Viva a Gloriosa bandeira de 1935 (Pedro Pomar, 1975)

Nota do Blog: Em 27 de Novembro comemora-se o levante popular armado de 1935, dirigido pelo Partido Comunista do Brasil (P.C.B.). Em 1975, pela primeira vez, o Partido logra um balanço justo do evento na pena de Pedro Pomar. É um documento histórico que resgata a correta crítica e a avaliação positiva daquela experiência.

VIVA O LEVANTE POPULAR ARMADO DE 1935!

A ANL VIVE!

A gloriosa bandeira de 1935

Artigo escrito por Pedro Pomar e publicado no jornal A Classe Operária nº102 em novembro de 1975.

Transcorre neste mês de novembro o 40º aniversário da insurreição nacional-libertadora de 1935. As forças populares, em especial os comunistas, orgulham-se de evocá-la como de suas ações mais gloriosas em favor da liberdade, da independência da Pátria.

Ante a ameaça de avassalamento do país pelo fascismo, o partido do proletariado — o Partido Comunista do Brasil — veio audazmente para a cena política com propostas unitárias, com um programa mínimo revolucionário, disposto a travar até o fim a batalha pela salvaguarda dos interesses nacionais, pelos direitos democráticos. Inspirou e organizou a Aliança Nacional Libertadora e promoveu a primeira tentativa da história brasileira de instaurar um governo popular-revolucionário com a finalidade de sacudir o jugo do imperialismo, liquidar com o sistema do latifúndio, garantir um regime de democracia, progresso e cultura para as grandes massas.

Novembro de 1935 projeta-se em nossa vida política como importante divisor de águas. A partir de então, a contenda entre as forças progressistas e as reacionárias, em torno das mesmas questões e tarefas básicas, se aguça, sempre mais. Assustados pelo que consideram o mais terrível dos precedentes, os inimigos do povo — a grande burguesia e os latifundiários, associados ao imperialismo, tendo à frente as Forças Armadas — decidiram impedir por todos os meios que o feito se repita. Vêem o “fantasma do comunismo” em cada manifestação de massas, em qualquer gesto patriótico.

Tentam esconjurá-lo, perseguem-no por toda parte. Em 1964 tiveram de estabelecer uma ditadura militar sangrenta, terrorista, a fim de abafar os anseios populares e arranjar uma pretensa solução para as contradições sociais em agravamento. Mas seu fracasso é rotundo. São alvo de ódio crescente do povo. Isolam-se mais e mais. Ainda que pretendam manter sua tutela indefinidamente sobre o país, sua derrota é inevitável. Ao passo que as forças populares, apesar dos insucessos estão confiantes em suas possibilidades, mais conscientes e maduras. Retomam em melhores condições o caminho da frente-única e da luta armada, o único capaz de dar solução aos problemas da revolução democrática e antiimperialista, os mesmos de 1935.

Os comunistas, ao cumprir o imprescritível dever de homenagear os aliancistas e camaradas que se sacrificaram para conter a ofensiva fascista, ressaltam o significado da iniciativa heroica, procuram extrair as lições da derrota, esforçam-se por empunhar com maior firmeza e acerto a bandeira vermelha da revolução. Hoje ainda mais convencidos de que, por longo e difícil que seja o caminho a trilhar, o futuro pertence ao povo. Ninguém poderá evitar seu triunfo.

A ameaça fascista

Para compreender o significado da insurreição de novembro de 35 impõe-se o exame, mesmo sumário, da situação concreta daquele período após a I Guerra Mundial. Os círculos mais agressivos do imperialismo estavam temerosos do avanço da revolução proletária, socialista, e do movimento libertador dos povos oprimidos. Buscavam salvar-se através dessa modalidade de ditadura terrorista. E vendo acentuar-se a crise geral do capitalismo com a irrupção do craque econômico-financeiro de 1929/32 — o mais profundo que já haviam sofrido — apegaram-se ao recurso dos métodos fascistas de governo.

Desse modo, pretendiam jogar o fardo de suas dificuldades sobre as costas das massas trabalhadoras, intensificar a exploração dos povos atrasados, efetuar nova partilha do mundo por meio da guerra. Em 1933, subiu ao poder na Alemanha o Partido Nacional-Socialista de Adolfo Hitler: a variedade mais reacionária e feroz do fascismo. Utilizando desbragada demagogia, os nazistas imediatamente revelaram seu caráter bárbaro e belicoso. Montaram monstruosas provocações para destroçar as conquistas do tradicional e poderoso movimento operário e democrático alemão; entregaram-se ao extermínio físico implacável de todos os seus adversários, a começar pelos comunistas.

Pari-passu com esse terrorismo, delineava-se a sombria ameaça de outra guerra mundial. O Japão militarista, desde 1931, arrojara-se à conquista da China, na presunção de escravizá-la. Em outubro de 1935, a Itália de Mussolini invadia a Etiópia, e a convertia em sua colônia. A Alemanha de Hitler armava-se febrilmente a fim de rever pela força os tratados de paz do pós-guerra, apoderar-se da Europa e arremeter sobre a União Soviética, então o baluarte da causa da revolução e do socialismo. Urdia-se a intervenção ítalo-alemã na Espanha, onde as correntes republicanas estavam em ascensão. Em toda parte, o nazi-fascismo fomentava a constituição de bandos de assalto e cabeças-de-ponte com o objetivo de efetivar seus planos de hegemonia mundial, sonhada para um milênio.

