa das colônias e dos países atrasados, mas não fundir-se com ela, mantendo incondicionalmente a independência do movimento proletário, mesmo sob as suas formas mais rudimentares.”

Em A Revolução na China e as Tarefas da Internacional Comunista Stalin concluiu que uma aliança com a burguesia nacional era permitida.

Mao estava consciente da necessidade de vigilância e da necessidade de se unir e lutar contra a burguesia nacional. Ele disse: “O povo tem um forte aparelho de Estado nas suas mãos e não teme a rebelião por parte da burguesia nacional”. Isto é algo semelhante aos sentimentos expressos por Lenin quando introduziu a Nova Política Econômica. Ele disse:

“Não há nada de perigoso para o Estado proletário nisto, enquanto o proletariado mantiver firmemente o poder político nas suas mãos, enquanto mantiver os transportes e a grande indústria firmemente nas suas mãos”.

Enver Hoxha nega que essa situação tenha existido na China após a revolução democrática, mas, além de fazer uma declaração categórica, ele não apresenta nenhum fato que justifique essa afirmação. Mas é de conhecimento geral que, mesmo nos primeiros anos da China Popular, grandes bancos e grandes empresas industriais e comerciais eram de propriedade do Estado e que empresas como bancos, ferrovias e companhias aéreas eram operadas pelo Estado. Além disso, o braço mais importante da máquina estatal, o Exército de Libertação Popular, estava exclusivamente sob a direção do Partido Comunista.

Mao também não ignorava a necessidade da luta de classes mesmo após a revolução. Em 1957, ele disse:

“Na China, embora no essencial se tenha concluído a transformação socialista, no que diz respeito ao sistema de propriedade, e tenham cessado as vastas e tempestuosas lutas de classes travadas pelas massas e próprias dos períodos revolucionários anteriores, subsistem ainda vestígios das classes derrubadas, dos senhores de terras e compradores; subsiste ainda uma burguesia, e a transformação da pequena burguesia ainda está no começo. De modo nenhum terminou a luta de classes.”

No início de 1952, ele tinha dito:

“Com a derrubada da classe dos proprietários de terras e da classe burocrata-capitalista, a contradição entre a classe trabalhadora e a burguesia nacional tornou-se a principal contradição na China; portanto, a burguesia nacional não deve mais ser descrita como uma classe intermediária.”

O período democrático da revolução na China durou cerca de sete anos. Em 1956, as empresas industriais e comerciais de propriedade privada haviam sido convertidas em empresas estatais e privadas conjuntas, e a transformação cooperativa da agricultura e do artesanato havia ocorrido. Setores da burguesia haviam se tornado funcionários administrativos em empresas estatais-privadas conjuntas e estavam sendo transformados de exploradores em operários que viviam de seu próprio trabalho. Mas eles ainda recebiam uma taxa fixa de juros sobre seu capital nas empresas conjuntas. Ou seja, eles ainda não haviam se libertado das raízes da exploração.

Claramente, a contradição de classe não havia sido completamente resolvida e não seria resolvida por mais alguns anos. Foi somente durante a Revolução Cultural que os Guardas Vermelhos forçaram o cancelamento do pagamento de juros à burguesia nacional. Esse foi o método específico da China para limitar, restringir e transformar a burguesia nacional.

Cada partido em diferentes países terá de aplicar métodos diferentes para superar as contradições que sempre surgem à medida que a sociedade avança cada vez mais no caminho socialista. Os métodos utilizados por cada partido diferem de país para país. O grau de resistência que os bolcheviques encontraram na Rússia por parte dos proprietários de terras e das classes capitalistas derrubadas foi muito grande. Eles tiveram de tomar medidas severas para eliminar essa resistência. Isso era totalmente justificável. Na China, também, os contrarrevolucionários foram eliminados. Mas, na China, Mao defendeu o uso de dois métodos diferentes sob a ditadura democrática do povo, um ditatorial e outro democrático, para resolver os dois tipos de contradições que diferem em natureza, aquelas entre nós e o inimigo e aquelas entre o povo. Em seu artigo Sobre a Ditadura da Democracia Popular, escrito em 1949 e também publicado no Cominform Journal, Mao explicou que “A combinação desses dois aspectos, democracia para o povo e ditadura sobre os reacionários, é a ditadura democrática do povo”.

