Nota do blog: Artigo de autoria do prof. Fausto Arruda, publicado no Jornal A Nova Democracia nº 68 (2010) sobre a questão das eleições sob a perspectiva do papel que cumprem os partidos “de esquerda” que participam desta farsa.
OS COADJUVANTES DA FARSA ELEITORAL
Concluído o cenário para a encenação da farsa eleitoral 2010, como atores principais se apresentaram Dilma Rousseff (PT, Pecedobê, PMDB, PSB, PDT, et caterva), José Serra (PSDB, DEM e PPS) e Marina Silva (PV). Ademais como coadjuvantes, os de sempre José Maria do PSTU, Rui Pimenta do PCO, Ivan Pinheiro do PCBrasileiro, do PSOL não mais Heloísa Helena agora Plínio Arruda, mais Eymael e Levi Fidelix.
A imprensa dos monopólios, confirmando o caráter das eleições burguesas, de antemão, já decidiu que a pugna será travada por três candidatos: Dilma Rousseff, José Serra e Marina Silva, mas, principalmente, pelos dois primeiros. Seus programas incorporam o núcleo comum imposto pelo imperialismo, através das determinações do FMI, do Banco Mundial e da OMC, motivo pelo qual o trio recebeu o papel de destaque na encenação. Os candidatos José Maria, Rui Pimenta, Ivan Pinheiro e Plínio Arruda, socialistas de boca e eleitoreiros de fato, acataram o chamado de fazer uma ponta na farsa dirigida pela grande burguesia e pelo latifúndio sob o patrocínio do imperialismo.
Uma parcela ponderável da população já identificou esta artimanha do imperialismo e proclama abertamente o seu boicote a essa trampa. Existe, entretanto, uma parcela bem menor, mas não menos importante, que ainda se deixa levar, não pelo canto de sereia burguês, mas pelo proselitismo trotskista de enaltecer a importância de participar das eleições burguesas. A justificativa, uns a apresentam como forma de propagandear um “programa socialista” que, no exercício de seu cretinismo eleitoral, se resume a meras propostas liberais para amenizar a exploração capitalista. Outros, como principal forma de “acumulação de forças” para uma suposta futura tomada do poder via “greve geral política”, “insurreição”…
Mais avançada e esclarecida do que os oportunistas, uma parcela das massas que ainda vota, mas o faz de forma pragmática por não acreditar em candidaturas que prometem o paraíso a partir de disputa eleitoral sob o tacão da burguesia. Isto é tão verdade que o número de votos destes candidatos decresce de eleição para eleição, enquanto que com o boicote acontece o contrário. Já o PT, Pecedobê e PPS só ampliaram sua base eleitoral depois que botaram de lado todo pudor e ética com que lustram suas fachadas e adotaram de forma sistemática a mesma prática corrupta e empulhadora dos partidos reacionários tradicionais. E isto, independentemente das modalidades e variações de socialismo que apresentam seus programas e das arengas de seus corifeus e militantes.
O povo não é bobo, muito menos rejeita o socialismo. Acontece que ele desconfia da facilidade oferecida pelos oportunistas, pois pela dura vivência, sabe muito bem que nada lhes caiu ou cairá do céu, sendo as mínimas conquistas obtidas somente após muita luta. Coisa que os oportunistas rejeitam ao professarem seu legalismo e pacifismo pequeno-burgueses.
AOS COMERCIANTES DE ILUSÕES
A utilização ou não do parlamento e participação ou não nas eleições burguesas não são questões de princípios para os comunistas, portando pertinentes à esfera da tática. Neste sentido, ao longo da história do movimento revolucionário, muitos partidos participaram de eleições após avaliação concreta da correlação de forças e tendo em vista objetivos táticos a alcançar.
Porém, o proletariado revolucionário, através de autênticos partidos comunistas que tem constituído historicamente em diferentes países, nunca olvidou o caráter de classe do Estado e da democracia burgueses, onde o sufrágio universal (as eleições) é como afirmava Engels, “um instrumento de dominação da burguesia”. Servindo para mascarar a condição ditatorial da minoria sobre a maioria. Tampouco os revolucionários autenticamente marxistas nunca desconheceram que a burguesia atribui um caráter universal à sua democracia e uma mistificadora condição ao Estado sob seu domínio como um ente acima das classes, bem como de sua violência reacionária: a democracia burguesa é ditadura da minoria.