Os povos, porém, não desejavam submeter-se passivamente a esses planos. Dispunham-se a resistir, a preservar as liberdades democráticas, a independência de seus países. Potentes movimentos de frente-única antifascista e ações armadas se desenvolviam, assentando golpes contundentes nos selvagens inimigos. Nos meses de julho e agosto de 1935, realizou-se o histórico VII Congresso da Internacional Comunista.

À base do relatório de Dimitrov, o Congresso fez uma completa caracterização do fascismo, demonstrou que seu poder era feroz mas precário, que sua ofensiva podia ser detida e derrotada. Todavia, o proletariado devia unir-se urgente e imperativamente, e formar uma frente de todas as forças interessadas na defesa das liberdades, do progresso social e da paz. Também a União Soviética, liderada por Stálin, desmascarava com energia e de modo incansável a política guerreira das potências fascistas, articulava um pacto dos países amantes da paz e preparava-se para qualquer eventualidade.

No Brasil, eram evidentes as repercussões dessa situação. Padecendo dos males crônicos do predomínio do latifúndio arcaico e da dependência ao imperialismo, o país fora grandemente afetado pela crise de 1929-32. Embora tivesse adotado algumas medidas de conteúdo democrático e nacionalista, a chamada revolução de 30 não eliminara a sujeição aos trustes internacionais nem o monopólio da terra.

Na verdade, desde que ascendera ao poder, o governo Vargas, representante da burguesia aliada a setores latifundiários, seguira uma política de adaptação do capitalismo aos velhos interesses criados. Empenhava-se em pagar antigas e novas dívidas contraídas com os banqueiros de Londres e Nova Iorque; aceitava como fatalidade o aviltamento dos preços dos produtos agrícolas de exportação; e com idêntico fatalismo tolerava o comércio desigual do país com as metrópoles imperialistas.

Na medida em que avultavam as aperturas financeiras, Vargas outorgava maiores privilégios aos grupos econômicos estrangeiros e aos latifundiários, agravando as condições de vida e de trabalho das massas. Em 1935, iniciou negociações para subscrever acordos comerciais na base de moedas compensadas com a Alemanha de Hitler e a Itália de Mussolini. Com semelhantes concessões facilitaria a penetração dessas potências no Brasil, onde já vinham financiando ostensivamente a Ação Integralista, de Plínio Salgado.

No terreno político, também a orientação de Vargas sempre fora de compromisso com as velhas oligarquias, tendo em vista isolar e reprimir as forças progressistas. Esse compromisso reforçou-se, mesmo depois da derrota dos grupos reacionários de São Paulo ma guerra civil de 1932. Em conseqüência, a Constituição de 1934 só formalmente inscreveu alguns direitos democráticos. Na prática, as liberdades almejadas pelo povo e tão prometidas pela Revolução de 30 se restringiram. O Partido Comunista continuava perseguido, na clandestinidade. No entanto, os integralistas recebiam franco encorajamento.

Fruto do conluio com Armando de Sales Oliveira, Júlio de Mesquita Filho, Vicente Rau e companhia, em princípios de abril de 1935 foi aprovada pelo Congresso e sancionada por Vargas a primeira Lei de Segurança Nacional, paradigma das que viriam posteriormente. Nessas circunstâncias, a Constituição transformava-se em letra morta e o Parlamento, em apêndice ineficiente. As forças Armadas, após terem sufocado algumas rebeliões de soldados, cabos e sargentos e coarctado atitudes autônomas de certos “tenentes”, retornavam à sua habitual postura antipopular. Muitos oficiais aderiram ao integralismo; e aos postos principais da hierarquia militar eram guindados reacionários ou fascistas notórios: Goes Monteiro, Gaspar Dutra, Newton Cavalcanti, Juarez Távora e outros. Havia divergências no seio das classes dirigentes, mas o sentido da fascistização do poder não podia ser ocultado.

Em decorrência dessa política, generalizava-se o descontentamento entre o povo. Nas cidades, o proletariado e as massas trabalhadoras lutavam em favor de seus interesses vitais, das liberdades públicas, fortaleciam suas organizações de classe, adquiriam maior consciência dos perigos da reação. No interior, os camponeses criavam suas primeiras Ligas, pugnavam por justiça e formavam pequenos grupos de autodefesa para se oporem à prepotência dos latifundiários.

Mesmo entre as camadas da pequena-burguesia, especialmente entre os “tenentes”, que haviam participado do movimento armado de 30, eram visíveis as frustrações diante da degenerescência da “revolução” e dos rumos seguidos pelos governantes. Em suma, a ausência de soluções para os problemas candentes, o império da corrupção, a escalada repressiva das Forças Armadas e da polícia política, a pronunciada ameaça integralista e fascista, inquietavam com razão as forças progressistas, polarizavam sua atenção, estimulavam-na para o encontro de uma saída correta, revolucionária, que satisfizesse os interesses do povo.

A ANL

Nesse ambiente de efervescência, de constante diferenciação entre as forças políticas, de crescente avanço do fascismo, de ansiosa busca de um justo caminho para a defesa da democracia, é que surge a Aliança Nacional Libertadora.