Esse método de usar a persuasão e não a compulsão para resolver as contradições entre o povo pode parecer não marxista para algumas pessoas. No entanto, é um princípio fundamental do marxismo que, ao trabalhar com as massas, os comunistas devem usar o método democrático de persuasão e educação e nunca recorrer ao comando ou à força. Esse método foi particularmente bem-sucedido em sua aplicação na China, conforme demonstrado pelo fato de que, durante a Guerra da Coreia, quando os americanos correram para as margens do rio Yalu, não havia um único traidor chinês a ser encontrado. Isso contrasta com a situação na Hungria na época da contra-revolução em 1956.

Enver Hoxha também encontra falhas na teoria da contradição, conforme delineada por Mao, segundo a qual ele afirma que a lei da contradição, ou seja, a lei da unidade de contrários, é a lei fundamental da dialética materialista e que todas as outras leis derivam dela. Seria necessário mais espaço e tempo do que temos à nossa disposição para responder a todas essas críticas.

Vamos nos limitar a reafirmar o que consideramos ser os princípios básicos da lei da contradição nas coisas, conforme enunciado por Mao. A contradição é universal; as contradições se expressam em uma forma particular; entre todas as contradições, há sempre uma contradição principal e também um aspecto principal da contradição que desempenha o papel principal na resolução da contradição; todos os aspectos da contradição têm identidade e oposição e, sob certas circunstâncias, podem trocar de lugar (a identidade é temporária e relativa, enquanto a oposição é absoluta); finalmente, entre as contradições, há contradições antagônicas e não antagônicas e elas devem ser tratadas adequadamente sem permitir que as contradições não antagônicas se transformem em contradições antagônicas.

É a mesma incapacidade fundamental de entender a teoria da contradição nas coisas que faz Enver Hoxha criticar as opiniões de Mao sobre a teoria das duas linhas. De acordo com Enver Hoxha, um partido pode ter apenas uma linha e, portanto, não é marxista conceber a existência de duas linhas dentro do partido. Mas o que Mao estava se referindo era à universalidade da contradição, ou seja, que as contradições existem em tudo, até mesmo no pensamento, nos partidos e até mesmo dentro de um indivíduo. É verdade que, em um determinado momento, um partido ou um indivíduo pode e deve falar com apenas uma voz. Mas a formulação dessa única voz é sempre o resultado do conflito amargo entre dois pontos de vista contraditórios. É esse conflito de contradições, mesmo no pensamento, que faz as coisas avançarem. Nesse sentido, sempre houve duas linhas dentro de um partido ou mesmo de um indivíduo. É com base na contradição entre essas duas linhas, entre o que é certo e o que é errado, que ocorre o desenvolvimento e o progresso. Negar isso é negar a dialética marxista.

Da mesma forma, há uma falha na compreensão do princípio dialético da unidade de contrários entre os aspectos contrários de uma contradição e que, sob certas condições, os opostos podem mudar de lugar. No capitalismo, a classe trabalhadora e a burguesia são dois aspectos contraditórios da mesma contradição. Eles se opõem um ao outro e essa oposição é absoluta. Mas há também um aspecto de unidade entre os dois, ou seja, um não pode existir sem o outro. E, sob certas circunstâncias, ou seja, como resultado de uma revolução, a classe trabalhadora e a burguesia podem trocar de lugar. Ou seja, a classe trabalhadora, de uma classe que é governada, pode se tornar a classe dominante, enquanto a burguesia, de uma classe dominante, se tornaria a classe que é governada.

