Fogo nos sertões (D. Aroeira)
Nota do blog: Publicamos a seguir dois textos muito interessantes acerca da visão comunista dos problemas e questões climáticas do sertão brasileiro, publicados em A Nova Democracia (nº 161, 2ª quinzena de novembro de 2015 e nº 163, 2ª quinzena de dezembro/1ª quinzena de janeiro de 2016 – respectivamente), assinado por D. Aroeira.
Fogo nos sertões (I)
À beira de uma fogueira, em uma Área Revolucionária no sertão norte mineiro, um velho combatente comunista nos faz uma pergunta inusitada: “o que é o fogo?”. Um silêncio constrangedor tomou conta dos presentes e meus conhecimentos sobre as ciências naturais mostraram-se, mais uma vez, extremamente limitados. Passado bastante tempo, sem qualquer motivo aparente, esta pergunta passou a me perseguir como uma charada exigindo ser decifrada. Não demorou muito para que, em uma breve pesquisa pela internet, encontrasse uma resposta surpreendentemente simples: o fogo é a aparência da energia (luz e calor) e as chamas o espetáculo do surgimento de novas moléculas de água provenientes da fusão de átomos de hidrogênio liberados durante a combustão com o oxigênio presente na atmosfera.
Qualquer um que trabalhe com a agricultura conhece a importância do fogo no preparo do solo, técnica utilizada desde os mais remotos tempos. Deste simples fato é possível deduzir várias questões, como a falácia dos “incêndios criminosos” causados pelas famigeradas “bitucas de cigarro”. Se o tabagismo continua sendo um hábito nocivo e um gravíssimo problema de saúde pública, os fumantes podem, ao menos, ser inocentados da infundada acusação de serem os responsáveis pelas gigantescas queimadas que assolam o país todos os anos a cada período de seca. Isso mesmo! Por mais trágico que possa parecer para os olhares viciados em ver equilíbrio onde há conflitos e calmaria onde há movimento, os incêndios nos sertões de nosso país são fenômenos naturais cíclicos tão comuns e necessários quanto as tempestades. E o fogo tão imprescindível para a renovação do ciclo energético dos biomas sertanejos quanto a água!
Aqui no sertão norte mineiro, formado hegemonicamente pelo cerrado (em suas mais diversas e belas paisagens como os gerais, vazantes, veredas, carrascos, etc.), os paradoxos do meio natural fundem-se à intrigante psicologia do sertanejo. Sobre a fortaleza moral deste genuíno representante de nosso povo muitas verdades já foram descritas, mas, não é demais frisar uma das suas mais importantes qualidades: a sua capacidade de adaptação, de transformação. Aí, mais uma vez, o sertanejo assemelha-se ao próprio sertão. As milhares de massas camponesas oprimidas pelo interior de nosso país assemelham-se às matas secas à espera da menor faísca para irromper impetuosas em labaredas vermelhas, destruindo e transformando tudo! Canudos, Contestado, Pau de Colher, Cachoeirinha, Trombas e Formoso… e as grandiosas Ligas Camponesas, não faltam exemplos! Ignorantes, pseudo historiadores e falsos cientistas buscam no casual, no fortuito, a explicação de fenômenos estruturais em nossa sociedade semicolonial e semifeudal. De fato, muitas coisas podem se converter em ignição, mas só haverá fogo se houver combustível e a quantidade e intensidade daquele depende diretamente da qualidade deste.
Parte II
Fogo nos sertões (II) – Água
No último texto desta breve série de reflexões sobre a vida sertaneja (publicado na edição 161 de AND) a definição do fogo está imprecisa. Como alertou um companheiro professor de Física seria mais correto afirmar serem as chamas “o espetáculo do surgimento de novas moléculas de água (H2O) e gás carbônico (CO2) provenientes da combinação de átomos de hidrogênio (H) e carbono (C) liberados durante a combustão com o oxigênio (O) presente na atmosfera”.
O desejo de ressaltar a relação dialética entre o fogo e a água acabou levando-me a eludir acerca do surgimento do gás carbônico resultante da mesma combustão geradora de novas moléculas d’água. Gás carbônico essencial ao“ciclo do carbono” e que está na base da fotossíntese (processo natural imprescindível à vida humana), o que é propositalmente “esquecido” pelos pseudocientistas a soldo do imperialismo em suas campanhas de “Terrorismo Ambiental” tornadasainda mais “fanáticas” nos últimos dias devido à realização da “Conferência do Clima” em Paris.
Quisera eu possuir conhecimentos sólidos sobre as leis que regem a Natureza para comprovar por A + B como é absurda a hipótese sobre o perigo do fim da água potável no Planeta (!!!). Antoine Laurent de Lavoisier (1743-1794), considerado por muitos como o pai da Química moderna, se vivo fosse (e não estando corrompido pelos monopólios que controlam praticamente todos os principais centros de pesquisa e difusão de conhecimentos) ficaria estarrecido ao ouvir tamanhos disparates difundidos como verdades absolutas e inquestionáveis pelos porta-vozes do Capital. Afinal, para esta gente, qual o significado do célebre princípio por ele enunciado de que “na Natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma”?
Mais do que simplesmente parte da Natureza a água é um Elemento Natural; é parte essencial da Matéria (que existe desde sempre e para sempre independente da vontade do Homem) e da qual o Ser Humano não é senão a sua expressão mais desenvolvida.Objetivamente, por todos os conhecimentos que o Homem adquiriu até o momento sobre a Natureza e as suas leis, pode-se afirmar que, enquanto existirem os elementos químicos oxigênio (O) e hidrogênio (H), a existência da água (em seus diferentes estados físicos) está assegurada. E, tendo em vista que estes elementos químicos são dos mais abundantes, não apenas no Planeta mas em todo o Universo, este não é um problema real, pelo menos, para os próximos bilhões de anos.
Quanto às preocupações sobre a futura existência de água potável, eis aí uma falsa polêmica. A água que hoje não é potável, amanhã o será pelo desenvolvimento do conhecimento científico. Ainda mais se levarmos em conta os grandes saltos qualitativos que conhecerá a Humanidade com o fim do sistema imperialista mundial e a expansão do Socialismo por todo o planeta e, num futuro mais longínquo, quando já não existirem as classes e o domínio da Natureza pelo Homem der saltos para nós hoje inimagináveis.
Sobre o problema da água e de sua imprescindível utilização pela Humanidade existem duas formas distintas de enfocá-lo: através do pessimismo decadente da Burguesia ou do otimismo revolucionário do Proletariado. É, sobretudo, uma questão ideológica, relacionada a como compreendemos o domínio do Homem sobre a Natureza, no atual momento histórico condicionado pela contradição entre as pujantes e inesgotáveis forças produtivas do Proletariado e das massas populares e as já caducas e historicamente derrotadas relações de produção intrínsecas ao sistema imperialista mundial.