A iniciativa de aglutinar diversos setores sociais e políticos, bem como destacadas personalidades, em defesa do postulados nacionais e democráticos, partiu dos comunistas. Estes, depois de 1930, empenhavam-se seriamente em romper por completo com suas posições sectárias. Formularam uma linha e uma tática que lhes possibilitassem integrar-se na vida política, reforçar suas ligações com as massas. A medida de seus êxitos traduziu-se no aumento de sua influência nos meios operários e sindicais, e entre a intelectualidade.

A ideia da frente-única, discutida desde fins de 1934, ganhava terreno. Apesar dos fortes preconceitos anticomunistas, as propostas unitárias do Partido iam encontrando boa acolhida. A unidade dos antifascistas se impunha. Não havia outro meio de opor-se aos planos tenebrosos de domínio do fascismo e do imperialismo senão mobilizar as grandes massas e constituir uma sólida frente-única, com programa claro e sentido revolucionário. Os argumentos dos democratas sinceros que duvidavam das intenções do Partido ou dos que manifestavam ressentimentos e suspeitas sobre essas intenções esboroavam-se diante dos fatos, bem como da conduta leal, sem ambigüidades, dos comunistas. As tergiversações ou as protelações só favoreciam, como a vida mostrou, os inimigos da nação.

Em fins de março de 1935, a Aliança Nacional Libertadora inicia suas atividades legalmente, de maneira auspiciosa. Exprimindo as sentidas aspirações populares, a novel organização refletia uma esplêndida vitória da unidade. Englobava vários agrupamentos políticos, nomes expressivos no parlamento, na cultura, no “tenentismo”. Seu programa básico consistia de reivindicações concretas, a saber: 1) Suspensão em definitivo do pagamento das dívidas externas, sob o fundamento de que já haviam sido pagas há muito; 2) Nacionalização imediata de todas as empresas imperialistas, “arapucas” para as quais o povo trabalhava sob terrível exploração; 3) Proteção aos pequenos e médios lavradores; entrega da terra dos grandes proprietários aos camponeses e trabalhadores que as cultivavam, visto serem seus únicos e legítimos proprietários; 4 ) Gozo das mais amplas liberdades pelo povo, nele incluídos os estrangeiros que aqui trabalhavam e eram tão explorados quanto os brasileiros; e 5 ) Constituição de um governo popular orientado somente pelos interesses do povo brasileiro. Esse programa simples se expressou no lema: Pão, Terra e Liberdade! No ato da instalação, o nome de Luiz Carlos Prestes foi aclamado para a presidência de honra da Aliança. Ele desfrutava na época de reconhecida popularidade.

Em 1924, como capitão do Exército, promovera um levante de quartel e, a seguir, se tornara um dos chefes da Coluna que, combatendo de armas na mão, atravessara, durante dois anos, os sertões do Brasil. Estava desfraldada, assim, uma grande bandeira revolucionária.

O entusiasmo com que as massas receberam a Aliança e seu programa ultrapassou as expectativas. Em pouco tempo, estruturaram-se núcleos aliancistas na maioria dos Estados. Só na capital da República, Rio de Janeiro, neles inscreveram-se mais de 50 mil membros. Em suas fileiras incorporaram-se principalmente trabalhadores, soldados, marinheiros, cabos e sargentos — as camadas mais pobres das cidades. Caravanas percorriam as diferentes regiões do país, multiplicavam-se os comícios com enorme afluência. Nunca se testemunhara tão poderoso movimento patriótico de massas, tamanho interesse pelo debate dos problemas nacionais. O jornal diário A Manhã, do Rio, tornou-se o porta-voz dos anseios antifascistas. Paralelamente, cresciam as organizações sindicais do proletariado, surgiam centros da intelectualidade em defesa da cultura, associações femininas, entidades juvenis. Sem dúvida, com a criação da Aliança, o movimento popular, democrático, adquiriu vertiginoso impulso. As forças progressistas descortinavam novos horizontes para suas lutas.

O governo Vargas, como depois confessou, vinha acompanhando com apreensão o desenvolvimento impetuoso das atividades da Aliança. Os grupos da oligarquia e do imperialismo, os setores fascistas da reação, desde o surgimento da organização de frente-única, tramavam golpeá-la, liquidá-la.

E não tardaram em fazê-lo. Mal completara três meses de funcionamento legal, em julho, o governo decretou o fechamento da ANL, sob a acusação de que arquitetara “um plano comunista para a tomada dom poder”. Tanto os protestos como as providências jurídicas cabíveis contra o ato de força, ilegal, foram contraproducentes. O nazista Filinto Muller, chefe de polícia de Vargas, desencadeou imediata e drástica perseguição não só aos militantes aliancistas como aos dirigentes de sindicatos independentes e demais organizações democráticas. Sedes foram varejadas; ativistas presos e enquadrados na Lei de Segurança com o “subversivos”, “agentes vermelhos a soldo do estrangeiro”.

Ao mesmo tempo, o governo e a reação continuavam a apoiar por todos os meios os bandos integralistas. Criaram uma polícia especial objetivando espalhar o terror, aumentaram os efetivos da polícia política. Por seu turno o Exército e a Marinha entregavam-se ao expurgo de praças e oficiais suspeitos de antifascismo, aprestavam-se para prevenir qualquer intento do protesto popular.