Enver Hoxha também critica o método usado por Mao para lidar com os contrarrevolucionários e as forças contraditórias entre o povo. Embora tenha admitido que o proletariado não tinha outra escolha a não ser acabar com a burguesia na Rússia, que era uma classe contrarrevolucionária, Mao apontou que havia uma situação ligeiramente diferente na China. Em 1956, a maior parte dos contrarrevolucionários havia sido eliminada. Portanto, embora ainda defendesse um tratamento severo contra os contrarrevolucionários e outros inimigos do povo, ele defendia um método diferente de persuasão democrática e remodelagem por meio do trabalho para outros inimigos. Ele disse que não deveriam ser fuziladas muitas pessoas e que deveria haver um limite até mesmo para o número de pessoas presas, e que sempre que fossem descobertos erros, eles deveriam ser corrigidos. Essa política foi defendida devido ao grande número de pequenos burgueses na China e à necessidade de conquistar todas as seções da classe não trabalhadora do povo (além dos proprietários de terras feudais e da grande burguesia) para o lado da classe trabalhadora.

Da mesma forma, a teoria “Que cem flores desabrochem, que cem escolas rivalizem” foi apresentada para incentivar a luta entre escolas de pensamento conflitantes entre o povo, mas sob a supervisão do Partido Comunista. Mao sustentava que seria errado suprimir ideias errôneas entre as pessoas por meio de ações administrativas. Em vez disso, ele defendia que essas ideias errôneas deveriam ter permissão para se manifestar e enfrentar a oposição e a luta. Ele não tinha dúvidas de que as ideias corretas triunfariam porque o socialismo estava em uma posição vantajosa na luta ideológica. O poder básico do Estado estava nas mãos do povo trabalhador dirigido pelo proletariado. O Partido Comunista era forte e seu prestígio era alto. Portanto, o único método de luta ideológica deveria ser o raciocínio meticuloso e não a coerção grosseira.

Essa campanha “Que cem flores desabrocharem” foi uma luta ideológica contra “ervas daninhas venenosas” e pela supremacia do marxismo no campo cultural. Os direitistas aproveitaram a oportunidade para pedir uma democracia ao estilo ocidental. Houve até incidentes desagradáveis, como pessoas sendo espancadas. Como disse Mao, “Somente quando se permite que ervas daninhas venenosas brotem do solo é que elas podem ser arrancadas”. Um contra-ataque feroz foi lançado contra os direitistas burgueses que haviam saído e se exposto, e eles foram rechaçados. Alguns deles foram punidos e apelidados de direitistas, um dos cinco grupos que eram considerados sombrios na sociedade chinesa. Essa decisão foi revertida somente depois que Teng voltou ao poder. O mesmo ocorre com relação à política de Mao de permitir que todas as classes que haviam participado da revolução democrática compartilhassem o governo após a revolução. Essa foi uma característica peculiar obtida na China como resultado da aliança de uma seção da burguesia urbana e da burguesia nacional com os trabalhadores na revolução contra o imperialismo, o feudalismo e o capitalismo burocrático. Esse foi um fato histórico. Mas essa política foi executada com base na direção do Partido Comunista e na aceitação da transição para o socialismo pelos outros partidos. Mas essa coexistência de longo prazo e a supervisão mútua do Partido Comunista e dos partidos democráticos não agradam a Enver Hoxha.

Ele esquece que mesmo depois da Revolução de Outubro na Rússia, havia dois partidos no governo os Bolcheviques e os Socialistas-Revolucionários de Esquerda. A aliança com estes últimos só foi rompida depois que eles se revoltaram contra os bolcheviques. Mesmo na Albânia existe ainda hoje a Frente Democrática.

Nesse contexto, é útil observar que essa ideia de remodelar e reeducar outras classes remonta a Lenin. Ele disse em Esquerdismo Doença Infantil do Comunismo:

“As classes continuam a existir e existirão durante anos em toda a parte depois da conquista do poder pelo proletariado. É possível que na Inglaterra, onde não há camponeses (mas existem, contudo, pequenos patrões!), esse prazo seja mais curto. Suprimir as classes significa não só expulsar os latifundiários e os capitalistas isto fizemo-lo nós com relativa facilidade, mas significa também suprimir os pequenos produtores de mercadorias, mas a estes não os podemos expulsar, não os podemos esmagar, é preciso conviver com eles, e só se pode (e se deve) transformá-los, reeducá-los, mediante um trabalho de organização muito longo, lento e prudente.”