Sendo o problema fundamental a questão do poder, como afirmou Lenin,“Afora o Poder tudo é ilusão”, as eleições burguesas nunca foram terreno de disputa de poder, embora pudessem ser utilizadas como tribuna para revelar às massas trabalhadoras o seu caráter de classe e a necessidade da revolução violenta para estabelecer uma nova sociedade. Mas isto era útil na democracia burguesa da época do capitalismo de livre concorrência e não monopolista. Nas condições de aprofundamento da dominação imperialista tornou-se completamente insuficiente para definir qualquer situação a favor das classes trabalhadoras. Existe, pois, uma questão estratégica, já comprovada historicamente, que se coloca de forma impositiva: a de que a tomada do poder para as classes trabalhadoras só se verificou possível pela via revolucionária. O antagonismo de classes impõe, para a liquidação da ditadura da minoria (velha democracia) uma ruptura completa, até agora só possível via violência revolucionária paraestabelecimento da ditadura da maioria (nova democracia e democracia proletária). A ditadura da maioria sobre a minoria é uma necessidade histórica para possibilitar o processo de desenvolvimento social rumo à sociedade sem classes.
Se por um lado o ensaio da Comuna de Paris, a Revolução Russa e da Revolução Chinesa, para ficar nos três mais destacados acontecimentos da revolução proletária, estimularam a muitos a perseguir a senda revolucionária, por outro, as maquinações da burguesia com seus processos de cooptação e imposição de sua ideologia como ideologia dominante, influenciaram amplos setores da pequena-burguesia e da aristocracia operária a levar a luta das classes trabalhadoras para dentro do parlamento burguês, enveredando pelo descaminho das ilusões eleitoreiras.
Desde o início do século XX chefes de partidos operários como Bernstein e Kautski passaram a vender estas ilusões. Ambos foram contestados por Lenin que os desmascarou como revisionistas, diante da tentativa de excluir do marxismo o seu caráter revolucionário, ou seja, sua essência. Em seu livro O Estado e a Revolução destacou que “… a necessidade de educar sistematicamente as massas e precisamente nesta ideia sobre a revolução violenta, está na base de toda a doutrina de Marx e Engels”. Posteriormente Nikita Kruschov na URSS, Togliatti na Itália, Thorez na França e Earl Browder no USA, requentaram as mesmas ideias revisionistas, recebendo nesta oportunidade o combate cerrado do Partido Comunista da China sob o comando de Mao Tsetung na defesa da via revolucionária.
BLÁ-BLÁ-BLÁ PARA INCAUTOS
Hoje, a velha cantilena sobre a importância da participação no parlamento burguês e no processo eleitoral é propagado pelas correntes trotskistas e outras correntes degeneradas do marxismo. Estes oportunistas a serviço da burguesia ousam, inclusive, insinuarem apoiar-se em Lenin para defenderem sua participação na farsa eleitoral. Traficam com as afirmações de Lenin expostas em seu livro Esquerdismo doença infantil do comunismo, com o qual defendia a combinação do trabalho legal com o trabalho ilegal numa fase em que a luta de classes se caracterizava por um auge da revolução proletária mundial, mas principalmente na utilização do parlamento burguês nos períodos de ofensiva da contrarrevolução e de derrota do movimento de massas revolucionário. Lenin advertia aos que queriam queimar etapas (oportunistas de “esquerda”) sobre os passos necessários a serem trilhados para os que queriam palmilhar o caminho dos bolcheviques.
Ocorre que mais do que nunca, o imperialismo usa o processo eleitoral para justificar sua democracia de meia tigela. É patente a intervenção do sistema financeiro internacional e das transnacionais em todas as eleições realizadas mundo a fora. Fatos recentes como as eleições no Iraque e Afeganistão, ocupados militarmente pelos ianques, e a eleição em Honduras, após um golpe militar, retratam bem a impossibilidade de se alcançar a mínima democracia para as massas sob gerenciamentos lacaios “eleitos” por estes processos espúrios. Mas, nada disso demove os oportunistas de seu desiderato de coonestar a surrada burla burguesa.