Entre as classes dominantes, porém, acirravam-se as disputas. Se bem que nenhuma de suas facções aceitasse a Constituição, a vigência dos direitos democráticos, ou sequer se inclinasse a favor do povo, cada qual pretendia assenhorar-se do governo. Havia conspirações de todos os lados perseguindo o propósito de consolidar a reação ou instaurar abertamente o fascismo, para conter a “agitação e preservar a ordem!”. Depondo anos depois sobre essas rivalidades e apetites, Alzira Vargas, filha do então presidente da República, escreveu que se sucederam “episódios deprimentes, ora cômicos, ora dramáticos”. Em novembro de 1935, já lavrava intensa agitação política. Devido aos baixos salários, à carestia de vida e à atuação provocadora dos integralistas, o descontentamento popular atingira grandes proporções. O estado de ânimo dos militares sumariamente dispensados da ativa chegara próximo da rebeldia.

Diante dessa situação, que fazer? Sucumbir sem luta ou enfrentar com coragem a onda repressiva, os manejos da reação e os projetos de fascistização do país?

A insurreição

O Partido Comunista não vacilou: resolveu preparar e desencadear a insurreição armada. Mesmo na ilegalidade, o trabalho de propaganda e arregimentação da Aliança foi incrementado. Para unir o povo na resistência, as bandeiras da luta antiimperialista e antifascista precisavam ser erguidas ainda mais alto. Eram disposições acertadas, oportunas. Mas em novembro, sentindo que os acontecimentos se precipitavam, contando com a influência da ALN entre praças e oficiais das Forças Armadas e julgando que o nome de Prestes galvanizaria o Exército, a direção do Partido apressou o desfecho da ação armada e lançou a palavra de ordem de Governo Nacional Popular Revolucionário, com Prestes à frente.

Embora a reação estivesse alertada e atuasse no sentido de provocar o aborto da insurreição, a 23 de novembro irrompeu em Natal, Rio Grande Norte, a sublevação dos soldados, cabos e sargentos do 21º BC, ali aquartelado. Diversos setores da classe operária e do povo, que já vinham realizando greves e manifestações reivindicatórias e antiimperialistas, juntaram-se imediatamente aos rebelados. Após ásperos combates, foi vencida a resistência da Polícia Militar, que se conservava ao lado da reação. Os revoltosos aprisionaram os agentes do governo que não conseguiram fugir. Instaurou-se naquele dia o primeiro governo popular revolucionário da história do país. Um novo jornal, A Liberdade, editado após a vitória, anunciava o fato memorável: “Enfim, pelo esforço invencível dos oprimidos de ontem, pela colaboração decidida e unânime do povo, legitimamente representado, inaugura-se no Brasil a era da liberdade, sonhada por tantos mártires…”.

Concitava os patriotas à luta por “Todo poder à ALN”. Compunham o novo governo: o sapateiro José Praxedes, encarregado do aprovisionamento; o sargento Quintino Clementino de Barros, da defesa; o funcionário público Lauro Cortes do Lago, do interior; o estudante João Galvão, da Viação; e o funcionário dos Correios e Telégrafos José Macedo, das Finanças. As medidas iniciais adotadas pelo governo revolucionário destinaram-se a baratear os preços dos gêneros alimentícios e das tarifas dos transportes, a moralizar a administração pública, a mobilizar forças para o prosseguimento da luta armada.

As massas populares exultaram com o triunfo, confraternizaram com os insurretos, deram-lhes completo apoio. Percebiam que se instalara um governo como jamais haviam tido, genuinamente seu, voltado para seus interesses, imediatos ou permanentes. Rapidamente o movimento se estendeu às cidades de Ceará-Mirim. S. José de Mibipu, Canguaretama, Santa Cruz e outras. Pensava-se levá-lo a todo interior do Estado e a Pernambuco, cujas tradições revolucionárias permaneciam vivas.

Com efeito, nesse Estado, pela manhã de 24 de novembro, obedecendo aos mesmos motivos, sublevara-se o 29º BC, aquartelado em Vila Socorro, próxima a Recife. Mas o levante foi apenas parcial. Não obstante, resultara do vigoroso movimento operário e popular em desenvolvimento, estava em ligação com a combativa greve dos ferroviários da Great Western. De sobreaviso, as tropas da reação ofereceram pronta e tenaz resistência. As massas que simpatizavam com o movimento da sublevação do quartel, não tiveram tempo de tomar armas. Foi o governo reacionário que conseguiu enviar reforços para seus partidários. E os insurretos, embora portando-se com extrema bravura em todo o decurso da luta, ficaram isolados, sem munição. Tiveram de render-se.

Ao saber desses acontecimentos, a direção nacional do Partido julgou de seu indeclinável dever prestar solidariedade aos revolucionários do Nordeste, fortalecer a luta que se iniciara. Decidiu de imediato lançar ao combate as forças sob sua influência no Rio de Janeiro e em outros Estados. Nessa altura, o Estado-Maior das tropas reacionárias, em rigorosa prontidão, estava sabedor de que a insurreição se desencadearia em algumas guarnições acantonadas na capital do país. Prenunciava-se, portanto, uma peleja duríssima. Ainda assim, na madrugada de 27 de novembro, efetivou-se o levantamento de numerosos contingentes de soldados e oficiais do 3º Regimento de Infantaria e do Regimento Escola de Aviação, duas das mais importantes unidades militares do Rio.