Portanto, a política de Mao não é, de forma alguma, uma expressão de seu liberalismo.

Enver Hoxha refere-se às críticas de Stalin e do Comintern à direção do Partido Comunista da China e a Mao Tsetung. Essas críticas aparentemente se referem à falha de Mao em implementar os princípios do Marxismo-Leninismo de forma consistente sobre o papel de direção do proletariado na revolução, o internacionalismo proletário, a estratégia e as táticas da luta revolucionária, etc. Já tratamos de alguns desses pontos.

É verdade que havia diferenças entre o Comintern e o Partido Comunista da China. Mas é preciso admitir que, em quase todas as questões, Mao estava certo e Stalin, para seu crédito, foi um dos primeiros a admitir isso. Obviamente, não havia diferença entre os dois lados sobre o caráter da revolução, que ambos consideravam democrático-burguesa, e sobre o papel fundamental do campesinato e da revolução agrária, além do fato de que a revolução armada era a única solução para a revolução na China. Por sua vez, Mao considerava a URSS como a pátria do proletariado internacional e compreendia corretamente a importância histórica da Revolução de Outubro e seu impacto global. Mas havia diferenças na questão da estratégia e das táticas da Revolução Chinesa.

Entre 1927 e 1935, por meio das respectivas linhas de Li Li-san e Wang Ming, a influência do Comintern foi percebida em questões como a captura simultânea do poder nas cidades, a necessidade de recorrer à guerra de posição em vez da guerra de guerrilha e a recusa em construir bases revolucionárias rurais. De fato, a Longa Marcha teve de ser lançada como um método para escapar da quinta campanha de cerco de Chiang Kai-shek. Hoje, os camaradas albaneses (em discussão com a delegação do nosso partido que visitou a Albânia em abril de 1979) começaram a menosprezar a Longa Marcha e afirmam que teria sido melhor se o Exército Vermelho tivesse lutado onde estava e poupado perdas tremendas. Não é preciso acrescentar que, se essa política tivesse sido adotada, não teria havido revolução, nem partido, nem Mao. Os albaneses também menosprezam a Conferência de Tsunyi, que elegeu Mao ao poder em 1935, por não ser representativa. É de se perguntar se eles esperavam que um Congresso legal e representativo de pleno direito fosse realizado em meio a uma das guerras civis mais disputadas do mundo.

Também no final da Segunda Guerra Mundial, Stalin teve as suas diferenças com os comunistas chineses. Ele duvidou da sua capacidade de vencer uma guerra civil total contra Chiang Kai-shek (que estava a sendo apoiado pelo imperialismo dos EUA) e manteve relações com Chiang Kai-shek mesmo durante a guerra civil. Mas Stalin teve a gentileza de dizer que ficou satisfeito por ter sido provado que estava errado.

Apesar desses erros, não há dúvida de que Mao considerava Stalin um grande Marxista-Leninista e que, fundamentalmente, ele estava correto. Além disso, Mao não culpou o Comintern e seus representantes na China pelos erros do Partido Comunista da China. Ele culpou os comunistas chineses que tentaram seguir cegamente o padrão soviético sem prestar atenção às características particulares da situação nacional da China.

E, o mais cruel de todos os comentários, Enver Hoxha sugere que a posição dos comunistas chineses contra o revisionismo soviético não foi ditada por posições Marxistas-Leninistas corretas e baseadas em princípios. Isso não é apenas indelicado, mas também completamente falso. Mao não apenas compreendeu corretamente o revisionismo de Kruschev já em 1956, mas foi sob sua direção que o Partido Chinês iniciou as grandes polêmicas com a publicação de Viva o Leninismo em 1960. Essas polêmicas, que consistiam em várias cartas ao Partido Comunista da União Soviética e a alguns outros partidos revisionistas da Europa Ocidental, eram brilhantes pela clareza de pensamento e pela profundidade dos argumentos. Eles ensinaram princípios e estilos de trabalho revolucionários a toda uma geração de Marxistas-Leninistas em todo o mundo. Negar isso hoje é ir contra os fatos.