Ademais, falar de programa socialista e de ruptura com o imperialismo sem se propor ao único método possível para tal fim, a violência revolucionária, é a mais descarada hipocrisia. E, é isto que fazem os oportunistas coadjuvantes da farsa eleitoral, como mostram trechos que extraímos de documentos divulgados em seus sites com suas propostas para as eleições 2010. Vejamos alguns desses primores:
“Nossa candidatura apresentou diretrizes que propõe uma clara ruptura com o imperialismo como pré-condição para que sejam possíveis medidas como emprego, saúde e educação para toda a população. Desta forma, ao invés de pagar a dívida pública aos grandes especuladores internacionais, por exemplo, investiríamos maciçamente em serviços públicos e na geração de empregos“. (PSTU)
“O objetivo do PCO, ao lançar candidatos nesta eleição, é a de fazer das eleições uma tribuna em defesa das reivindicações dos trabalhadores da cidade e do campo e de um programa socialista para transformar o país. (…) O Partido da Causa Operária decidiu pelo lançamento das candidaturas para divulgar aos trabalhadores e à juventude um programa de luta, socialista, em defesa de um governo operário, que atenda às reivindicações mais sentidas dos trabalhadores da cidade e do campo.” (PCO)
“O programa aponta para a construção de uma ordem institucional e política própria dos trabalhadores, capaz de impulsionar a criação de uma nova cultura proletária e popular e de contribuir para colocar o bloco proletário em movimento na luta contra a ordem conservadora. (…) A governabilidade, assim, será garantida pela mobilização, pela criação de referências claras, para os trabalhadores, desta nova ordem de cunho socialista, com mudanças estruturais no país, novas conquistas e formas ativas de participação e de exercício coletivo do poder político“. (PCBrasileiro)
“Plínio reafirmou que as candidaturas do PT, PSDB e PV representam a mesma ordem e que o PSOL quer acabar com a mesma. ‘Somos a candidatura da transgressão da ordem estabelecida’, destacou, lembrando que o partido tem em seu programa de governo ações que a burguesia não tem o interesse e nem coragem de empreitar, como as reformas agrária, da educação e da saúde públicas; o fim à criminalização da pobreza e do movimento de desindustrialização pelo qual o país passa; uma reforma urbana que ataque a especulação imobiliária; e a redução da jornada de trabalho“. (PSOL)
Como se vê, suas “propostas” mostram de forma bastante clara uma mesma retórica do engano das massas com promessas de redução de jornada de trabalho, reforma agrária, não pagamento das dívidas externa e interna etc., tudo já apregoado pela “frente popular” lulista de onde vieram. Escrevem tudo e falam tudo como se não existisse uma estrutura burocrático-militar guardiã da velha ordem. Pouco ou nada importam os exemplos dolorosos para as massas tais como o do Brasil com Jango, do Chile com Allende, da Indonésia com Sukarno, enfim, nos quais o reformismo e nacionalismo tacanhos, as ilusões legalistas, só resultaram em banhos de sangue.
Bem ao contrário, cada um ao modo que melhor lhe convém, tratam de fazer a apologia de “progressistas” aos gerenciamentos do tipo Chávez, Morales e Correa, sem dúvidas mais medíocres que os casos acima referidos. Nisto ainda fazem questão de omitir que os mesmos só chegaram ao gerenciamento do velho Estado burocrático-latifundiário de seus países após fazerem fracassar processos insurrecionais das massas, as quais o criminoso oportunismo logrou desviá-las para o caminho eleitoreiro, permitindo-os cavalgar as massas em seus justos anseios de mudanças.
Mas esses são os ossos do ofício do oportunismo, paciência! Não obstante o fracasso eleitoral dessa respeitada gente nas sucessivas “eleições” dos últimos 8 anos, como antes, hoje e no futuro, não é menos importante sua participação avalizando como democracia, perante o povo e a sociedade brasileira, esta velha ordem reacionária e putrefata. Aliás, pode haver algo mais funcional ao sistema e à sua legitimação do que o aval de “competição democrática” à farsa eleitoral? Haverá algo mais significativo de reconhecimento das “razões” de nossas classes dominantes que ter, a um só tempo, uma “esquerda” na oposição demarcando com “a outra” no gerenciamento do seu Estado, ambas unidas em condenar e repelir os métodos e critérios revolucionários?