Os núcleos aliancistas e as células comunistas nessas unidades executaram sem vacilações, com intrepidez, as diretivas do Partido e da ANL. Os combates, como se previa, foram violentíssimos. A reação concentrou rapidamente efetivos vários vezes superiores a fim de cercar e atacar os regimentos sublevados, O 3º RI, onde a refrega assumiu maiores proporções, ficou reduzido a escombros pelo bombardeio da artilharia e da aviação governistas. Após quase dez horas ininterruptas de luta, durante as quais procuraram romper valentemente o cerco inimigo, e sem receber o esperado apoio de outras unidades, os sublevados capitularam.

Nesse mesmo dia 27, o movimento insurrecional do Rio Grande do Norte também cessou praticamente, ante o ataque de forças imensamente superiores, que convergiram de vários pontos sobre Natal e as outras cidades rebeladas. Alguns grupos guerrilheiros que ainda subsistiram no interior do Estado, sem experiência e sem confiança neste formidável método de luta, acabaram entregando-se ou dispersando-se.

Desse modo, após quatro dias, durante os quais despertaram a esperança e o entusiasmo das grandes massas exploradas e oprimidas, travaram batalhas heróicas e perderam vidas de companheiros queridos, os combatentes antifascistas, com os comunistas à frente, foram batidos, temporariamente postos fora de ação.

Sobre os revolucionários derrotados recaiu instantâneo, pesado, cruel, o castigo dos cruzados da ordem. Fuzilaram sumariamente vários soldados prisioneiros. Os que sobreviveram foram recolhidos a presídios, ilhas, navios, etc. Eram milhares. Vargas reclamou e obteve do Congresso o estado de sítio para todo o país. A execução das medidas repressivas ficou a cargo dos generais fascistas e do carrasco Filinto Muller.

Em seguida, levantaram um coro de calúnias com o propósito de difamar a conduta dos revolucionários; difundiram que haviam assassinado oficiais a sangue-frio, violentado moças, etc. A verdade, no entanto, segundo testemunhas insuspeitas, é que os revolucionários agiram com grande generosidade, jamais desrespeitando os prisioneiros. As classes dominantes não fizeram segredo de que consideram o pior crime das massas trabalhadoras, a tentativa de pegar em armas para livrar-se da opressão. Seus agentes emulam em covardia, ferocidade e farisaísmo com o intuito de escarmentar os que a isso se atrevem. Fazer uso das armas, subverter a Constituição, assassinar impunemente os adversários, é privilégio seu. Os pobres são proibidos de sublevar-se.

Refutando injúrias e falsidades

Nestes 40 anos, a reação dedicou-se a injuriar o movimento insurrecional de 1935, no afã de apaga-lo da memória dos patriotas. Nesse sentido, procede de modo ainda mais torpe que os colonialistas portugueses com o exemplo de Tiradentes. Além do terror fascista, propaga mentiras deslavadas, deturpa os mais triviais. Os generais distinguem-se particularmente nessa campanha. Com sua proverbial coragem de torturar e matar prisioneiros inermes e dizer tolices, cumprem anualmente seu ritual comemorativo de novembro de 1935, cobrindo os lutadores antifascistas de maldições, proferindo novas ameaças, tentando intimida-los para que não voltem a palmilhar o mesmo inelutável caminho.

Nos insultos dos generais as forças populares encontram as melhores justificativas aos objetivos dos que tombaram, os maiores elogios ao seu heroísmo e aos seus sacrifícios.

Também os chamados liberais, os conciliadores e reformistas têm-se empenhado em denegrir ou menosprezar o movimento de 35, classificando-o de aventura, de putsch, de responsável pelo advento do Estado Novo fascista. São os eternos críticos, com o perdão da palavra, dos “radicais de esquerda”, por eles acusados de obstruir , com suas atitudes, a marcha “natural” das coisas, om passo lento e gradual das reformas pacíficas destinadas a criar uma sociedade aberta, a institucionalizar a democracia no país.

São totalmente falsas as acusações desses impenitentes partidários da distensão a qualquer preço. Os comunistas sempre condenaram as aventuras e os putsch, nunca se opuseram às reformas. Tampouco inventaram as contradições oriundas do capitalismo. Como revolucionários, e verificando o recrudescimento extremo dessas contradições na época do imperialismo, convenceram-se de que os povos somente podem conquistar a democracia, a independência nacional e o socialismo através da luta revolucionária das massas. À velha argüição dos reformistas burgueses de que as reformas só virão se os revolucionários renunciarem à revolução, o grande Lênin respondeu da seguinte maneira: “Ou bem a luta revolucionária de classes, cujo produto secundário sempre costuma ser as reformas (em caso de êxito incompleto de revolução), ou bem nada de reformas”. (Os grifos são de Lênin).

A análise da realidade brasileira comprova o acerto dessa tese leninista. A insurreição de 35 não ocasionou a implantação direta do Estado Novo nem o agravamento das contradições internas. Com a derrotadas forças aliancistas, é lógico, os reacionários tiveram campo livre para levar adiante seus planos, já que em momento algum os conciliadores se antepuseram Pa consumação dos mesmos.