Os albaneses querem agora que acreditemos que Mao sempre foi pró-americano, ou que mudou continuamente de posição. Disseram à nossa delegação que, durante a Segunda Guerra Mundial, houve na América um lobby de Chiang Kai-shek e um lobby de Mao. É verdade que houve diferenças de opinião entre a classe dominante americana sobre quem deveria ser apoiado na luta comum contra o fascismo japonês. Chiang? ou Mao? Havia americanos honestos que queriam que fosse dado apoio aos comunistas chineses porque eles eram as únicas forças que lutavam genuinamente contra os japoneses, e não contra o Kuomintang sob o comando de Chiang. Isto não significa que Mao fosse pró-americano.

Sua atitude em relação ao imperialismo dos EUA tem sido inequívoca e consistente. Durante a Segunda Guerra Mundial, quando o fascismo japonês se tornou o principal inimigo da China, ele usou as contradições entre o fascismo japonês e o imperialismo dos EUA e defendeu uma aliança com esse último. Porém, assim que a guerra contra o fascismo terminou e o imperialismo dos EUA substituiu o fascismo japonês como principal inimigo da China, apoiando Chiang Kai-shek em sua guerra civil contra os comunistas, ele caracterizou o imperialismo dos EUA como o principal inimigo que precisava ser derrotado antes que a China pudesse ser libertada. E ele o derrotou!

Nos anos seguintes, ninguém poderia duvidar da boa-fé imperialista antiamericana de Mao quando ele enviou os voluntários chineses para a Coreia para impedir a invasão daquele país liderada pelos EUA e quando deu apoio irrestrito aos povos da Indochina que lutavam contra o imperialismo norte-americano e, na verdade, a todos os povos que lutavam por sua independência. Sua famosa declaração de 1970, pedindo a unidade de todas as forças que se opunham ao imperialismo dos EUA e seus cães de guarda, ainda soa em nossos ouvidos.

Mas, por esta altura, um novo elemento tinha entrado na situação internacional. Com a sua ocupação brutal da Checoslováquia em 1968, o revisionismo Soviético sinalizou o seu desenvolvimento como uma potência social-imperialista. Nasceu um novo imperialismo e Mao tomou nota da mudança na relação de forças. Posteriormente, ele colocaria o social-imperialismo Soviético junto ao imperialismo dos EUA como os inimigos gêmeos da humanidade. Esta foi a posição que manteve até ao fim quando, pela última vez, presidiu o Décimo Congresso Nacional do Partido Comunista da China, realizado de 24 a 28 de agosto de 1973.

O Relatório adotado nesse Congresso contém esta excelente formulação:

“Portanto, na frente internacional, nosso Partido deve defender o internacionalismo proletário, defender as políticas consistentes do Partido, fortalecer nossa unidade com o proletariado e os povos oprimidos e nações de todo o mundo e com todos os países sujeitos à agressão, subversão, interferência, controle ou intimidação imperialista, e formar a mais ampla frente unida contra o imperialismo, o colonialismo e o neo-colonialismo e, em particular, contra o hegemonismo das duas superpotências, os EUA e a URSS. Devemos nos unir a todos os partidos e às organizações Marxistas-Leninistas autênticas em todo o mundo e levar a luta contra o revisionismo moderno até o fim.”

É útil notar que não há sequer um indício da teoria dos Três Mundos neste relatório. É também absolutamente calunioso que os Albaneses afirmem agora que Mao, em qualquer fase, caracterizou o imperialismo Soviético como o principal inimigo e, portanto, apelou a um entendimento ou a uma aliança com o imperialismo dos EUA. Esta é uma monstruosidade nascida da mente de Teng e não tem nada a ver com Mao.