Persuadimo-nos, ademais, que se não tivesse ocorrido a luta armada de 35, o Estado Novo sobreviria com feições mais abertamente fascistas, isto é, teria o respaldo de um partido, como o Integralista, com algum apoio político, não desmascarado de todo. O próprio Vargas, até hoje apresentado como um contrapeso à ditadura dos militares de então, com o golpe, poderia ser afastado do poder. Possivelmente também não se teria constituído a base política que facilitou a participação do Brasil na guerra contra o fascismo (precisamente na maior de todas as guerras, senhores pacifistas e reformistas!), participando reconhecidamente a contragosto dos Dutra, Goes Monteiro et caterva e por eles sabotada. É bom recordar ainda o julgamento das massas sobre a luta de 35. Quando o Partido Comunista do Brasil veio para a legalidade, em 1945, foi transformado, graças ao apoio popular, num dos mais importantes agrupamentos políticos do país.

Além de se recusarem a computar ou avaliar esses resultados de novembro de 35, os conciliadores burgueses sofrem de terrível amnésia quando se trata de interpretar e questionar a responsabilidade da reação, em particular das Forças Armadas, nos acontecimentos subseqüentes, acontecimentos que demonstram qual a tendência real das classes dominantes. De 1936 para 1937, a ameaça “comunista” parecia de tal modo inexistente que o ministro da Justiça ordenou a soltura dos presos aliancistas, com exclusão dos mais implicados, dos chefes.

A própria direção do Partido Comunista do Brasil, embora exaltasse em palavras a façanha de 35, ia abandonando os objetivos revolucionário se adotando posições nacional-reformistas, Em obediência ao estipulado na Constituição, iniciara-se a campanha para a eleição direita à sucessão presidencial. Os principais candidatos, Armando de Sales Oliveira e José Américo, ex-aliados e amigos de Vargas, e as forças que os sustinham. Distanciavam-se tanto da subversão como o céu da terra. Bastou porém que as correntes populares começassem a dar sinal de vida , a se organizar em torno de plataformas democráticas e a engrossar os comícios políticos apresentando palavras de ordem independentes, para que todo o panorama repentinamente voltasse a ficar sombrio. Visto como as Forças Armadas não encontrassem pretextos plausíveis, resolveram arranjar no arsenal nazi-integralista o monstruoso Plano Cohen, de autoria publicamente confessada de elementos do Exército.

Com base nesse plano provocativo, as Forças Armadas impuseram, e Getúlio referendou, o estado de guerra com a finalidade de julgar a “comoção interna”. A seguir, interromperam violentamente a campanha eleitoral, dissolveram o Congresso, prenderam em massa os adversários e decretaram o Estado Novo, com uma Constituição calcada em modelos fascistas. Tencionavam ir bem longe, quem sabe, institucionalizar também por um milênio o reino da nação. Tanto assim que, em pleno apogeu das vitórias de Hitler, em 1940, Getúlio saudava a nova era fascista, com o país forçosamente atrelado ao carro dos vencedores…

Mas o que sobreveio foi a derrota política e militar, fragorosa, das potências fascistas, graças exatamente à coligação das nações antifascistas, na qual a União Soviética, de Stálin, jogou papel decisivo. As aspirações democráticas, emancipadoras das massas, ressurgiram com maior força. Diante disso, os mesmos generais que haviam instituído o Estado Novo, trataram de manobrar para, logo depois, invocar os pretextos de sempre e atentar contra os interesses do povo e do país.

A história de ontem está diante de nossos olhos. O golpe de 1964 e a implantação da ditadura militar-fascista, se bem que perdure há onze anos, não deixa de dúvidas sobre o sentido da política das forças contrarrevolucionárias anteriores, essas forças e seus representantes antediluviano não escondiam seus objetivos fascistas. Em abril de 1964, os Mourão Filho, Filinto Muller, Médici, Geisel, os Plínio Salgado, Francisco Campos, Júlio de Mesquita Filho e demais gorilas e mastodontes reacionários aparecem como “autênticos revolucionários e democratas”. Quer dizer, ao lado da tragédia, a farsa. Mas nem assim os conciliadores tiram as devidas conclusões. Ao contrário, tornam-se mais confusos e desmoralizados.

Apreciação crítica

Inegavelmente os comunistas cometeram erros que contribuíram também para a derrota da insurreição nacional-libertadora de 1935. Revelá-los de modo absoluto, é uma questão de princípio. Dessa forma, demonstram a seriedade de sua conduta política, a disposição de elevar-se à altura da missão que se propuseram. A apreciação crítica e autocrítica do movimento de 35 tardou, indiscutivelmente por debilidade ideológica e política, porque, no período pós- insurreição, até 1962, predominaram na direção do Partido Comunista do Brasil elementos influenciados pela burguesia e pela pequena-burguesia. Eles escamoteavam o problema crucial da luta armada ou lhe faziam oposição , aberta ou veladamente. Desejosos de acomodar-se ao desenvolvimento do capitalismo, de contemporizar, acabaram traindo os interesses do proletariado e das massas trabalhadoras.