Assim, repudiamos veementemente a tese de que a Teoria Anti-Marxista-Leninista dos Três Mundos foi um produto do Pensamento de Mao Tsetung. Não há qualquer evidência que apoie tal possibilidade. O camarada Mao Tsetung é um líder que expressou o seu ponto de vista sobre quase todos os assuntos concebíveis que estavam sob a sua alçada. O fato de os apologistas da Teoria dos Três Mundos não conseguirem desenterrar uma única citação de Mao em apoio desta teoria absurda é prova suficiente de que ele nunca defendeu a unidade do segundo e terceiro mundo contra o primeiro mundo; ou, pior ainda, defender a unidade do segundo e terceiro mundos juntamente com uma parte do primeiro mundo contra a outra metade.

A técnica favorita usada por Enver Hoxha, ao longo do seu livro, é atribuir a Mao pontos de vista que não são os seus e depois proceder à sua demolição. Este é um método de debate muito desonesto.

É lamentável que tenhamos que gastar tanto tempo e espaço refutando Enver Hoxha. Mas isso, por si só, é uma aula sobre o Marxismo-Leninismo. Da mesma forma que o debate internacional entre o Marxismo-Leninismo e o revisionismo moderno se tornou uma escola para todos os Marxistas-Leninistas, hoje a defesa dos princípios do pensamento de Mao Tsetung constitui um aprendizado do Marxismo-Leninismo.

O movimento comunista internacional deve e irá unir-se novamente e avançar rumo à vitória. Mas essa unidade deve ser uma unidade de princípios uma unidade entre revolucionários que se baseiam no Marxismo-Leninismo-Pensamento Mao Tsetung.

Nota da tradução:

[1] A versão em português retirou este trecho importante, porém ainda é disponível na versão em inglês: https://www.marxists.org/reference/archive/mao/selected-works/volume-2/mswv2_23.htm

1A consigna desfraldada por Marx era “Workers of all countries, unite”, ou seja, “Proletários de todos os países, uni-vos!”. “Trabalhadores do mundo” é a forma revisionista que tomou. – Nota Editorial Servir ao Povo.

2Aqui está uma das principais limitações deste documento, pois trata-se de uma posição que havia no interior do MRI, sob influência do revisionista e renegado Bob Avakian. Este difundia que a linha do VII Congresso da IC, sob direção do Camarada Giorgi Dimitrov era direitista por propor a Frente Antifascista. Nisso converge com toda canalha trotskista e de “comunistas de esquerdas” que reputam a Dimitrov e a Stalin um linha direitista na IC no período. Bem como atribuem a essa suposta linha incorreta a dissolução da IC, o que é falso. O correto balanço sobre esse período foi feito por um dos partidos do MCI, o Partido Comunista do Brasil – Fração Vermelha, documento que recomendamos fortemente a leitura. Disponível em nosso blog desde sua publicação. – Nota Equipe Editorial Servir ao Povo.

3Há uma incompreensão da luta de duas linhas que levou ao desmascaramento de Liu Shao-chi. A luta era levada já no Comitê Central pelo Presidente Mao, desde os idos de 1960. Em 62, começa o movimento de educação socialista, fruto da tenaz luta do Presidente Mao no CC. A consigna de “Bombardear o QG da burguesia” é levantada só a partir de 1966, quando a GRCP começa oficialmente. Justamente porque ali o Presidente Mao identifica o QG. O Presidente Mao foi quem manejou a contradição com maestria por anos, através de críticas literárias e a uma peça de teatro, também contra a direção burguesa de uma escola em Pequim. O prefeito de Pequim é quem mostra a cabeça para atacar o movimento de crítica e Liu Shao-chi sai em seu socorro, quando se revela como a verdadeira cabeça da direita. A GRCP se inicia com uma Resolução do próprio Comitê Central, a resolução de 16 pontos. Ou seja, o Presidente jamais passou por cima do centralismo democrático, senão que manejou-o com brilhantismo, mobilizando as massas na sociedade chinesa e, através da luta de duas linhas, derrotando a direita na direção do Partido, do Estado e do Exército pelos 10 anos, até que a correlação de forças novamente virou contra a esquerda e pôde se desferir um golpe de morte à GRCP. – Equipe Editorial Servir ao Povo.

4Há que se ressaltar também a situação internacional de refluxo da revolução proletária mundial, ou seja, a GRCP também encontrou limites históricos para sua continuidade. – Editorial Servir ao Povo.