Agildo Barata, a princípio, e depois Prestes, com seus partidários, tornaram-se de fato renegados da revolução. Prestes transformou-se num revisionista. Embora ainda se apresente como comunista, na realidade, trabalha para colocar o proletariado a reboque da burguesia e o povo brasileiro como caudatário do social-imperialismo soviético. Espera, hoje, que a democracia possa vir do apoio de alas ditas liberais das Forças Armadas, das classes dominantes ou de ações pseudo-libertadoras das Forças Armadas soviéticas. Aliás, nunca compreendeu a fundo que a luta revolucionária, verdadeira, consiste em fazer com que os operários e camponeses possuam armas e um exército próprio, popular, libertador.

Só quando romperam em todos os terreno9s com os revisionistas chefiados por Prestes, os comunistas enveredaram pelo exame crítico corajoso de todas as posições anteriormente adotadas. Num balanço geral, verificaram que o período de 35 foi um dos mais ricos da vida política do país e do Partido. As lições que dele emanam podem ser de grande valor, se avaliadas corretamente, à luz do marxismo-leninismo. Além de conservarem imensa atualidade.

Em 1935, as massas haviam dado um salto em sua consciência sobre a necessidade da revolução, ao perceberem que esta deve ser obra delas próprias, de sua iniciativa, de sua unidade, de seus sacrifícios, de suas ações combativas, de uma orientação justa. Ao tomar parte no movimento armado de 1930, o fizeram sob a iniciativa e em proveito de minorias, das cúpulas, dos agentes dos latifundiários, da burguesia nacional e de alguns setores da pequena-burguesia radical. Interpretando corretamente esse amadurecimento da consciência das massas, para o qual ele havia contribuído decisivamente, nosso Partido elaborou uma linha política que correspondia no fundamental ao curso do processo objetivo, harmonizando-se com os supremos interesses da revolução.

A Aliança Nacional Libertadora representou um empreendimento ousado e de vasto alcance político, oferecendo ao povo brasileiro um instrumento de ação unida com reais condições de vitória em sua luta mais que secular pela liberdade e pela independência nacional. A frente-única estabelecida com a Aliança impulsionou o movimento popular, democrático, antiimperialista, elevou a níveis nunca atingidos a organização e a consciência política das massas. Nosso Partido projetou-se nacionalmente como o mais fiel defensor dos interesses dom povo, o mais ativo organizador da unidade contra o imperialismo e o fascismo. Nas duras provas e gloriosos combates que advieram, apareceu aos olhos de toda a nação como um destemeroso destacamento de vanguarda do proletariado revolucionário, disposto a dirigi-lo em quaisquer circunstâncias. Merecidamente, o prestígio e a influência do nosso Partido se consolidaram.

Não obstante, a política do Partido e seu trabalho de frente-única padeceram de sérias debilidades. Ao fazer esforços para expandir a Aliança entre as massas urbanas, não soube estendê-la ao campo. A mobilização dos camponeses continuava subestimada. Nesse período, no entanto, o inolvidável Harry Berger insistiria na importância da atividade entre as massas rurais. Berger, dirigente comunista alemão que a Internacional Comunista incumbira de ajudar a luta dos trabalhadores brasileiros, assim que chegou ao Brasil passou a estudar pessoalmente a experiência do surgimento das Ligas Camponesas e de guerrilhas na região do Baixo São Francisco, em Alagoas.

Argumentava que enquanto os comunistas não se ligassem às massas camponesas e conquistassem seus apoio, seria impossível obter a vitória bem como a direção do movimento revolucionário pelo proletariado. Aliás, não era outra a orientação da III Internacional Dimitrov, em seu informe ao VII Congresso, esclarecendo o sentido concreto que devia ter a frente-única nos países submetidos ao imperialismo, e particularizando nosso país, dizia: “No Brasil, o Partido Comunista, que construiu uma base correta para o desenvolvimento da frente-única com a fundação da Aliança Nacional Liberrtadora, deve fazer o máximo de esforços para estender ainda mais esta frente e atrair, antes e acima de tudo, as massas de milhões de camponeses com o propósito de orienta-las na formação de unidades do exército popular revolucionário devotado até o fim ao estabelecimento do poder da Aliança Nacional Libertadora”.

Entretanto, nosso Partido não deu a devida atenção a estas preciosas indicações. E assim permaneceu por longo tempo. Quando, porém, teve de fazer face ao golpe contra-revolucionário de 1964, compreendendo melhor o conteúdo da revolução e colocando-a em termos práticos, foi que o Partido passou a concentrar-se no problema camponês e a basear sua concepção de luta armada, tomando o campo como ponto de apoio fundamental.

Em outros aspectos, do trabalho de frente-única, o Partido conduziu-se de modo estreito, sectário. Por exemplo, o lançamento da palavra de ordem de Governo Nacional Popular Revolucionário, com Prestes à frente, não contribuiu para a ampliação do movimento, Deixava transparecer, ao contrário, que os comunistas queriam absorvê-lo. Também foram menosprezadas as possibilidades de ampliar a frente-única incorporando diversos grupos descontentes com a política de Vargas. Enfim, por causa da perspectiva imediatista e da incapacidade de aproveitar as dissensões que se acentuavam entre as classes dominantes, o movimento aliancista não se estendeu como devia.

Contudo, onde mais fortemente se manifestou o radicalismo pequeno-burguês foi na concepção e no método da luta armada. Isto não quer dizer que se deva considerar a insurreição de 35 como um putsch. De forma alguma. É certo que se deu precipitadamente; mas não como um golpe de cúpula, nem teve natureza exclusivamente militar; surgiu no quadro de um movimento de massas, amplo, democrático, antiimperialista. O Partido, porém, confiava numa vitória fácil, não levando em conta a realidade, a correlação de forças desfavorável e a própria época imperialista. Pelo menos, desconhecia que já em 1902, quando era marxista, Kautsky dissera que, na época imperialista emergente, “a futura revolução (…) se assemelhará menos a uma insurreição de surpresa contra o governo do que a uma guerra civil prolongada”. Lênin em janeiro de 1917, endossou firmemente essa opinião.

O Partido, imbuído de concepções “tenentistas” e fiando-se principalmente no apoio dos quartéis, subestimou a conquista das massas para a insurreição. Mas baseando-se estritamente nos levantes de quartel, o movimento revolucionário não pôde triunfar. A afirmativa de que esse método de luta é de “sabor tipicamente comunista”, constitui uma sandice. Na realidade, tem sido um procedimento burguês e pequeno-burguês. Leva as massas à passividade, não reconhece a necessidade de sua participação ativa na luta, feita quase sempre à sua revelia. No entanto, os levantes de quartel, como expressão do poderoso ascenso do movimento de massas, da insurreição popular, proletária, contribuem para a desagregação das tropas inimigas, para a organização do exército revolucionário.

A importância extraordinária da insurreição de 35 reside no faro de que pela primeira vez situou em forma concreta, em termos práticos, para os militantes comunistas e as forças populares, a atarefa da preparação e do desencadeamento da luta armada. Por isso, nosso Partido, procurando generalizar essa magnífica experiência e outras já vividas nesse terreno pelo povo brasileiro, e à luz dos ensinamentos do marxismo-leninismo, concluiu que o método provado para alcançar o triunfo pé o da guerra popular, da guerra revolucionária das massas. Com base nessa concepção, o Partido orienta seu esforço, preparando-se para a luta armada. Só assim, estará em condições de realizar, junto com as massas e na devida oportunidade, ações de envergadura, capazes de vencer a violência das forças contrarrevolucionárias.

Passaram-se quatro décadas da gloriosa insurreição de 1935. Embora não seja. Do ponto de vista da história universal, um período congo, está cheio de acontecimentos de enorme alcance. No mundo e em nosso país ocorreram consideráveis modificações. Posto que a insurreição nacional-libertadora não tivesse enterrado no Brasil da reação e do imperialismo, abalou-o profundamente. Marcou uma etapa relevante.

Nela foram postulados pela primeira vez e de maneira nova os problemas essenciais da revolução brasileira, na fase atual, melhor caracterizadas suas forças motrizes e seus inimigos fundamentais, indicando o caminho da frente-única e o da luta armada, bem como revelada a fisionomia de seu verdadeiro dirigente, o proletariado revolucionário, guiado pelo Partido Comunista do Brasil. Nos embates encarniçados de 35, as forças populares compreenderam ainda que só a luta revolucionária educa as massas, forja seu ânimo combativo, abre-lhes maior visão da realidade e indica-lhe a medida de suas próprias forças.

Faz onze anos que a ditadura militar-fascista procura esmagar a resistência popular, varrer o fantasma da revolução democrática, antiimperialista, que ela acusas de comunista. Mas, ao contrário do que pretendem os generais, a revolução amadurece. Cresce na consciência dos patriotas e dos democratas a convicção de que as questões determinantes do movimento de 1935 precisam ser resolvidas. Sob o regime dos generais, o país tornou-se mais dependente, mais endividado, mais aviltado que em qualquer época de sua vida nacional.

Seu povo está mais pobre e oprimido. Impõe-se, portanto, fazer a revolução, através da ação unida das massas e de amplas forças políticas, e recorrendo ao caminho da guerra popular. Esta verdade vai-se apoderando da mente e dos corações da maioria da nação, como ficou evidente nas combativas manifestações de 1968 e em outras ocasiões. Apesar do repúdio maciço do povo, do que foi testemunho o pleito eleitoral de 1974, os generais se obstinam em permanecer no poder, despoticamente. Não têm condições nem, querem satisfazer os reclamos de anistia, de abolição dos atos institucionais e das leis d exceção.

Por isso respondem com a escalada repressiva, prendendo torturando e matando patriotas e democratas. Nestas circunstâncias, o exemplo da resistência corajosa dos lavradores e dos patriotas do Araguaia deve ser secundado. Eles formaram os primeiros destacamentos guerrilheiros no campo e revivem, em nível mais alto, desde 1972, a tradição revolucionária de 1935. Deles também partiram apelos para a união de todas as forças interessadas na luta pela derrubada da ditadura militar e pela conquista da liberdade. A batalha será dura e prolongada, mas é a única que assegurará a vitória.

Nosso Partido, o heróico partido do proletariado, inclina suas bandeiras de combate em homenagem aos que não trepidaram, em 1935, em oferecer suas vidas e derramar seu sangue para criar um Brasil independente e democrático. Fiéis à sua memória, juramos que haveremos de prosseguir na ingente marcha que encetaram. Nosso dever é aprender a lutar melhor e perseverar.